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O último Bolsominion

6 de Fevereiro de 2020, 12:33 , por Nocaute - | No one following this article yet.
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Marcílio Godoi

Quando o apocalipse chegar, o último bolsominion ainda terá forças para perguntar: quem elegeu o monstro? Nos seus poemas pugilistas, Marcílio Godoi mostra um país que não tem onde cair morto.

O último Bolsominion

Não serei eu quem vai dizer
à legião de cegos
que elegeram o monstro
quem é o monstro.

Serão os famintos pelas ruas,
os excluídos com seu canto,
os bolsos vazios,
as crianças natimortas,
o país devastado,
a gargalhada dos banqueiros,
os corpos pelas ruas,
a desonra crescente.

Quem vai ordenar os argumentos
para o idiota que elevou um homem
vil, obtuso e psicopata
ao posto de liderança maior da nação
serão seus próprios filhos
sem creche nem futuro,
o incêndio na floresta,
a conta da farmácia,
a carta de demissão,
o contracheque (ou a falta dele),
o posto de gasolina,
o agrotóxico nas veias,
os ônibus em chamas.

Um último bolsominion vai implorar
a todos um mínimo sequer de lucidez.
Mas talvez seja tarde. Talvez ele se ria
tomado pela descrença nas leis
pela ausência de pactos sociais
pela falta de verdade nos códigos,
sob a loucura generalizada
de uma guerra civil
com a qual hoje ele ameaça
ao brincar de democracia.

Com seus velhos sem ter
onde cair mortos,
abandonados por raposas políticas
e juízes entupidos de dinheiro
com suas crianças em desespero,
sem garantia alimentar
elementar aos famintos,
perguntará o bolsomínion
ao deus mercado
por um prato de comida
e saberá, enfim, a selvageria.

E as perseguições de um Estado
perverso e entregue
não darão mais conta do desespero
por não haver mais
sequer um policial a quem recorrer.

Não serei eu quem vai empurrar
a grande ficha pra dentro
dessas cabeças ocas.
Vai ser um ato, uma decisão,
um agente do próprio governo.

E o último bolsominion viverá
para ver o efeito manada no caos.
E a cavalaria com que sonhou
voltar-se contra si.

Balada perdida

Dorme, dorme, pequena
que a mamãe tá no ônibus
tentando chegar em casa
e o papai foi morto
numa batida policial.

Dorme, pequena
que a cuca da vó tá fraca
e as pernas já não respondem
sem o remédio e a cesta
que o governo cortou.

Dorme, pequena, dorme
com um barulho desses lá fora
as botas e os dentes rangendo,
a vida morrendo, pequena
não abra seus olhos agora.

O post O último Bolsominion apareceu primeiro em Nocaute.


Fonte: https://nocaute.blog.br/2020/02/06/o-ultimo-bolsominion/

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