Aprovado parecer sobre PL que trata de conduta de militares
15 de Junho de 2016, 7:22A Comissão de Administração também é a favor de proposição que cria horas extras na PM e no Corpo de Bombeiros.
Duas proposições de autoria do deputado Cabo Júlio (PMDB), que sugerem alterações na Polícia Militar e nos Bombeiros, receberam pareceres favoráveis da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (14/6/16). O Projeto de Lei (PL) 780/15especifica quais condutas de militares são passíveis de demissão.
Já o Projeto de Lei Complementar 3/15 cria indenização por horas extras trabalhadas pelos policiais. Os dois projetos, que tramitam em 1º turno, foram relatados pelo deputado Fábio Cherem (PSD), que opinou pela aprovação de ambos na forma original.
O PL 780/15 pretende acrescentar parágrafo único ao inciso II do artigo 64 da Lei nº 14.310, de 2002, que contém o Código de Ética e Disciplina dos Militares do Estado (CEDM). O dispositivo sugerido aponta as condutas, que afetem a honra pessoal e o decoro da classe policial e que justificam a abertura de processo administrativo disciplinar, que pode resultar na demissão do agente.
“Não podemos deixar a subjetividade operar”, justificou o autor do projeto, deputado Cabo Júlio. Ele afirmou que, na corporação, ainda há uma cultura de violação dos direitos dos militares, sob a égide dos princípios de hierarquia e disciplina. “Quando o Estado viola o direito do servidor, por ação reflexa, viola o do cidadão”, completou.
Parecer - O relator acompanhou o parecer anteriormente emitido pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), ao considerar que o projeto “visa reduzir a possibilidade de instauração arbitrária de processos administrativos sancionatórios previstos no CEDM”. Na avaliação de Fábio Cherem, a proposição também contribui com a administração militar, já que a especificação das condutas puníveis afasta a possibilidade de justificativa por desconhecimento.
Sargento Rodrigues (PDT) admitiu que o Código de Ética representou avanço no respeito aos direitos e garantias dos militares, mas ressalvou que ainda são cometidos excessos. “Muitas vezes, a aplicação da lei é absolutamente distorcida, através de resoluções, portarias e até memorandos”. Em sua opinião, essas normas não podem se sobrepor às leis. “Não podemos abrir mão dessa prerrogativa”, disse ao lembrar do poder de legislar dos deputados.
O projeto será analisado pela Comissão de Segurança Pública, antes de ser encaminhado ao Plenário.
Projeto propõe pagamento de horas extras aos militares
O Projeto de Lei Complementar 3/15, cujo parecer também foi apreciado durante a reunião, autoriza o governador a criar o Programa de Estímulo Operacional para Policiais Militares e Bombeiros Militares do Estado. A ação se traduz no pagamento de horas extras, limitadas a 40 por semana, feitas em trabalhos dedicados ao policiamento ostensivo e remuneradas com acréscimo de 50% sobre normal. Para gerenciar o benefício, o projeto também estipula a criação de um banco de horas ou mecanismo similar.
O parecer ressalta a justificativa do autor de que “ante a negativa do Estado em conferir salários compatíveis com a responsabilidade da atividade policial, especialmente em Minas Gerais, vê-se o profissional forçado a buscar atividades capazes de complementar sua renda e do atendimento a critérios mínimos de suporte e dignidade a sua família”. Para o relator Fábio Cherem o projeto busca a valorização das atividades do militar e uma complementação remuneratória.
O projeto segue para análise da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária.
Comissão analisa projeto de readaptação de militares
15 de Junho de 2016, 7:21Proposta busca permitir que PMs e bombeiros exerçam atividades compatíveis com sua incapacidade total ou parcial.
O deputado João Magalhães (à direita) opinou pela aprovação da matéria na forma do substitutivo nº 1 - Foto: Clarissa Barçante
O projeto que trata da readaptação dos militares da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar (CBM) teve parecer de 1º turno favorável aprovado nesta terça-feira (14/6/16) da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). De autoria do deputado Cabo Júlio (PMDB), o Projeto de Lei Complementar (PLC) 13/15 dispõe sobre a readaptação desses militares para fins de emprego em funções e atividades compatíveis com sua incapacidade, total ou parcial.
O relator foi o deputado João Magalhães (PMDB), presidente da Comissão de Administração Pública, que concordou com o posicionamento da Constituição e Justiça (CCJ), a qual havia opinado pela aprovação da matéria na forma do substitutivo nº 1. O PLC objetiva readaptar militares para o desempenho de atividades que estejam em conformidade com limitações físicas a que sejam acometidos.
Direitos e vantagens - Nesse sentido, o projeto traz o conceito de readaptação, qualificando-a como voluntária (requerida pelo militar) ou de ofício. Também prevê a quem caberá a iniciativa de requerer de ofício e a verificação e a comprovação da perda da condição física ou mental do militar. Estabelece como deverá se iniciar a readaptação, distinguindo-a em provisória e definitiva. E ainda, prevê direitos e vantagens a que faz jus quem for submetido ao processo, que necessitar deslocar-se de sua sede.
A proposição também determina que, enquanto durar a readaptação provisória, devem ser concedidas ao militar facilidades que lhe permitam participar em programa destinado à recuperação de suas condições de saúde, sem prejuízo do desempenho de suas funções.
Em relação à readaptação definitiva, estabelece o direito ao militar à promoção na carreira, observadas as condições previstas. Por último, a matéria estabelece o dever da PM e do CBM de promoverem a adaptação gradativa dos quartéis das corporações e a possibilidade de uso de uniforme diferenciado pelo militar readaptado.
João Magalhães, em seu parecer, explicou que o substitutivo faz adequações ao texto quanto à técnica legislativa. O PLC 13/15 segue agora para análise da Comissão de Segurança Pública
Defensoria Pública propõe medidas sobre a execução penal
15 de Junho de 2016, 7:08TRIBUNA DA DEFENSORIA
*O texto a seguir é resultado do II Encontro Nacional de Defensores Públicos de Execução Penal, que ocorreu nos dias 9 e 10 de junho, no Rio de Janeiro.
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CARTA DO RIO DE JANEIRO
Os defensores públicos brasileiros com atuação em execução penal, reunidos na capital do estado do Rio de Janeiro, no II Encontro Nacional de Defensores Públicos de Execução Penal, promovido pela Comissão Especializada em Execução Penal do Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais (CEEP-Condege), no período de 9 a 10 de junho de 2016, manifestam e propõem o que segue:
1. Métodos alternativos de gestão prisional
Os defensores públicos são receptivos, de modo geral, a métodos alternativos de gestão prisional. Porém, veem com precaução a implantação do modelo de parceria público-privada de unidades prisionais.
São reticentes ao PLS 513/11, nos termos de seus contornos atuais, haja vista que viola, de forma evidente, o modelo constitucional de assistência jurídica que deve ser prestado pela Defensoria Pública.
2. Mecanismos alternativos de combate ao super-encarceramento
2.1. Sistema ou princípio numerus clausus – Nota Técnica 03 da CEEP-Condege
Os defensores públicos do Brasil devem pleitear, nas unidades da federação, respeito à efetivação do numerus clausus, para fins de limitar o número de pessoas presas à capacidade máxima da unidade prisional.
2.2. Análise do monitoramento eletrônico no plano normativo atual e no âmbito dos projetos de lei que alteram a Lei de Execução Penal e o Código Penal — Nota Técnica 09 da CEEP-Condege
No âmbito do processo penal de conhecimento, o monitoramento eletrônico deve ser visto como exceção, pois a regra é a liberdade sem a referida restrição, no entanto, será cabível nas ocasiões em que o juiz manteria a pessoa presa se não tivesse à disposição o equipamento tecnológico.
No âmbito da execução penal, a aplicação da monitoração eletrônica é inconstitucional como regra, apenas sendo cabível para fins de diminuição dos efeitos deletérios da pena com o propósito de mitigar a superlotação carcerária.
2.3. ADPF 347 — Do Estado de Coisas Inconstitucional
Apoia-se as pretensões cautelares e definitivas veiculadas na ADPF 347.
Sugere-se, quando do enfrentamento do mérito, que o Supremo Tribunal Federal reanalise a possibilidade de o Judiciário antecipar concessão de direitos na execução da pena, considerando o Estado de Coisas Inconstitucional.
A denegação da medida cautelar no ponto acima mencionado não inibe os defensores de veicularem pretensões individuais e coletivas no âmbito dos órgãos jurisdicionais de instâncias inferiores.
2.4. Apoia-se a Portaria Conjunta 01/2016 da 1ª Vara de Execuções Penais de Curitiba
3. Impactos da política de drogas para o hiper encarceramento
Entende-se como necessária a fixação, pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, de critério de referência em relação à quantidade e natureza da droga para distinção qualitativa entre o uso e o tráfico.
Entende-se que os dispositivos das leis 8.072/90 e 11.343/06 que vedam o indulto para o crime de tráfico de drogas são inconstitucionais.
Apoia-se o indulto especial para mulheres aprovado pelo Plenário do CNPCP, tendo em vista que a população carcerária feminina não tem sido, em sua maioria, alcançada por este direito.
3.1. Compreensão e perspectivas do RE 635.659 – Recurso Extraordinário em julgamento pelo STF
O objeto de análise do recurso deve ser entendido pela suprema corte como o mais amplo possível, não se limitando ao exame de constitucionalização do uso de apenas uma droga específica.
4. Análise da Medida de Segurança no plano atual e perspectivas
Os defensores públicos que atuam nos processos criminais (de conhecimento e de execução penal) devem pleitear a aplicação, pelo Judiciário, da Lei Antimanicomial (Lei 10.216/01) e da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/15, artigo 81), a fim de que as vetustas disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal sejam afastadas.
É importante que a atuação da defesa criminal em prol das pessoas com deficiência mental seja interdisciplinar, em prol da efetividade do direito à saúde, para que não haja discriminação entre aquelas que não entraram em conflito com a lei. Assim sendo, recomenda-se que seja solicitado a RAPS (Rede de Atenção Psicossocial) que ela apresente projeto terapêutico singular (PTS). O PTS indicará o modo de acolhimento da pessoa pela RAPS, para o exercício do seu direito à convivência comunitária e ao tratamento de saúde mental pelos meios menos invasivos possíveis, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Faz-se importante que o defensor público monitore se o sistema de Justiça está respeitando a construção dialogada da rede de atenção psicossocial, a fim de que não haja uma interferência judicial quanto às decisões da atenção psicossociais que se regulam de modo próprio.
