Marcílio Godoi
Organização Mundial da Doença
O dinheiro contaminou o rio
o dinheiro contaminou o mar
o dinheiro contaminou a floresta
o dinheiro contaminou o corrimão
o dinheiro contaminou até a morte.
Contaminou o ar
contaminou os livros
contaminou as risadas
contaminou as crenças.
Contaminou os ponteiros, as horas
e depois contaminou o amor.
O dinheiro contaminou o meu retrato
o dinheiro contaminou as minhas lembranças
o dinheiro contaminou todos os ratos
o dinheiro contaminou nossas crianças.
Contaminou a sopa
contaminou a represa
contaminou a roupa,
contaminou a beleza.
O dinheiro contaminou você, o jornal,
como o botão do elevador, a maquininha do cartão
eu mesmo estou todo contaminado pelo dinheiro
o dinheiro contaminou tudo, o teclado, o mouse
o metro, a rima e o país de ponta a ponta.
O dinheiro contaminou até o contágio
de modo que este poema
todo contaminado
já não conta.
Este mundo ainda tem jeito
Não permita que o dinheiro
lhe roube toda esperança
a que ficou, do desenho da criança
de que este mundo ainda tem jeito.
Vamos, dê-me esse prato de sopa
e diga-me apenas isso
nesta noite escura e fria:
Olha, este mundo ainda tem jeito.
Este pão, esta coberta
sob o concreto da marquise
ou do grande viaduto
mais aquece a sua culpa
por não se saber inocente
de que a maior caridade
solidária entre os homens
é feita de decisões políticas
de programas de inclusão
de educação a todos os filhos
que desaprofundem o abismo
entre as nossas dignidades.
Este mundo ainda tem jeito?
Mas eu lhe dou este consolo
eu lhe concedo este pedido,
vejo que anseia por ele,
vamos, dê-me sua roupa velha,
esta esmola de moedas,
este naco de sabão
este velho colchão.
Que eu lhe deixo pensar, em troca,
que este mundo ainda tem jeito
que é por sua alma alta
e sua generosidade imensa
sua infinita doação caridosa
é que este mundo, todo desfeito
ainda tem jeito.
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