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Política, Cidadania e Dignidade

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3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.

A POLÍTICA DO TOMA LÁ, DÁ CÁ! ASSIM CAMINHA O GOVERNO TEMER E O DEPUTADO QUE UM DIA SONHAMOS NOS REPRESENTARIA.

6 de Junho de 2016, 18:39, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

GOVERNO TEMER



Filho de Cabo Júlio vai assumir a Secretaria Nacional de Juventude


Bruno Júlio será secretário nacional de Politicas para a Juventude do governo interino

Cabo Júlio e seu filho, Bruno, que é Presidente Nacional da Juventude do PMDB
Cabo Júlio e seu filho, Bruno, que é Presidente Nacional da Juventude do PMDB














COLUNA A.PARTE
A assessoria de imprensa de Cabo Júlio (PMDB) informou neste domingo (5) que o filho do deputado, Bruno Moreira Santos, o Bruno Júlio, deixou o cargo de diretor de Planejamento Metropolitano, Articulação e Intersetorialidade na Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de BH por iniciativa própria.
O destino de Bruno Júlio, segundo a assessoria, será a Secretaria Nacional de Juventude, onde deverá assumir como titular a convite do presidente interino Michel Temer.
Segundo apurou a coluna A.PARTE, Bruno Júlio havia perdido o posto em Minas depois de o pai dele ter votado a favor do requerimento que pedia cópia da delação de Benedito de Oliveira Neto, o Bené, na operação Acrônimo, que investiga o governador.


fONTE: http://www.otempo.com.br/capa/pol%C3%ADtica/filho-de-cabo-j%C3%BAlio-vai-assumir-a-secretaria-nacional-de-juventude-1.1314431



Janot pede ao Supremo prosseguimento de investigações contra Aécio

6 de Junho de 2016, 7:33, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE




Para a Procuradoria-Geral da República, a conveniência de se dar prosseguimento ou não na investigação de autoridade com prerrogativa de foro no Supremo Tribunal Federal, depois de formalmente instaurado o inquérito com autorização da própria corte, é ato privativo do procurador-geral da República. Ao Judiciário, cabe o controle da legalidade dos atos de coleta de elementos de prova, mas sem interferência na formação da opinião sobre a ocorrência de eventual delito.
PGR pede prosseguimento de investigação contra Aécio Neves por eventuais crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Com esse entendimento, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou nesta terça-feira (31/5) ao STF manifestaçãopedindo prosseguimento das investigações contra o senador Aécio Neves pelos eventuais crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro relacionados ao caso de Furnas, subsidiária da Eletrobras.  O ministro Gilmar Mendes é relator do caso
Janot alega que juntou ao pedido diversas provas novas, que não se limitam ao depoimento do colaborador Delcídio do Amaral, ex-senador que teve mandato cassado.  Para o PGR, diante dos “novos e objetivos” elementos, o caso merece nova e mais aprofundada avaliação.
Depois de formalmente instaurado inquérito para a apuração dos fatos e da manifestação "espontânea" do investigado, diz a PGR, o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, suspendeu o cumprimento das diligências determinadas e determinou o retorno dos autos à Procuradoria-Geral da República. Na ocasião, o ministro afirmou que as informações prestadas pelo senador "podem demonstrar" que o inquérito foi aberto sem novas provas que o justifiquem.
Janot alega a total inaplicabilidade da Súmula 524 do STF ao caso. Segundo o enunciado da súmula, arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de Justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas. Para Janot, além de se estar no âmbito, ainda, de investigações, e não de formalização de denúncia, o MP, diferente do que diz a defesa de Aécio, trouxe aos autos novas provas.
Para Janot, a suspensão do cumprimento das diligências já autorizadas equivale à suspensão do curso das investigações, afetando os trabalhos do órgão acusador, em “incontornável” violação ao princípio acusatório consagrado pela Constituição.
"Ao assim agir, o Poder Judiciário estará despindo-se de sua necessária imparcialidade e usurpando uma atribuição própria do Ministério Público, sujeito processual a quem toca promover a ação penal e, antes disso, munir-se do substrato probatório que o autorize a exercer, responsavelmente, seumunus", diz Janot.
Clique aqui para ler a manifestação.
INQ 4.244
Marcelo Galli é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico



Podemos continuar dizendo que cremos na Declaração dos Direitos Humanos? Ou vamos trair a nossa identidade?