Além disso, é missão dos defensores públicos lutarem pela extinção dos HCTPs, com a substituição do modelo manicomial de cumprimento de medida de segurança para o modelo antimanicomial, cujo prazo previsto no artigo 6º, da Resolução CNPCP n. 4, de 30 de julho de 2010.
No que concerne à desinternação das pessoas abrigadas em Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, a atuação defensorial deve primar pela implementação do “projeto terapêutico singular”, para que as pessoas que se encontram internadas possam ser colocadas em liberdade, submetidas a tratamento menos segregacionista, ou então, caso estritamente necessária a persistência de internação, que as pessoas sejam alocadas em hospitais da rede de saúde que detenham estrutura assistencial multisetorial.
Apresenta-se como orientação segura o entendimento explicitado na Nota Técnica 06 da CEEP-Condege.
Os defensores públicos continuarão fomentando a implementação do contido nas portarias 94 e 95 em seus respectivos estados, bem como, onde não tiver ainda sido implantada a política de aplicação de medidas terapêuticas às pessoas com transtorno mental em conflito com a lei, tomarão as providências necessárias, instando as autoridades responsáveis à deflagração dos procedimentos para efetiva concretização da política.
5. Aportes interdisciplinares como contributo ao aprimoramento do sistema prisional
Em razão do reconhecimento do Estado de Coisas Inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, são cabíveis medidas compensatórias de natureza penal em prol da pessoa privada de liberdade encarcerada em condições degradantes, tais como a antecipação do livramento condicional ou a concessão de tal medida às pessoas que em princípio não teriam referido direito. Nessa linha, sugere-se a superação da análise estrita dos requisitos legais para a concessão de direitos passando-se a considerar também a situação degradante do cárcere.
Também é cabível a interpretação ampliativa do dispositivo constitucional que prevê o relaxamento imediato da prisão ilegal, no sentido de admitir ilegais inclusive as prisões cumpridas em condições carcerárias degradantes.
A atuação contramajoritária da Defensoria Pública na execução penal perpassa pela desconstrução do discurso midiático da proeminência da segurança em detrimento da liberdade através da aproximação da instituição com a sociedade civil.
6. Atuação da Defensoria Pública perante os tribunais superiores
A atuação da Defensoria Pública nas instâncias excepcionais requer maior articulação com os defensores públicos que oficiam nas instâncias ordinárias mediante a seleção estratégica dos casos concretos e teses jurídicas pertinentes que serão submetidas ao escrutínio judicial.
A excelência da atuação defensorial nas instâncias superiores exige a representação das Defensorias Públicas de todas as unidades federativas do país, viabilizando, no âmbito executivo-penal, que a realidade carcerária local, com as suas particularidades, seja exposta com mais fidelidade fática perante os julgadores.
7. A tutela coletiva promovida pela Defensoria Pública no âmbito do sistema prisional
A atuação da Defensoria Pública no âmbito da tutela coletiva constitui relevante mecanismo de proteção dos direitos fundamentais da pessoa privada de liberdade.
A atuação coletivizada da instituição não se restringe à esfera da judicialização, podendo implementar-se no âmbito extrajudicial, seja através do firmamento de termos de ajustamento de conduta, seja por meio do acionamento de órgãos estatais de controle e fiscalização.
8. Respeito às subjetividades: tutela dos grupos sociais vulneráveis no cárcere
8.1. Proteção dos direitos das mulheres no ambiente carcerário
O enfrentamento do exponencial aumento do encarceramento de mulheres verificado nos últimos anos exige a percepção sistêmica do problema e alterações legislativas que consideram as peculiaridades típicas do sexo feminino.
Instituir política institucional de atuação interdisciplinar para proteção das mulheres encarceradas, articulando-se a cooperação dos órgãos de execução penal, defesa criminal e defesa dos direitos da mulher, a fim de humanizar as condições de acolhimento de mulheres no cárcere com olhar específico de gênero.
A perspectiva de gênero incentiva a proposição de alterações legislativas que visem a promover uma desaceleração do encarceramento feminino.
8.2. Proteção dos direitos dos indígenas no ambiente carcerário
A especificidade do povo indígena impõe o inflexível respeito e irrestrita observação das práticas penais-culturais asseguradas pela Constituição da República, Estatuto do Índio e normas adventícias pertinentes, bem como a especialização da Defensoria Pública na defesa dos direitos individuais e coletivos dos índios, considerando a cidadania diferenciada.
Recomenda-se às Defensorias Públicas a consecução de levantamento da população indígena encarcerada nos estabelecimentos de privação de liberdade.
8.3. Proteção dos direitos das pessoas LGBT no ambiente carcerário
Promover a efetivação da Resolução Conjunta n° 01 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação/LGBT e Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária de 15 de abril de 2014, a fim de que as pessoas LGBT privadas de liberdade sejam integralmente respeitadas no tocante à sua identidade de gênero e orientação sexual, em conformidade com o disposto na Constituição da República, bem como nos Princípios de Yogyakarta extraídos do Painel de Especialistas das Nações Unidas.
Realizar atividades destinadas à capacitação de defensores públicos, servidores e estagiários para o atendimento humanizado da população LGBT, com vistas a evitar a reprodução da violência institucional LGBTfóbica pela Defensoria Pública.
Implementar nos estabelecimentos de privação de liberdade atividades de educação em direitos acerca da temática LGBT, em parceria com os órgãos estatais de administração penitenciária ou socioeducação, de modo a capacitar os agentes estatais, bem como empoderar as pessoas encarceradas.
9. Apresentação das Notas Técnicas da Comissão Especializada em Execução Penal do Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais (CEEP–Condege)
10. Considerações sobre o PLS 513/2013 – Altera a Lei de Execução Penal
Os defensores públicos apoiam o contido na Nota Técnica 13 da CEEP–Condege.
Rio de Janeiro, 10 de junho de 2016
Revista Consultor Jurídico
Supremo decidirá até quando abono de permanência deve ser pago a servidor
15 de Junho de 2016, 7:07REPERCUSSÃO GERAL
O momento de interrupção do pagamento do abono de permanência devido ao servidor público será analisado pelo Supremo Tribunal Federal. A dúvida está em se a suspensão deve ocorrer a partir do requerimento de aposentadoria ou se ao fim do processo de jubilação. O tema teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual da Corte e será discutido no Recurso Extraordinário 956.304.
Para o relator do recurso, ministro Dias Toffoli, a repercussão geral existe por causa do impacto nas contas públicas atuais e futuras. Toffoli disse ainda que a legitimidade do abono de permanência, introduzido no ordenamento jurídico pela Emenda Constitucional 41/2003, já foi reconhecida pelo STF, o que corrobora a relevância e a transcendência da matéria em julgamento neste caso.
Impacto nas contas atuais e futuras justifica repercussão geral do caso, segundo o ministro Dias Toffoli.stf.jus.brNo RE 956.304, o governo de Goiás questionou acórdão do Tribunal de Justiça, que, ao julgar mandado de segurança impetrado por entidade sindical dos servidores do Fisco estadual, entendeu que o pagamento do abono de permanência a quem requereu aposentadoria por tempo de contribuição deve ser mantido até a conclusão do processo.
A Constituição Federal determina que o servidor com condições para se aposentar voluntariamente por tempo de contribuição e opta por continuar trabalhando continuará contribuindo para o seu regime próprio de previdência, mas receberá o valor na forma de abono até a aposentadoria compulsória.
O governo estadual argumenta que a opção do servidor pela aposentadoria é contrária ao espírito da norma, de estímulo à continuidade no trabalho, e que o abono de permanência deve ser cessado quando formulado o pedido de aposentadoria voluntária.
A decisão do TJ-GO destaca que a suspensão do pagamento da vantagem em razão do requerimento de aposentadoria voluntária seria inaceitável.
Segundo o acórdão, a norma constitucional busca incentivar a permanência na ativa e promover uma economia ao poder público, que posterga o pagamento simultâneo dos proventos do servidor aposentado e da remuneração de seu substituto. Diz ainda que a suspensão é indevida, porque o processo de jubilação demora tempo considerável, só sendo finalizado com a apreciação da aposentadoria pelo Tribunal de Contas. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.
Revista Consultor Jurídico
Defesa de Eduardo Cunha terá cinco dias para se manifestar sobre pedido de prisão
15 de Junho de 2016, 7:06O ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu prazo de cinco dias para que a defesa do deputado federal afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se manifeste sobre o pedido de prisão preventiva do parlamentar formulado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O ministro adotou a medida na Ação Cautelar (AC) 4175. Em seu despacho, o relator determinou ainda a retirada do sigilo do processo.
Em vez da caneta do constituinte, armas dos militares mudaram a Constituição
14 de Junho de 2016, 19:11ACADEMIA DE POLÍCIA
É cediço que as atribuições dos órgãos policiais são elencadas taxativamente na Constituição Federal, que reserva as tarefas de prevenção e repressão de infrações penais a instituições distintas. À Polícia Militar incumbe a missão de polícia ostensiva e a preservação da ordem pública (artigo 144, parágrafo 5º da CF), enquanto à Polícia Civil e à Polícia Federal cabem as funções de polícia judiciária e apuração de infrações penais (artigo 144, parágrafos 1º e 4º da CF). A investigação criminal de crimes comuns deve ser feita pela polícia judiciária, tendo a Carta Maior autorizado a Polícia Militar a apurar somente os crimes militares.
Seguindo a diretriz constitucional, o artigo 4º do Código de Processo Penal estabelece que a apuração criminal é tarefa da autoridade policial, e o artigo 2º, parágrafo 1º da Lei 12.830/13 consagra que “ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei”. De outro lado, o artigo 8º do Código de Processo Penal Militar afirma que a investigação da Polícia Militar cinge-se aos crimes militares. Em adição, o Decreto-Lei 667/69 e o Decreto 88.777/83 conceituam as atividades de policiamento ostensivo e manutenção da ordem pública, evidenciando que são muito diferentes da investigação criminal — aliás, os termosinvestigação e apuração sequer são encontrados no texto legal.