6 de Junho de 2016, 7:25, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Entrevista especial com Adela Cortina

“O que seria importante em nossa sociedade neste momento é a capacidade de respeitar as opções e posições dos outros, embora não se compartilhe delas, porque estamos em sociedades bastante intolerantes, não estamos aceitando que o outro pense de maneira diferente, o que gera conflitos e isso é mal para construirmos algo juntos", afirma a filósofa espanhola.
Foto: http://www.ilusaodeetica.com.br/
Apesar de a tese maquiavélica ter defendido a suspensão da ética em matéria de política, quando a política não é ética, ela “é ruim não como ética, mas como política; é má política. É importante que se diga isso porque, do contrário, se dá a sensação de que os políticos podem ser éticos ou não, que os empresários podem ser éticos ou não, e que isso depende de cada um deles; mas não”, diz Adela Cortina à IHU On-Line, quando esteve em Porto Alegre, RS, a convite do Grupo de Filosofia, Economia e Direito da UFRGS.
Defensora da ética do discurso, que tem raízes em ApelHabermas, a filósofa espanhola propõe uma ética da razão cordial, fundamentada em clássicos da tradição filosófica, como Aristóteles e Kant, e uma ampliação da ética neocontratualista de John Rawls, ao incluir a dimensão da aliança, “o que significa dizer que entre os seres humanos há um vínculo que não contraímos voluntariamente, mas que nos une desde o momento que somos cada um como pessoa porque reconhecemos os outros como pessoas”.
Fundamentada nesses autores, Adela Cortina é categórica ao defender que todas as atividades humanas devem ser éticas e ao afirmar que “quando alguém ingressa na política, tem de saber que está atuando numa atividade que tem uma finalidade, a saber, o bem comum, e não pode desvincular-se dessa meta, porque fará uma péssima política”. Oscasos de corrupção que vemos no Brasil, na Espanha e em diversos países do mundo, frisa, “estão relacionados a pessoas que estão buscando seu bem particular e estão fazendo péssima política, e isso tem de mudar”.
Na entrevista a seguir, concedida pessoalmente à IHU On-Line no PPG de Economia da UFRGS, na última sexta-feira (27-05-2016), Adela também reflete sobre a situação dos imigrantes e refugiados que estão migrando para a Europa e adverte que esta não é uma questão a ser enfrentada apenas pela União Europeia, mas trata-se de “um problema global”, porque diz respeito à situação de outros seres humanos. 
Além disso, alerta, “essa questão vai aumentar no futuro e não é possível que cada país feche as portas porque, do contrário, não podemos seguir dizendo que cremos que todos os homens têm direito à vida, como diz a Declaração dos Direitos Humanos”. E dispara: “Creio que o mais grave que tem acontecido na União Europeia é uma crise de identidade, porque nós não nos identificamos com o direito à vida, com o direito à livre circulação, com o direito de ter uma casa e um trabalho. Todos esses direitos fazem parte da nossa identidade, e o fato de estarmos fechando as portas para os imigrantes e refugiados, como está ocorrendo, significa que estamos traindo nossa própria identidade. Isso me parece bastante triste e já estamos lamentando muito”.
Adela Cortina também comenta o multiculturalismo, que está no centro de sua ética da razão cordial e defende que “temos de fazer multicultural a vida cotidiana, que as grandes soluções não vêm dos líderes, mas têm de vir da base, do povo, das pessoas que são de diferentes religiões e estão juntas nas escolas, nas universidades, vão juntas a festas. A sociedade civil é muito importante e sem ela não entraremos em diálogo”.
Adela Cortina é catedrática de Ética e Filosofia Política na Universidade de Valência, Espanha, onde coordena o curso de pós-graduação em Ética e Democracia. É doutora em Filosofia e foi professora visitante na Universidad de Louvain-la-Neuve, na Bélgica, na Vrije Universitet, em Amsterdam, na Universidade de Notre Dame, nos EUA, e na Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Atualmente é diretora da Fundação para a Ética dos Negócios e das Organizações – ÉTNOR.
Entre seus livros, destacam-se Razón comunicativa y responsabilidad solidaria (Sígueme, 1985), Ética aplicada y democracia radical (Tecnos, 1993), Alianza y Contrato (Trotta, 2001), Razón pública y éticas aplicadas (Coed., Tecnos, 2003), Ética de la Razón cordial. Educar en la Ciudadanía en el Siglo XXI (Nobel, 2007), Pobreza y Libertad. Erradicar la pobreza desde el enfoque de Amartya Sen (Editores Adela Cortina y Gustavo Pereira, Tecnos, 2009),Neuroética y neuropolítica. Las bases cerebrales de la educación moral (Tecnos, 2011) e ¿Para qué sirve realmente la ética? (Paidós, 2013).
Adela Cortina esteve no Instituto Humanitas Unisinos - IHU em 2001. A edição nº 43 da IHU On-Line, reproduz uma entrevista que ela concedeu à época. O material está disponível aqui.
Confira a entrevista.
 