A outorga dessa atribuição exclusivamente ao delegado de polícia não surpreende, ao se ter em mente que, no âmbito policial, apenas a autoridade policial pertence a uma carreira jurídica, conforme atestou a corte suprema[1] e o legislador[2]. Já quanto aos oficiais da Polícia Militar, ainda que tenham formação de grau superior, o STF asseverou que as atribuições desempenhadas pelos milicianos não são “sequer assemelhadas às da carreira jurídica”[3]. O Superior Tribunal de Justiça, de igual forma, constatou que a atividade do policial castrense “não caracteriza atividade relacionada a carreiras jurídicas”[4].
Por isso mesmo sustenta a doutrina que todo miliciano, do mais raso soldado ao mais antigo coronel, é considerado um agente da autoridade policial[5]. O legislador não divergiu e utilizou (artigo 301 do CPP) o termo agente da autoridade pra se referir a outros policiais que, por não serem autoridades, atuam sob o comando ou supervisão do delegado de polícia. Essa constatação, longe de desmerecer a importante função desempenhada pelos policiais fardados, apenas esclarece qual a missão de cada policial na persecução penal.
Nessa perspectiva, segundo o STF, nenhum outro agente público está autorizado a exercer função de autoridade policial:
Este tribunal reconheceu a inconstitucionalidade da designação de estranhos à carreira para o exercício da função de delegado de polícia, em razão de afronta ao disposto no artigo 144, parágrafo 4º, da Constituição do Brasil. Precedentes[6].
Em frontal violação ao parágrafo 4º do artigo 144 da Constituição, a expressão impugnada faculta a policiais civis e militares o desempenho de atividades que são privativas dos delegados de polícia de carreira. De outra parte, o parágrafo 5º do artigo 144 da Carta da República atribui às polícias militares a tarefa de realizar o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. O que não se confunde com as funções de polícia judiciária e apuração de infrações penais, estas, sim, de competência das polícias civis[7].
A doutrina não diverge do tribunal constitucional:
A Polícia Militar, por força do artigo 144 da Constituição da República, possui a função tão somente de realização de policiamento ostensivo e, como qualquer outro cidadão, prender em flagrante delito. A polícia judiciária é da Civil, frise-se. (...) Evidentemente, não estamos aqui satanizando a Polícia Militar, apenas indicando seu lugar. (...) Cuida-se de colocar cada personagem do sistema penal em seu lugar respectivo[8].
O artigo 144 não configura simples aconselhamento ou opinião, cuja observância esteja adstrita à vontade pessoal dos agentes. (...) A atuação dos órgãos estatais, necessariamente, deve ser pautada pelo princípio da legalidade, seguindo com rigor a definição prévia de atribuições e limites previstos para cada função[9].
Como admitir que um policial militar (cabo, sargento, capitão ou detentor de outra hierarquia) possa "conhecer" e "diligenciar" a respeito de infração de direito penal comum? Se à Polícia Civil não é deferida atribuição de apurar as infrações penais de natureza militar, a recíproca é também verdadeira[10].
Outrossim, as competências e atribuições que resultam diretamente do texto constitucional não podem ser ampliadas por interpretação extensiva da Constituição, que almeje encontrar funções implícitas num rol taxativo de funções[11].
Pois bem, conquanto a exegese dos mencionados dispositivos seja de clareza meridiana, infelizmente alguns vêm utilizando malabarismo hermenêutico para usurpar atribuição não outorgada pela Constituição e investigar crimes comuns nas sombras dos quartéis. Além de instaurar inquéritos para apurarhomicídios praticados por milicianos contra civis e lavrar termos circunstanciados de ocorrência[12], policiais militares estão cada vez mais se aventurando a investigar os cidadãos por toda sorte de crimes, conduzindo pessoas para destacamentos militares em pleno século XXI, num perigoso flerte com a ditadura militar.
A Polícia Militar não raras vezes se vale da P2 (serviço reservado ou velado) para investigar crimes comuns, sendo que esse serviço de inteligência deveria se limitar a apurar crimes militares e colher informações para subsidiar as decisões estratégicas do órgão (tal qual a alocação de viaturas e policiais). Os militares que abandonam suas fardas para investigar à paisana arvoram-se na condição de autoridade policial e, como num passe de mágica, convertem o quartel numa delegacia de polícia medieval. Promovem apurações informais, mitigando direitos fundamentais sem submissão aos rígidos prazos judiciais, passando ao largo do controle externo do Ministério Público e inviabilizando a atuação defensiva (que foi reforçada com a Lei 13.245/16)[13].
A afronta tem sido tamanha que a Secretaria Nacional de Direitos Humanos se viu obrigada e editar a Resolução 8/12, que em seu artigo 2º, XI coíbe tais apurações inconstitucionais, sendo repelidas também pela doutrina:
Qualquer atividade investigatório-criminal seja ou não “discreta”, PM2 etc., realizada por policiais militares, reveste-se de inconstitucionalidade, podendo, inclusive, constituir crime de abuso de autoridade (Lei 4.898/65). Nesses casos, deverão responder penalmente, como autores mediatos, as autoridades responsáveis pelo comando. E, ainda, em casos excepcionais, os próprios agentes policiais poderão responder criminalmente por usurpação de função pública. Ademais, a” insegurança” e a falta de policiamento ostensivo, em todas as grandes cidades do país, estão a exigir mais empenho das corporações militares[14].
A Constituição está sendo reescrita. A cada telefone interceptado, cada busca e apreensão domiciliar e cada campana arquitetada pela PM, a repartição constitucional de atribuições perde força, em prejuízo do cidadão e benefício da ambição corporativista dos milicianos. Não há nenhum problema em reformar a Constituição, desde que pela caneta do constituinte, mas nunca pelas armas dos militares. Estamos assistindo a uma verdadeira redistribuição manu militari de atribuições constitucionais.
Vale grifar que, ainda que a Lei Fundamental fosse alterada pelos meios adequados, militarizar a investigação significaria andar na contramão da história[15], num contexto em que a desmilitarização não apenas da apuração de crimes, mas do próprio policiamento ostensivo, vem sendo defendida por juristas[16], estudiosos das ciências sociais[17], militares[18] e instituições nacionais e internacionais de defesa dos direitos humanos, tais como IBCCrim[19], Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas[20], Corte Interamericana de Direitos Humanos[21], Anistia Internacional[22], Comissão Nacional da Verdade[23] e Secretaria Nacional de Direitos Humanos[24].
Mesmo que se reconheça que as polícias judiciárias precisam de investimentos para melhor desempenhar seu mister, as máculas estruturais e o discurso de combate à criminalidade não têm o condão de autorizar a militarização da investigação e a mitigação da carta constitucional de direitos fundamentais. A sanha utilitarista não pode jogar por terra garantias que não foram conquistadas do dia para a noite. É preciso lembrar que, em se tratando da prática de atos invasivos dos direitos fundamentais, o agente estatal deve necessariamente observar a estrita legalidade[25], postulado congênito ao Estado de Direito[26]. A investigação deve se curvar à Constituição, e não vice-versa.
Sempre que um agente público incompetente se imiscui em função alheia, as consequências para a persecução penal são desastrosas, acarretando a ilicitude de provas, a ineficiência do Estado e a responsabilização pessoal do agente usurpador[27]. De mais a mais, deixa o Brasil sujeito a nova condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, tal como ocorreu no Caso Escher[28], em que um policial militar usurpou as atribuições da polícia investigativa com a cumplicidade do Judiciário, gerando uma indenização de US$ 30 mil.
Demonstrados os nefastos efeitos da apuração militarizada, espanta o fato de que muitas dessas investigações sub-reptícias são feitas com a chancela de promotores de Justiça, que formulam pedidos de medidas cautelares com suporte único nas apurações draconianas da PM e transformam pedidos feitos pelos milicianos em requerimentos judiciais; com a indiferença de delegados de polícia, que lavram flagrantes e indiciam com base exclusiva em provas ilícitas decorrentes de cautelares probatórias requeridas ou cumpridas autonomamente pela PM; com a omissão de defensores públicos e advogados, que sequer questionam os elementos ilegais angariados; ou com a conivência de juízes, que chegam a deferir as representações feitas por policiais militares. Essa parcela de atores jurídicos fecha os olhos para o aviso do Tribunal Constitucional e da Corte Interamericana de Direitos Humanos e contribui para o sepultamento da legitimidade da persecução criminal.
Quando ausente esse apoio, um artifício bastante comum para conferir ares de licitude a uma prisão decorrente de investigação militarizada é camuflá-la como denúncia anônima ou policiamento rotineiro. A PM investiga um delito comum, executando campana, interceptação telefônica, ouvindo testemunhas ou adotando outros meios de apuração e, após surpreender o agente em flagrante delito, justifica a ação policial como derivada de delação apócrifa ou de abordagem ocasional em patrulhamento de rotina. Também costuma utilizar eufemismos como investigação preventiva ou levantamentoa pretexto de legitimar um abuso que flerta com o Estado policial, propositalmente confundindo ato de polícia ostensiva com ato de investigação.
É preciso deixar claro que a exigência do respeito à divisão constitucional de atribuições em nada macula a importância da polícia castrense e a necessidade de convivência harmônica com a polícia investigativa. Porém, as precisas palavras do ministro Celso de Mello merecem destaque:
Essencial que se construa, com estrita observância do que dispõe a Carta Política, um sistema organizado de proteção social contra a violência arbitrária da Polícia Militar (lamentavelmente em processo de contínua expansão) e de imediata reação estatal. (...) É preciso advertir esses setores marginais que atuam criminosamente na periferia das corporações policiais que ninguém, absolutamente ninguém — inclusive a Polícia Militar — está acima das leis[29].
Nenhuma garantia constitucional é pequena demais para ser jogada no lixo. A escuridão da caserna não é lugar adequado para se apurar crimes comuns. A garantia de ser investigado apenas pela autoridade de polícia judiciária devida, em respeito ao princípio do delegado natural[30], revela-se verdadeiro direito fundamental do cidadão. Os fins não justificam os meios no campo da devida investigação criminal, em que forma significa garantia[31] e condição necessária da confiança dos cidadãos na Justiça[32].
[1] STF, Tribunal Pleno, ADI 3.441, rel. min. Carlos Britto, DJ 9/3/2007; STF, Tribunal Pleno, ADI 2.427, rel. min. Eros Grau, DJ 30/8/2006; STF, tribunal pleno, ADI 3.460, rel. min. Ayres Brito, DJ 31/8/2006.
[5] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 827; TORNAGHI, Hélio. Instituições de Processo Penal. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 406; SANTOS, Célio Jacinto dos. In: DEZAN, Sandro Lúcio; PEREIRA, Eliomar da Silva (Org.).Investigação criminal. Curitiba: Juruá, 2013, p. 64.
[8] ROSA, Alexandre Morais da; KHALED JUNIOR, Salah H. Polícia Militar não pode lavrar Termo Circunstanciado: cada um no seu quadrado. Justificando.com. 7/1/2014.
[9] FREITAS, Jéssica Oníria Ferreira de; PINTO, Felipe Martins. Da ilegitimidade dos atos probatórios desenvolvidos pela Polícia Militar: uma análise sob a ótica do princípio da legalidade. Revista Duc In Altum - Caderno de Direito. v. 4. n. 6. jul-dez. 2012.
[12] CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Termo circunstanciado deve ser lavrado pelo delegado, e não pela PM ou PRF. Revista Consultor Jurídico, set. 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-set-29/academia-policia-termo-circunstanciado-lavrado-delegado>. Acesso em: 29.set.2015; CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. PM homicida deve ser investigado pela Polícia Judiciária. Revista Consultor Jurídico, jan.2016. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-jan-05/academia-policia-pm-homicida-investigado-policia-judiciaria>. Acesso em: 5.jan.2016.
[13] CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de; COSTA, Adriano Sousa.Advogado é importante no inquérito policial, mas não obrigatório. Revista Consultor Jurídico, jan. 2016. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-jan-14/advogado-importante-inquerito-policial-nao-obrigatorio>. Acesso em: 14.jan.2016.
[14] NUCCI, Guilherme de Souza. Juizados Especiais Criminais Federais. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 57-58.
[15] CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de; SANNINI NETO, Francisco.Antes de discutir o ciclo completo, é preciso desmilitarizar a polícia. Revista Consultor Jurídico, out.2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-out-19/antes-discutir-ciclo-completo-preciso-desmilitarizar-policia>. Acesso em: 6.dez.2015.
[16] VIANNA, Túlio. Desmilitarizar e unificar a polícia. Revista Fórum, jan.2013. Disponível em: <http://www.revistaforum.com.br/blog/2013/01/desmilitarizar-e-unificar-a-policia>. Acesso em: 7.set.2015.
[17] MOURÃO, Janne Calhau. Só nos resta a escolha de Sofia? Tortura, Brasília, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, 2010, p. 215-216; MANSO, Bruno Paes. O homem x. Uma reportagem sobre a alma do assassino em São Paulo. Rio de Janeiro: Record, 2005, p. 220-221/249.
[18] SOUZA, Adilson Paes de. A educação em direitos humanos na Polícia Militar. 2012. 156 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.
[19] Advertências à militarização da ideia de segurança pública. Editorial do Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, n. 206, jan.2010. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/4011-EDITORIAL-Advertncias-militarizao-da-ideia-de-segurana-pblica>. Acesso em: 8.set.2015;"Ciclo completo de Polícia": ou indevida investigação legal. Editorial do Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, n. 199, jun.2009. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br/boletim_editorial/236-199-Junho-2009>. Acesso em: 8.set.2015.
[21] Caso Escher e Outros vs Brasil, Sentença de 6/7/2009; Caso Castillo Petruzzi e Outros vs Peru, Sentença de 30/5/1999.
[23] Comissão Nacional da Verdade. Relatório. Volume I. Parte V. Conclusões e recomendações. p. 971.
[24] Resolução 8/12, que busca, dentre outras coisas, coibir a investigação de crimes comuns pelo Serviço Reservado da Polícia Militar (P2).
[25] Artigo 37 da CF; artigo 2º, a da Lei 4.717/65; artigos 2º, 11, 13, III e 53 da Lei 9.784/99; artigos 1º e 2º Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei (Resolução 34/169 da ONU).
[26] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 97.
[27] CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Termo circunstanciado deve ser lavrado pelo delegado, e não pela PM ou PRF. Revista Consultor Jurídico, set. 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-set-29/academia-policia-termo-circunstanciado-lavrado-delegado>. Acesso em: 6.dez.2015.
[30] ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. Salvador: JusPodivum, 2016, p. 148/149; NUCCI, Guilherme de Souza. Prática forense penal. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 32.
[31] HASSEMER, Winfried. Critica al derecho penal de hoy. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 1998, p. 82.
Henrique Hoffmann Monteiro de Castro é delegado de Polícia Civil do Paraná, mestrando em Direito pela Uenp, especialista em Direito Penal e Processual Penal pela UGF e em Segurança Pública pela Uniesp. Também é professor convidado da Escola Nacional de Polícia Judiciária, da Escola Superior de Polícia Civil do Paraná, da Escola da Magistratura do Paraná e da Escola do Ministério Público do Paraná e professor-coordenador do Curso CEI e da pós-graduação em Ciências Criminais da Facnopar. Redes sociais: Facebook,Twitter, Periscope e Instagram
Revista Consultor Jurídico
Deputado quer proteger Polícia Militar de Minas Gerais de assédio moral
14 de Junho de 2016, 18:33"UMA LUTA INICIADA EM 2000 PARA O COMBATE E PREVENÇÃO DO ASSEDIO MORAL NAS INSTITUIÇÕES MILITARES, E A PUNIÇÃO DOS AGRESSORES QUE SE ESCONDEM SOB O MANTO DA HIERÁRQUIA."
(foto: João Miranda/Esp. EM/D.A Press)
(foto: João Miranda/Esp. EM/D.A Press)
Projeto do deputado Sargento Rodrigues (PDT) está pronto para ir a plenário e prevê até demissão. Veja abaixo os 11 casos que tipificam o assédio moral
m projeto em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais prevê punição por assédio moral contra militar. A infração prevista no texto lista como prováveis infratores qualquer servidor público estadual, das administrações direta e indireta dos três poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário.
Saiba mais
De autoria do deputado Sargento Rodrigues (PDT), a proposta descreve 11 comportamentos que, conforme o parlmentar, tipificam a infração (veja a lista abaixo). A punição prevista vai de sanções administrativas, repreensão, suspensão e até a demissão. A sentença será graduada conforme a extensão do dano e das reincidências do infrator.
O projeto também define o conceito de agente público, envolvendo titulares de mandato eletivo e demais ocupantes de cargos públicos, quer seja em forma de empregos ou funções públicas, submetidos ao regime estatutário ou ao regime celetista.
Demissão
O projeto, que já passou pelas comissões da Assembleia e está pronto para ir a plenário, vai exigir dois turnos para aprovação. Também está no texto da proposta que ocupantes de cargos comissionados e demitidos por assédio moral ficam proibidos de exercer cargo dessa natureza pelo período de cinco anos.
A proposição atribui competência aos comandantes-gerais da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar para a criação de comissões de conciliação, com representantes da administração e das entidades associativas representativas da categoria. A justificativa para as comissões é buscar soluções não ligitiosas para os casos de assédio moral.
Pré-requisitos para haver assédio moral, segundo o projeto de lei:
- Desqualificar, reiteradamente, por meio de palavras, gestos ou atitudes, a autoestima, a segurança ou a imagem de militar, valendo-se de posição hierárquica ou funcional superior, equivalente ou inferior;
- Deesrespeitar limitação individual de militar, decorrente de doença física ou psíquica, atribuindo-lhe atividade incompatível com suas necessidades especiais;
- Preterir militar, em quaisquer escolhas, em função de raça, sexo, nacionalidade, cor, idade, religião, posição social, preferência ou orientação política, sexual ou filosófica;
- Atribuir, de modo frequente, a militar função incompatível com sua formação acadêmica ou técnica especializada ou que dependa de treinamento;
- Isolar ou incentivar o isolamento de militar, privando-o de informações, de treinamentos necessários ao desenvolvimento de suas funções ou do convívio com seus colegas;
- Manifestar-se jocosamente em detrimento da imagem de militar, submetendo-o a situação vexatória, ou fomentar boatos inidôneos e comentários maliciosos;
- Subestimar, em público, as aptidões e competências de militar;
- Manifestar publicamente desdém ou desprezo por militar ou pelo produto de seu trabalho;
- Relegar intencionalmente militar ao ostracismo;
- Apresentar com suas ideias, propostas, projetos ou quaisquer trabalhos de outro militar;
- Valer-se de cargo ou função comissionada para induzir ou persuadir militar a praticar ato ilegal ou deixar de praticar ato determinado em lei.
Debate sobre controle de armas entra com tudo na eleição norte-americana
14 de Junho de 2016, 11:09O massacre na boate Pulse, em Orlando, deve expor ainda mais as divergências entre republicanos e democratas e virar mote de campanha eleitoral, acreditam especialistas consultados pela Gazeta do Povo. Em ambos os partidos, contudo, estarão em debate assuntos muito arraigados na cultura dos Estados Unidos, como o direito ao porte de armas e a relação com estrangeiros.
Donald Trump, potencial candidato republicano, usou o episódio para reforçar arepulsa aos muçulmanos e aos imigrantes – apesar de o atirador Omar Mateen ter nascido nos Estados Unidos, os pais dele são afegãos. Já a pré-candidata republicana Hillary Clinton aproveitou a oportunidade para falar sobre a necessidade de controlar o acesso a rifles de assalto, como os usados pelo atirador e capazes de matar dezenas de pessoas numa única investida.
Quem eram as vítimas do atentado em Orlando?