Foto: Angels Varea
IHU On-Line - A palavra ética está no debate do dia, do futebol à economia e à política. Como vê a discussão sobre ética e o uso do termo nos dias atuais? As pessoas têm consciência do que a ética significa?
Adela Cortina – A palavra ética, como sabemos, procede do grego ethos, que quer dizer caráter e morada do homem, ou seja, onde se mora. Entendo que a ética é esse tipo de saber que nos ajuda a formar um caráter. Caráter quer dizer um conjunto de predisposições que nos levam a atuar melhor, e a essas chamamos de virtudes, ou nos levam a agir mal, e a essas chamamos de vícios.
A ética continua se ocupando dessa formação do caráter para nos ensinar a agir bem e evitar agir mal, como se dizia no mundo clássico. E nesse sentido penso que alcançar esse bem está relacionado com dois valores: a justiça e a felicidade. Se perguntarem do que trata a ética, diria que trata de muitas coisas, e uma delas muito importante é fazer a humanidade mais justa e mais feliz.
Quando se pergunta às pessoas o que entendem por ética, meus alunos, por exemplo, não sabem dizer o que é a ética ou em que ela consiste. Justamente por isso me parece que é muito importante em todos os cursos universitários haver uma matéria sobre ética, para que os profissionais saibam em que consiste a ética da sua profissão, de tal modo que um médico saiba o que é ser ético, como um economista também. Além disso, é importante que a ética seja uma disciplina ministrada nas escolas, porque é muito importante para um país que as pessoas sejam éticas e se defina que tipos de valores todos podem compartilhar, porque não há forma de construirmos juntos um país sem compartilharmos alguns valores.
Por isso, é importante, desde a infância, ensinar ética, o que não significa doutrinar, mas falar em voz alta quais são os valores que nos parecem mais fecundos para nossa vida: se preferimos a liberdade à escravidão, se preferimos a solidariedade ou não, e tudo isso tem de ser ensinado na infância, para que depois, quando se pergunta o que a pessoa entende por ética, se possa contestar e discutir.
IHU On-Line - A senhora já declarou, como o fez Amartya Sen [1], que a economia deveria ter como meta contribuir para formar boas sociedades. Que tipo de sociedade a economia está formando hoje? Que contribuições a ética pode oferecer para pensarmos um tipo de economia que ajude as sociedades a serem melhores? 
Adela Cortina – É uma pergunta ampla e importante, porque a economia de um país é feita por distintos protagonistas, como os bancos, e é importante que eles assumam sua responsabilidade social, ou seja, eles deveriam trabalhar para o que têm de fazer, isto é, conservar as poupanças das pessoas e mantê-las com certo interesse. A economia também é feita pelas empresas e hoje há muitos discursos sobre a responsabilidade social das empresas.
Considerando todos os atores envolvidos, penso que os políticos têm que colocar as bases da justiça para que a economia possa funcionar bem e, portanto, não podem ser corruptos, porque a corrupção sempre ocorre entre políticos e empresários. Os cidadãos, por sua vez, têm de ser consumidores responsáveis que se deem conta de qual é a trajetória de um produto, como é produzido, a fim de ajudar as empresas a trabalharem bem. Creio que necessitamos dos esforços de todos esses protagonistas para termos uma economia que funcione bem.