O professor Eduardo Saldanha, de Relações Internacionais da FAE, destaca que Trump escolheu como estratégia atacar a imigração muçulmana. Ele enfatiza que os republicanos são mais afeitos ao discurso bélico, da busca do combate ao terrorismo. Já Hillary, na opinião de Saldanha, falou pontualmente sobre o controle de armas, mas deixou o assunto para os democratas que já defenderam, no passado, claramente as suas posições, como é o caso de Obama, evitando assim uma exposição perigosa para a candidata.
O professor ainda salienta que, toda vez que há um tiroteio de grande repercussão, o presidente vai a público cobrar a restrição às armas. Apesar da opinião democrata sobre o assunto, o controle mais rigoroso não teria avançado por causa de lobbys entre os congressistas. “Ele usa esses momentos para tentar pressionar o Congresso”, comenta.
Para Vanessa Fontana, professora da Uninter e doutora da Ciência Política, o discurso republicano, que busca endurecer os processos migratórios e é mais intolerante, recria a panaceia do inimigo. “É alguém que precisa ser combatido. Mas ele não tem um rosto, pode ser qualquer um”, diz. Ela acredita que o atentado terá reflexos eleitorais e que os democratas tentarão rechaçar o que houve em Orlando, mas sem bater de frente com a indústria armamentícia.
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Sobre o efeito potencial nas eleições norte-americanas, marcadas para novembro, os dois professores discordam. Enquanto Saldanha acredita que Trump, ao reforçar um discurso intolerante, mais perde do que ganha, Vanessa pondera que ele apela para o emocional, que pode gerar comoção e trazer eleitores.
Número de vítimas em junho já é o maior dos últimos três anos
O massacre na boate Pulse aumentou em 20% o número de mortos em atentados nos Estados Unidos em 2016. O ano já caminhava para ser o mais letal em tiroteios, com a maior média diária e mensal – com o atual mês, mesmo apenas ainda na metade, sendo o mais sangrento dos últimos 42 meses, com 72 assassinados até o momento. Até domingo (12), 285 pessoas foram mortas nesse tipo de ação violenta nos Estados Unidos neste ano. Em 2015, foram 469 mortos. O levantamento é da organização “Guns are cool” e inclui apenas situações que envolvem um atirador e mais de quatro vítimas desconhecidas do autor – ou seja, não é um tipo de violência personalizada. O grupo usa uma metodologia diferente do FBI, a policia federal dos EUA, que considera um fuzilamento em massa apenas casos em que morrem mais de quatro pessoas.
Constitucional
Nos Estados Unidos, o direito de portar armas é assegurado pela Segunda Emenda à Constituição Federal, aprovada em 1791. No entanto, os estados são autônomos para legislar sobre o assunto. No estado de Nova York, por exemplo, foi aprovada em janeiro de 2013 uma das leis mais rigorosas do país. As mudanças ocorreram após o massacre em uma escola na cidade de Newtown em dezembro de 2012, com 26 mortos.
Os oito tiroteios mais sangrentos dos EUA
Fonte: Redação. Infografia: Gazeta do Povo.
Brasil amarga o preço da intolerância e lidera ranking de violência contra homossexuais
14 de Junho de 2016, 8:17O país registra uma morte a cada 28 horas. Só no ano passado, 312 gays, lésbicas e travestis foram mortos, a maioria com requintes de crueldade
Wanderson da Silva (esq.), de 15 anos, foi assassinado na semana passada. João Antônio Donati(dir), de 18 anos, foi espancado e asfixiado até a morte
Wanderson Silva faria 16 anos no dia 28 de outubro, mas foi brutalmente assassinado na semana passada. Hoje, faz parte das estatísticas de crimes homofóbicos registrados no Brasil. Segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB), que registra os casos de assassinatos da população LGBT (lésbicas, gays,bissexuais e transgêneros) a partir de informações publicadas em jornais e enviadas por organizações não governamentais, um homossexual é morto a cada 28 horas no Brasil. Ano passado, foram 312 gays, travestis e lésbicas assassinados. Uma pequena redução em relação a 2012, quando foram registradas 338 mortes. Nas duas últimas semanas, já são 13 casos. O Brasil também lidera o ranking do assassinato de transexuais. Segundo relatório da ONG internacional Transgender Europe, o Brasil, entre janeiro de 2008 e abril de 2013, teve 486 mortes de transexuais.
Saiba mais
De janeiro até agora, foram 214 mortes, a maioria delas de forma violenta. Caso de Wanderson, assassinado quarta-feira, em Bayeux, no interior da Paraíba. Antes de ser morto com tiros na nuca e no peito, foi espancado e teve o cabelo, uma longa franja pintada de vermelho, raspado. Nenhum pertence do garoto foi levado. Mesmo fim teve João Antônio Donati, de 18, também homossexual, espancado e asfixiado, em 11 de setembro, com uma sacola plástica e pedaços de papel colocados à força em sua boca. E a travesti Karen Alanis, de 23, morta no início de setembro, em Caçapava, no interior de São Paulo, depois de ter sido jogada para fora de um veículo em movimento.
De acordo com um dos fundadores do Grupo Gay da Bahia, o antropólogo Luiz Mott, o Brasil segue campeão de assassinatos da população LGBT, segundo um ranking mundial feito pela Associação Internacional de Gays e Lésbicas, em inglês, International Lesbian and Gay Association (ILGA). Segundo ele, no ano passado, o Brasil foi responsável por 44% das mortes de LGBTs em todo o mundo. “E olha que os nossos números de mortes são subnotificados, pois, infelizmente, não existe no Brasil um banco de dados governamental sobre mortes de LGBT.”
Recentemente, no Rio de Janeiro, de acordo com Mott, a orientação sexual da vítima passou a constar nos boletins de ocorrência da Polícia Militar, o que facilita o levantamento desses casos. “Mas é uma atitude isolada.” Para Mott, a conquista de direitos e a população alcançada nos últimos anos são um dos motivos da escalada da violência contra a população LGBT. “Quanto mais pessoas saem do armário, mais ódio elas despertam.”
Responsabilidade
Para Majú Giorgi, de 48, jornalista e uma das fundadoras do movimento “Mães pela igualdade”, criada para combater o preconceito enfrentado pelas famílias que têm filhos homossexuais, o estado também é um dos responsáveis por essa escalada de violência. “Ele tem sim responsabilidade por essa realidade absurda à medida que se ajoelha ao fundamentalismo e às forças conservadoras e inibe ações de políticas públicas para essa população, quando não faz absolutamente nada para proteger a fragilidade dessas pessoas”, critica.
Um exemplo disso, segundo ele, é a retirada do kit anti-homofobia das escolas. O material era um manual para preparar professores para lidar com a discriminação e o bullyng homotransfóbico na escola pública e que foi retirado pelo Ministério da Educação por causa da pressão da bancada evangélica, que acusava a cartilha de ser um incentivo à homossexualidade. “Não vejo saída se a sociedade não se levantar para defender essa minoria que está sendo perseguida, humilhada, vilipendiada, torturada e morta. Por isso, vamos debater com a sociedade, que é o caminho que nos resta e também o menos nebuloso e o mais isento”, defende Majú, mãe do fotógrafo André Giorgi, de 25, que na adolescência assumiu ser gay e sempre teve o apoio da família.
Avelino Fortuna, de 59, agrimensor, também faz parte do movimento “Mães pela diversidade”. Ele entrou no grupo depois que seu filho, o jornalista Lucas Fortuna, de 28, foi assassinado no final de 2012, em Pernambuco, também vítima de homofobia. “Ele foi espancado brutalmente e depois jogado no mar. A carteira dele não foi levada. Para a gente, a motivação foi a homofobia”, conta seu Avelino, que só se refere ao filho como “meu menino”. Segundo ele, cada “menino” que morre como o dele é como se Lucas tivesse sendo de novo assassinado.
Avelino cobra rigor na legislação que pune crimes de ódio, legislação ainda inexistente no Brasil. Desde 2010, tramita um projeto de lei que criminaliza a homofobia e este ano a deputada federal Maria do Rosário, que foi ministra da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, protocolou um projeto de lei que aumenta a pena para os chamados crimes de ódio, incluindo os motivados por preconceito em relação à orientação sexual.
Para a jornalista Majú Giorgi (Esq.), estado também tem responsabilidade. Luiz Mott (dir.), do Grupo Gay da Bahia: "Números são subnotificados"
Depoimentos
Avelino Furtado, de 59 anos , agrimensor, pai de Lucas Furtado, jornalista e militante LGBT, assassinado aos 28 anos
“A orientação sexual não tem nada a ver com o caráter da pessoa. Aprendi a amar mais ainda meu filho no dia em que descobri que ele não era o machão que a sociedade queria que ele fosse, mas era um grande homem. Um dos melhores que já conheci. Infelizmente, teve sua vida arrancada logo cedo por causa do preconceito, da homofobia. Como meu menino, muitos outros estão sendo mortos por aí, da mesma maneira cruel, pelos mesmos motivos. Sofro muito, Não podemos aceitar que isso continue acontecendo.”
Joselito Costa, de 46 anos, carreteiro, pai de Wanderson Silva, assassinado aos 15 anos
O preçio
“Tem muito preconceito contra homossexual, mas nada justifica a violência que vem sendo praticada. Meu filho só tinha 15 anos. Sempre foi um menino bom, extrovertido. Quando ficou rapazinho, virou gay e nem todo mundo aceita isso. Tem gente que não suporta conviver com gays. Acho que essa violência acontece por isso. A família está toda em choque com a violência. Foi muita perversidade.”
A cultura do estupro não apenas existe, mas também mata
14 de Junho de 2016, 7:46MP NO DEBATE
O Brasil está em estado de choque após o caso da adolescente do Rio de Janeiro que foi estuprada por diversos homens, tendo sua imagem exposta nas redes sociais, por iniciativa desses autores do crime, que contam com a impunidade estatal e a aprovação social. Casos semelhantes são verificados em outras regiões do Brasil, tendo sido amplamente divulgado três casos de estupro coletivo de adolescentes no Piauí. Nesse contexto, o atual debate sobre a denominada “cultura do estupro” pode gerar resultados positivos, isso se mudarmos os paradigmas para a efetivação das leis já existentes.
Em todos os casos, iniciaram-se imediatamente ataques às vítimas, às suas condutas, aos seus comportamentos, aos seus antecedentes infracionais e à forma como se vestiam. Tais questionamentos decorrem da cultura brasileira, que ainda é significativamente machista e patriarcal. Por essa razão, a vítima é muitas vezes vista como a principal responsável e “culpada” pelo estupro que sofreu. Um dos investigados, como no caso do estupro coletivo do Rio, verbalizou que a vítima não deveria estar naquele local. Nas redes sociais, algumas pessoas sustentaram que, se a vítima estava no baile funk, isso indicou aos autores do crime que a jovem estava disponível. Outras pessoas comentam que se a adolescente era usuária de drogas, isso demonstraria que a vítima anuiu com o ato sexual.
O que a sociedade precisa compreender é que o estupro é um crime contra a dignidade sexual da vítima, portanto, se há violência ou grave ameaça e não houve consentimento, configura-se o crime. Se a vítima estava no baile funk ou não, a forma como ela estava vestida, a forma como ela se comportava, nada disso importa se ela não consentiu com a prática do ato sexual. O sistema de Justiça precisa começar a respeitar e dar uma maior credibilidade à palavra da vítima.
O estupro é um crime gravíssimo. As consequências para a vítima são nefastas e permanecem para o resto da vida. Uma jovem chamada Isadora, que estudava na Universidade Seropédica Rural do Rio de Janeiro, três anos e meio após ter sido estuprada por colegas, dentro de um dormitório da própria instituição, não aguentou a pressão, adoeceu, entrou em depressão e se matou em maio deste ano.
O estupro atinge em grande quantidade as crianças, em especial as meninas. A ginecologista Cláudia Cabral descreveu, com detalhes, um caso de terrível de uma menina de apenas 10 anos de idade que foi vítima de um vizinho: “Ela estava muda por mais de 2 meses, e o único som que eu ouvi foi um choro baixo e doído. O exame ginecológico era indescritível. Parecia ter sido submetida à tortura com aqueles aparelhos medievais inimagináveis. Sua vulva era um buraco só. Havia ruptura perineal completa, unindo uretra, vagina e ânus num buraco irregular e único. Imaginei a dor física. Só imaginei. Imaginei a dor psicológica. Só imaginei. E chorei. Nunca me esqueci. O que nunca consegui imaginar foi que criatura teria feito aquilo com ela. Estou sem resposta até hoje”[1].
Nesse tipo de crime, por mais surpreendente que possa parecer, o agressor normalmente é alguém conhecido da vítima, como um vizinho, ou alguém que tem um grau de parentesco e relação de autoridade com a vítima, como o pai, o padrasto, o tio ou o avô. Como proteger as meninas se elas são atacadas dentro do local onde deveriam ser protegidas, como o seu lar?
Casos como esses não podem acontecer, portanto, devemos trabalhar diariamente nessa questão no âmbito do Grupo de Enfrentamento à Violência Doméstica do Ministério Público do Estado de São Paulo. Precisamos dar um basta à violência sexual contra crianças, adolescente e mulheres. Porém, como dar efetividade às leis já existentes?
Após o clamor público do caso do estupro coletivo no Rio de Janeiro, o Congresso Nacional correu para editar uma lei que aumenta as penas em caso de estupro coletivo. O discurso de criação de leis, sem o devido aparelhamento dos órgãos e desenvolvimento de políticas públicas, é um discurso vazio. Estima-se que apenas entre 10% e 35% dos estupros no Brasil sejam relatados às autoridades ou ao sistema de saúde. Mesmo com essa subnotificação notória, a polícia brasileira registra o altíssimo número de 1 caso de estupro a cada 11 minutos.
O Ministério da Saúde fez levantamento sobre o impacto da violência contra as mulheres no Brasil e chegou à conclusão de que mais da metade das mortes de mulheres e adolescentes vítimas de estupro são de jovens com menos de 19 anos. Das adolescentes e crianças menores de 13 anos que deram à luz no ano passado, pelo menos 6% foi vítima de estupro[2].
Os crimes sexuais já recebem uma pena longe de ser baixa e, nos casos do estupro de vulneráveis, já são considerados crimes hediondos, portanto, a simplificação do aumento simbólico das penas não terá resultados efetivos[3]. Nos termos do Código Penal, entende-se por estupro: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”, com pena de 6 a 10 anos de reclusão. Caso resulte em lesão corporal grave, a pena é de 8 a 12 anos de reclusão. No caso de resultar em morte, a pena é de 12 a 30 anos de reclusão. No caso do estupro de vulnerável, ou seja, “ter conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 (quatorze) anos”, a pena é de 8 a 15 anos. Na mesma pena incorre quem pratica tais atos com pessoa que tem enfermidade ou deficiência mental. Se resulta lesão grave, a pena é de 10 a 20 anos, e se resulta morte, 12 a 30 anos.
Na área da saúde reprodutiva da mulher, os avanços e retrocessos são evidentes: se por um lado existe a Lei 12.845/2013, que prevê a obrigatoriedade de atendimento no SUS às meninas e mulheres vítimas de violência sexual, por outro lado, já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, o famigerado PL 5.069, de autoria do deputado Eduardo Cunha, que pretende impedir que as mulheres e meninas tenham pleno acesso ao SUS, dificultando muito o caminho das vítimas de estupro. O uso de contraceptivo de emergência, a proteção contra a gravidez indesejada, a prevenção de HIV e de outras doenças sexualmente transmissíveis são direitos da vítima e importantes providências para o apoio e cura de seus traumas psicológicos e físicos. Em São Paulo, existe o Hospital Pérola Byington, que é referência nessa área, onde meninas e mulheres de distintos locais procuram ajuda e atendimento. Todavia, sabemos que no Brasil não existem equipamentos de saúde adequados e em número suficientes, tanto no interior de São Paulo, como em todos os estados do Brasil, desde a região Sul até a Norte.
A Constituição brasileira assegura a igualdade entre todos os brasileiros, sendo vedada qualquer forma de discriminação. A violência sexual é uma forma de discriminação. A interpretação da lei não pode ser feita de forma literal, mas deve levar em conta todo o sistema jurídico, inclusive o texto constitucional e os tratados internacionais que foram ratificados pelo Brasil, como a Convenção CEDAW (Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher) — e todos vedam a discriminação e a violência contra a mulher — e a Convenção Belém do Pará[4].
O Estado brasileiro precisa cumprir com suas obrigações contidas no Direito interno (Código Penal e Constituição Federal) como nos tratados internacionais, proporcionando a prevenção dos crimes de estupro e a sua punição também, além de oferecer o acesso à saúde às vítimas de estupro.
Chegou o momento da mudança de paradigmas e efetivação das leis existentes. O Ministério Público Democrático trabalha nessa direção. Que o choque proporcionado por esses trágicos casos das adolescentes do Rio de Janeiro ou das jovens do Piauí, todos seus sofrimentos, desesperos e de todas as meninas e mulheres vítimas de estupro no Brasil não tenham sido em vão, e que sejam capazes de gerar uma maior proteção às meninas e mulheres e proporcionar um debate mais aprofundado sobre a “cultura do estupro” e a necessidade de desenvolvimento de equidade de gênero. Por uma política mais inclusiva das mulheres em todos os níveis de governo. Menos tolerância com a violência contra as mulheres e meninas, educação sexual e de gênero nas escolas e universidades, o peso das leis para investigar, processar e punir os autores de estupro, sem demagogias como o aumento simbólico de penas, mais sensibilidade de gênero em todos os níveis de governo, Executivo, Legislativo e Judiciário. Por fim, temos que ter a consciência de que não podemos retroceder nos avanços já conquistados, e dizer um sonoro "não" ao famigerado PL 5.069, e aos pretendidos retrocessos de não permitir o aborto legal, em caso de estupro.
A sociedade brasileira, por meio de distintos órgãos, está expressando sua mobilização e indignação, em especial as jovens estudantes e feministas, nascendo dessa maneira uma nova luz e uma forte esperança de transformação social e de incansável combate à “cultura de estupro”, que não apenas existe, mas também mata.
*Texto modificado às 17h do dia 13/6/2016 a pedido da autora.
[1] Reportagem da Globo News, http://g1.globo.com/globo-news/noticia/2016/06/medica-faz-relato-emocionado-sobre-menina-vitima-de-estupro-aos-10-anos.html, em 9/6/2016.
[2] O Estado de S. Paulo, http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,metade-das-mulheres-vitimas-de-estupro-que-morrem-tem-menos-de-19-anos,10000055961, em 9/6/2016.
[4] PAES, Fabiana, Estupro: crime e consentimento, Jornal do Brasil,http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2016/06/03/estupro-crime-e-consentimento, em 8/6/2016.
Fabiana Dal'Mas Rocha Paes é promotora de Justiça do MP-SP (atua no Grupo de Enfrentamento à Violência Doméstica), diretora do Ministério Público Democrático, mestre em Direitos Humanos e Justiça Social pela Universidade de New South Wales (Sydney, Austrália) e doutoranda na Universidade de Buenos Aires (Argentina).
Revista Consultor Jurídico
Precisamos de uma profunda reforma na cultura policial
14 de Junho de 2016, 7:37OPINIÃO
“De repente, outro policial que corria em sentido contrário ao nosso aproximou-se e, bem em frente à câmera, desferiu um soco sobre o ferimento do rapaz.
- Socorro, tio, eu estou ferido – grita o rapaz virando-se para a câmera. É um menor que aparenta 15 anos, negro, franzino. Usa bermuda sem camisa. O ferimento na barriga, descobrimos depois, é consequência de um tiro que havia levado dias antes em uma briga na mesma favela. Tentamos exigir uma explicaçãoo pela violência contra um rapaz ferido e algemado, mas não conseguimos nos aproximar dos agressores, que foram cercados pelos colegas.” Relato de Caco Barcellos em 20 de novembro de 1986. [1]
Algum tempo atrás, quando passei quase um ano estudando o sistema penal na Holanda, escrevi para a ConJur minhas impressões quanto as diferenças entre o sistema carcerário europeu e o brasileiro. Longe de qualquer demagogismo quanto às razões das prisões holandesas serem tão melhores do que as brasileiras, meu principal questionamento, título daquele artigo, estava em perguntar até quanto continuaríamos tratando nossos presos com raiva e vingança[2].
Depois de visitar o Pieter Baan Center, uma prisão holandesa, fui direto para a biblioteca da faculdade. Pus em linhas imediatamente todas as minhas impressões quanto ao sistema carcerário brasileiro frente ao tratamento holandês. Me frustrara lendo que nossos manicômios judiciários eram “casas dos mortos” e que a fundação casa, a par de não ter grades, ainda mantinha vícios da época Febem. Tudo o que eu podia fazer, como hoje, era dizer sobre minhas impressões das diferenças entre os tratamentos penais na Europa, que tanto glorificamos, e nas terras tupiniquins. É o mesmo que farei agora, mas quanto a policia.
Em primeiro lugar, não se engane, caro leitor, o poder de polícia causa efeitos colaterais devastadores mundo afora. Mas imagine que está na Holanda e ouça, por todos os jornais e noticiários televisivos que um garoto de dez anos foi assassinado pela polícia, dentro de um carro, depois de supostamente ter efetuado três disparos contra a patrulha que, em reação, revidou contra o carro já batido.
Eu, nos laços que fiz com aquele país, aprendendo um pouco sua cultura, posso afirmar que o governador do Estado em questão — vivi no mais próspero e historicamente rico, a semelhança de São Paulo — seria imediatamente deposto, o chefe de polícia renunciaria ao cargo, o Rei Alexander, chefe de Estado, certamente viria a público para pedir escusas por um erro injustificável. Nada poderia servir de justificativa para ceifar a vida de uma criança de dez anos.
Situação bem diferente da vivida no estado de São Paulo.
Quem já disparou um revólver 38 pode testemunhar que a arma não é das mais fáceis. Como então um menino de dez anos teria puxado o gatilho três vezes, tomando o cuidado de subir o vidro depois dos dois primeiros disparos e abaixá-lo para o último, tudo enquanto dirigia? A falta de silogismo beira o desrespeito com a inteligência humana.
Em 30 anos não aprendemos nada. Continuamos tratando nossos delinquentes com raiva e vingança. Mesmo com os notáveis esforços de parte da sociedade civil organizada, o direito de defesa continua sofrendo derrotas diárias.
No último ano uma em cada quatro pessoas assassinadas na cidade de São Paulo foi morta pela polícia, com uma bala que você, caro leitor, contribuiu para pagar.[3] Em janeiro e fevereiro deste ano a policia militar matou duas pessoas por dia no estado.[4]
Se quisermos um país sério, com verdadeiro combate ao crime e respeito a democracia precisamos de uma profunda reforma na cultura policial, a começar pelo direito de defesa do cidadão. É apenas com de respeito a esse direito básico que se poderá mudar esses números. A primeira lição ao policial deveria ser esta: a defesa da sociedade passa antes — e principalmente — pela defesa do direito de defesa do cidadão, este é o único caminho para a garantia da democracia.
1 P. 347. Relato de Caco Barcellos de 20 de novembro de 1986. BARCELLOS, Caco, Rota 66 – 14a edição. Rio de Janeiro: Record, 2012.
2 “Tratamos nossos presos e doentes mentais com raiva e vingança” Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-mai-16/gustavo-pedrina-tratamos-nossos-presos-doentes-mentais-raiva-vinganca
Gustavo Mascarenhas Lacerda Pedrina é autor de AP 470: análise da intervenção da mídia no julgamento do mensalão a partir de entrevistas com a defesa, Entre 2013 e 2014 foi pesquisador do Programa de Direito Penal da Utrecht University, na Holanda sob orientação do Professor Titular J.A.E. Vervaele.
Revista Consultor Jurídico
Prisão provisória é usada de forma excessiva no Brasil, aponta estudo do IDDD
14 de Junho de 2016, 7:35LIBERDADE EM FOCO
As prisões provisórias são usadas de forma excessiva, chegam a durar até três meses e são majoritariamente destinadas a jovens, negros e pobres, que possuem baixa escolaridade e empregos precários. É que mostra o estudo Liberdade em Foco, produzido pelo Instituto de Defesa de Direito de Defesa. O Brasil tem atualmente cerca de 250 mil pessoas presas provisoriamente.
ShutterstockParceiro institucional do Conselho Nacional de Justiça no monitoramento das audiências de custódia, o IDDD buscou entender o perfil das prisões provisórias e avaliar os abusos na sua utilização, definindo os contrastes dessa situação diante de medidas cautelares que foram introduzidas com Lei 12.403, de 2011, a fim de reverter esse contexto.
“Os dados apontam para a concretização de uma política criminal que, na contramão da eficácia, faz incrementar a criminalidade, ao passo que abarrota unidades prisionais com nenhuma estrutura que garanta o mínimo existencial. Fossem utilizadas as medidas cautelares alternativas à prisão, desde há quase cinco anos existentes, talvez o cenário fosse um pouco diferente”, diz o estudo.
A pesquisa registrou que 94,8% das prisões em flagrante foram convertidas em provisórias, e apenas 26,6% pessoas tiveram a liberdade provisória concedida em algum momento do processo. Atualmente, dados do Tribunal de Justiça de São Paulo apontam que a conversão de flagrantes em prisões provisórias caiu para a faixa de 53%.
O estudo foi produzido com base em dados de um mutirão feito na capital paulista no primeiro semestre do ano passado e na mesma época da chegada das audiências de custódia a São Paulo. A redução de prisões provisórias desnecessárias é justamente um dos objetivos das audiências de custódia, que garantem a apresentação e o contato do preso em flagrante com um juiz.
O coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Medidas Socioeducativas do CNJ, juiz Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, destacou a importância de se repensar o uso das prisões provisórias no país.
“Na medida em que não percebemos as consequências de nossas próprias decisões, nós, juízes, nos afastamos da proximidade com as causas dos problemas que a sociedade experimenta e nos distanciamos dos caminhos para enfrentar essas causas. Precisamos atuar de forma a garantir ao cidadão as promessas que nossa Constituição Federal lhes prometeu, notadamente a efetividade dos direitos e das garantias como pressuposto da dignidade que nunca há de lhes faltar em qualquer instância”, afirmou.
Revista Consultor Jurídico
Ódio e armas: combinação letal nos EUA
14 de Junho de 2016, 7:29O atentado em Orlando coloca o foco no frouxo controle do acesso às armas. Poucos países oferecem tantas armas, mais de 300 milhões, e de tão fácil acesso. O comentário é de Marc Bassets em artigo publicado por El País, 12-06-2016.
Eis o artigo.
A matança homofóbica de Orlando, na madrugada de domingo, foi imediatament e descrito como o pior ataque terrorista em solo norte-americano desde 11 de setembro de 2001 e o pior ataque com armas da história dos EUA. Nas próximas horas, o debate vai se desenrolar entre esses dois argumentos. Um deles, a tenaz realidade de que os EUAsão o país do mundo com mais armas de fogo per capita e também o país desenvolvido com mais violência armada. E dois, a possibilidade de que aqui residam cidadãos norte-americanos simpatizantes do terrorismo jihadista dispostos a perpetrar atentados mais ou menos inspirados pelo Estado islâmico ou ISIS (na sigla em inglês).
Nada sabemos, no momento da redação destas linhas, sobre a origem da arma do crime e a filiação exata do criminoso. É hora de cautela. O medo é a confluência, perfeita e letal, dos dois fenômenos citados. Poucos países oferecem tantas armas, mais de 300 milhões, e de tão fácil acesso – consagrado na Constituição, de acordo com a interpretação vigente – como os Estados Unidos.
Os EUA, além disso, estão em guerra contra o ISIS e são um dos inimigos históricos do jihadismo. Nos últimos meses, as derrotas em seus feudos da Síria e do Iraque levaram o ISIS a tentar expandir a guerra aos países ocidentais. Depois dos atentados de 2001, em que cerca de 3.000 norte-americanos foram mortos, a entrada de estrangeiros nos EUA se tornou muito mais difícil.
Um ataque como o das Torres Gêmeas e do Pentágono, com uma multidão de terroristas infiltrados e com uma logística que exigiu anos de elaborada preparação, dificilmente se repetirá. Os cenários apocalípticos de ataques com armas biológicas ou pequenos artefatos nucleares tampouco se cumpriram. Foi dito que o próximo ataque será feito por alguém que já viva legalmente nos EUA e com uma tecnologia mais rudimentar como um rifle ou uma pistola.
A matança de Orlando acontece num momento de máxima tensão na política norte-americana. O direito de portar armas foi motivo de debate na campanha para as eleições presidenciais de 8 de novembro: é habitual. A novidade é a presença na campanha de um candidato à Casa Branca que agitou, com sucesso, a hipótese de um atentado jihadista. O republicano Donald Trump, rival da democrata Hillary Clinton, sugeriu inscrever os muçulmanos num cadastro e vetar a entrada nos EUA de fiéis dessa religião. Orlando colocará à prova o prestígio daqueles que aspiram dirigir o país mais poderoso do planeta nos próximos quatro anos.
Nota de esclarecimento sobre a detenção do Newton Ishi, o Japonês da Federal
9 de Junho de 2016, 6:51A Federação Nacional dos Policiais Federais – Fenapef, vem manifestar seu total apoio ao Agente Federal Newton Ishii, conhecido como “Japonês da Federal”, que está na Superintendência Regional da Polícia Federal em Curitiba, para cumprimento de pena imposta nos autos do processo judicial relativo à Operação Sucuri, ocorrida em Foz do Iguaçu em 2001.
Famoso por sua atuação nas prisões de políticos e grandes empresários nas investigações da Operação Lava Jato, Newton se apresentou ontem por volta das 11 horas da manhã aos policiais federais, logo que soube que seu recurso fora negado no Superior Tribunal de Justiça.
A detenção do agente Newton Ishii surpreendeu a todos, pois o primeiro processo contra ele fora anulado integralmente para posteriormente ser refeito. Há ainda recursos pedindo anulação de todo o processo. Outros agentes federais envolvidos na Operação Sucuri já tiveram seus processos anulados e alguns foram absolvidos por falta de provas.
O setor jurídico do Sindicato dos Policiais Federais do Paraná está acompanhando de perto o caso para tomar todas as medidas necessárias no sentido de que Newton Ishii seja solto já na próxima semana.
A Fenapef está prestando todo apoio necessário ao agente Newton, que tem sido um ícone do combate à corrupção e ao crime organizado. “Estamos lutando para que se faça justiça ao Newton e sua família, posto que ele já vem sendo punido injustamente há muitos anos, mesmo após árdua luta para provar sua inocência”, afirma o presidente da Fenapef, Luís Boudens.
Os fatos não guardam nenhuma relação com a Operação Lava Jato, que vem sendo um marco no combate à corrupção no Brasil, prestígio do qual o Newton Ishii ajudou a construir.
Agência Fenapef
Após a leitura concluirá porque o ciclo completo é incompatível com uma polícia militarizada
6 de Junho de 2016, 19:25Entenda o Ciclo Completo de Polícia
Somente se entende o que é o ciclo completo de polícia se forem entendidas as funções de polícia, que nada mais são do que a classificação das atividades policiais pelo momento de atuação da polícia: se antes do crime, pelas atividades de prevenção (função de polícia administrativa) ou depois do crime, pelas atividades de repressão (função de polícia investigativa).
FUNÇÃO DE POLÍCIA ATIVIDADE ATUAÇÃO
Polícia Administrativa – Prevenção ao crime – Antes do crime acontecer
Polícia Investigativa – Repressão ao crime – Depois do crime acontecer
No Brasil, um órgão de polícia faz a atividade de prevenção ao crime e outro, a de investigação do crime. Como exemplo, nos Estados, a Constituição Federal atribuiu à Polícia Militar a atividade de prevenção e à Polícia Civil a atividade de repressão. Esse modelo bipartido não funciona a contento, como vemos no caso prático:
Um cidadão, vendo que há, na sua rua, uma movimentação suspeita de pessoas que demonstram estar se preparando para cometer um crime, liga para o serviço 190. Quando a viatura policial ostensiva chega ao local, os suspeitos não estão mais lá, tendo o cidadão informado que, ao verem a aproximação da viatura da PM, os suspeitos se evadiram. Assim, o cidadão pede para que a PM fique no local, porque os suspeitos devem voltar. Os Policiais Militares informam que não podem permanecer no local para fazer a investigação, porque seu trabalho é ostensivo e atendem todo o bairro. Então, saem e voltam para o seu posto.
O cidadão então procura a Polícia Civil, que é quem deve investigar o crime e a informa a sobre a presença de suspeitos na sua rua. Na delegacia da polícia civil é informado que o caso é de atribuição da Polícia Militar, que faz a prevenção, pois a polícia civil somente atua na investigação dos crimes que já ocorreram. IMPASSE – a polícia preventiva (Polícia Militar) não tem como investigar e a polícia repressiva (Polícia Civil) só investiga depois que o crime já aconteceu. O cidadão, então, fica abandonado pela falta da atuação policial e, de fato, não se consegue evitar que o crime venha a acontecer.
Sabemos que a Polícia Militar, mesmo sem ter a atribuição legal de investigação, internamente, se estruturou para atuar nessa área, pelas conhecidas P2. Por sua vez, a Polícia Civil, mesmo sem ter atribuição legal de prevenção, internamente, também estruturou sua área de inteligência para prevenir crimes, além de realizar várias outras atividades preventivas, como o patrulhamento com viaturas, realização de barreiras e utilização de aeronaves. Ou seja, para conseguirem fazer bem o trabalho que lhes compete, a Polícia Militar e a Polícia Civil entram na competência uma da outra. Mas, mesmo assim, isso só ocorre em situações específicas, não como regra geral de atuação em ambos os órgãos. Por isso, cria-se um vazio que só faz crescer a criminalidade, pois no atual modelo bipartido, a atuação policial falha tanto na prevenção quanto na investigação do crime.
A doutrina explica que na realização do crime há um itinerário, chamado “iter criminis”, ou caminho do crime, que é composto de uma fase interna do indivíduo denominada cogitação, e de uma fase externa que compreende os atos preparatórios, os atos de execução e a consumação.
Vê-se que no atual modelo bipartido de investigação de crimes não se consegue combater os atos preparatórios, evitando que venham a se tornar atos de execução e consumação do crime. Eis a falha do modelo atual, em que cada órgão (PM e PC) atua numa fase do crime, ou seja, um atua na prevenção do crime e outro na investigação do crime e não conseguem acompanhar e combater com integralidade todo o evento criminoso.
Por isso, a importância do ciclo completo de polícia, para que as atividades de prevenção e repressão sejam desenvolvidas pelo mesmo órgão policial, pois, se o crime é uno, a polícia tem que ter atuação completa para preveni-lo e investigá-lo.
A Polícia Federal e o ciclo completo
A Constituição Federal no art. 144, §1º, ao tratar das atribuições da Polícia Federal, distingue em seus incisos as funções de polícia investigativa (inciso I), polícia administrativa (incisos II e III) e polícia judiciária (inciso IV). Vê-se especificamente nos incisos I e IV abaixo, a nítida separação entre a função de investigação (apuração de infrações penais) e a função de polícia judiciária da União:
Art.144, § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
I – apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União (FUNÇÃO DE POLÍCIA INVESTIGATIVA)
II – prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho – (prevenção – FUNÇÃO DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA e FUNÇÃO DE POLÍCIA INVESTIGATIVA)
III – exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras (FUNÇÃO DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA)
IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União (FUNÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA).
(texto entre parênteses nossos)
Também, ao tratar das atribuições da Polícia Civil, no §4º do mesmo artigo 144, a Constituição Federal faz a distinção entre as funções de polícia judiciária e de apuração de infrações penais (polícia investigativa): “§4º. Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”. Note-se que o Constituinte atribuiu às polícias civis estaduais as funções de POLÍCIA JUDICIÁRIA e de POLÍCIA INVESTIGATIVA, mas não a de polícia administrativa.
Face ao que dispõe o art.144 da Constituição Federal, a mais moderna doutrina divide as funções de polícia em três:
– POLÍCIA ADMINISTRATIVA, prevenção à infração penal
– POLÍCIA INVESTIGATIVA, repressão à infração penal
– POLÍCIA JUDICIÁRIA, auxiliar do Poder Judiciário (cumprimento demandados de prisão, busca e apreensão, condução de presos, etc).
A Polícia Federal é o único órgão policial a quem a Constituição atribuiu as funções de polícia administrativa e polícia investigativa, conjuntamente, ao que a doutrina conceitua como “polícia de ciclo completo”. Como exemplo, quando a Polícia Federal realiza a atividade de emissão de passaportes (função de polícia administrativa) e verifica que foram apresentados documentos falsos, passa também a investigar o crime de falsificação de documento (polícia investigativa), não precisando encaminhar o caso para que seja investigado por outro órgão policial.
Mas, embora a Polícia Federal seja um órgão de ciclo completo, os policiais não atuam em ciclo completo, pois lhes falta uma carreira única. Atualmente, na Polícia Federal, os cargos policiais (Agentes, Escrivães e Papiloscopistas) que efetivamente atuam nas investigações e detêm a expertise policial, são impedidos de exercerem chefias, as quais são reservadas a outro cargo, o de delegado federal, cujos ocupantes entram no órgão por concurso distinto e vêm a ser chefes dos demais policiais. Muitas vezes, esses profissionais passam a ocupar o cargo de delegado sem experiência policial anterior, pois a lei lhes exige três anos de experiência policial “ou” jurídica. Polícias pela metade não funcionam, assim como policiais pela metade não conseguem ter a expertise policial necessária para uma atuação eficiente; e isso é uma anomalia que precisa ser corrigida pela implantação da carreira única na Polícia Federal.
A carreira única está definida no §1º do art.144 (A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a…). A Carreira Policial Federal foi criada pelo Decreto-lei nº 2.251/1985 e hoje está disciplinada na Lei nº 9.266/96 que disciplina a natureza de nível superior de todos os cargos (Agente, Escrivão, Papiloscopista, Delegado e Perito): “Art. 2º A Carreira Policial Federal é composta por cargos de nível superior, cujo ingresso ocorrerá sempre na terceira classe, mediante concurso público, de provas ou de provas e títulos, exigido o curso superior completo, em nível de graduação, observados os requisitos fixados na legislação pertinente”.
Porém, a Carreira Policial Federal nunca foi regulamentada e precisa ser efetivada com base em dois pilares: entrada única e promoção. Esses dois pilares são elementos que dão origem à formação de carreira e sua implementação não visa extinguir ou rebaixar nenhum outro cargo, pois se efetiva a partir da adequação da disposição atual dos cargos existentes para o novo desenho da carreira. Isso se dará por um processo de transição na organização dos atuais cargos numa mesma carreira, de forma que os novos ocupantes que sejam selecionados por concurso e passem a integrar a carreira pela entrada única, no cargo inicial. Com os cargos estruturados na Carreira Policial Federal, a progressão funcional será embasada na capacitação e na experiência. Assim, os policiais serão promovidos (provimento de cargo público pela promoção, art. 8º, II, Lei nº 8.112/90) e podem chegar ao exercício de chefia por critérios de experiência e mérito.
A estrutura dos órgãos policiais em carreira única é modelo que funciona nas polícias federais de vários países do primeiro mundo, como o FBI e, por isso, o Constituinte previu esse modelo para a Polícia Federal brasileira, mas que ainda precisa ser efetivado na prática, visando alcançar a eficiência na segurança pública e na investigação criminal.
É mais que natural e até lógico a Federação Nacional dos Policiais Federais defender o Ciclo Completo de Polícia e a porta única de entrada, com carreira única, na Polícia Federal e em todos os órgãos policiais, por trazer de volta a preocupação com o ser humano policial, por promover uma carreira justa e com meritocracia, além de contribuir para firmar a promoção da eficiência, eficácia e da efetividade para a segurança pública no Brasil.
Créditos aos Policiais Federais, componentes do Grupo de Trabalho sobre Carreira da FENAPEF:
Adelson Cabral (RS)
Antônio Moreira (SC)
Magne Cristine (PE)
Márcio Ponciano (DF)
Fonte: Agência Fenapef