"A ética é esse tipo de saber que nos ajuda a formar um caráter"

 

IHU On-Line – O bom funcionamento da economia, no sentido de garantir sociedades melhores, depende da intervenção do Estado ou não e como?
Adela Cortina – Há um modelo, o qual mais gosto, que é o daeconomia social de mercado, que se supõe que deveríamos estar aplicando na União Europeia e em outros países, o qual pressupõe que o mercado é um bom mecanismo para assegurar recursos, a oferta e a demanda, mas ele não pode estar sozinho; precisa estar dentro de um marco de intervenção estatal, e o Estado tem de tornar possível que não haja excluídos e que sejam defendidos os direitos políticos, econômicos, sociais e culturais de todos. Nesse sentido o Estado tem de intervir e tem de ajudar na redistribuição da riqueza através de um sistema de impostos, redistribuindo bens. Tem de haver um marco estatal que impossibilite que alguém fique sem ter seus direitos protegidos e para que os bancos sejam analisados e auditados. É necessária a intervenção estatal e isso é a social-democracia e, segundo meu juízo, isso é o melhor que inventamos economicamente.
IHU On-Line - Existe uma crítica sobre a relação entre ética e política, sustentada por uma raiz maquiavélica, de que a política tem práticas e jogos que são alheios à ética, ou seja, que não dizem respeito à ética e que, portanto, ambas devem estar separadas. Como propor uma relação entre ética e política diante da evidência de tantos casos de corrupção envolvendo políticos? Essas duas dimensões devem estar relacionadas para diminuir os problemas políticos?
Adela Cortina – Não há nenhuma atividade humana que não tenha de ser ética. Todas as atividades humanas, como dizia Aristóteles, tendem a um fim, a uma meta, e como cada atividade tem uma finalidade, a ética tem a finalidade de conseguir essa meta da maneira mais justa e razoável possível. A atividade política é uma atividade humana e, portanto, tem como meta conseguir o bem comum, e os políticos têm de trabalhar para conseguir esse bem comum e não o bem particular, o bem do seu partido ou o bem da sua família. Agir segundo interesses particulares é ir contra a política e isso não só não é ético, como não é político também, porque a política tem uma finalidade e tem de cumpri-la.
Não gosto desse costume de distinguir entre ética e política, ética e economia, porque a ética está em cada uma das atividades, e quando essa atividade se faz segundo a finalidade pela qual existe, é ética. Como dizia muito bem José Ortega y Gasset [2]: “Me incomoda muito quando se entende a palavra moral como se fosse colocado algo mais”. Não é algo mais, é a atividade, como diz Ortega, quando está em sua plena eficácia vital.
Quando uma atividade é boa? Quando está se tentando criar o futuro, ajudar os que temos de ajudar. Por isso, quando uma política não é ética, é ruim não como ética, mas como política; é má política. É importante que se diga isso porque, do contrário, se dá a sensação de que os políticos podem ser éticos ou não, que os empresários podem ser éticos ou não, e que isso depende de cada um deles; mas não. Quando alguém ingressa na política, tem de saber que está atuando numa atividade que tem uma finalidade, a saber, o bem comum, e não pode desvincular-se dessa meta, porque fará uma péssima política. Os casos de corrupção que vemos no Brasil, na Espanha, estão relacionados a pessoas que estão buscando seu bem particular e estão fazendo péssima política, e isso tem de mudar.
IHU On-Line - A senhora fala da importância de as instituições estarem “altos de moral”. O que entende por essa expressão?
Adela Cortina – “Altos de moral” e desmoralizados é uma expressão de Ortega, que diz que não lhe parece bom fazer a distinção entre moral e imoral, como distinguindo o mundo entre bons e ruins, mas é preferível a distinção e o uso das expressões estar “altos de moral” ou estar desmoralizados. Estar desmoralizado é estar abaixo da moral e nesta situação não se tem vontade de fazer nada. Veja o caso dos imigrantes e dos refugiados: fechamos as portas a eles porque não temos vontade de nada. Quem está desmoralizado não é criativo, não é generoso, é alguém “fechado”. Quem está “alto de moral” são as pessoas, as instituições que têm gana de enfrentar as situações com altura humana. No caso dos refugiados, aqueles que estão “altos de moral” veem a situação deles e se dão conta de que este é também o seu problema e tratam de ver como se pode resolver isso. Neste caso se trata, portanto, de trabalhar com a Síria para que acabe a guerra da Síria, de acolher os imigrantes, porque a solidariedade é um dever.
IHU On-Line – Como está compreendendo a situação dos imigrantes na Europa a partir da sua vivência na Espanha? Qual é o problema central que divide os países acerca de como lidar com os imigrantes?
Adela Cortina – O problema central é que a União Europeia assinou uma carta de valores de direitos como uma chave da identidade europeia, e a crise dos refugiados e dos imigrantes tem posto em questão esses direitos e valores que havíamos reconhecido como nossas senhas de identidades. Creio que o mais grave que tem acontecido na União Europeia é uma crise de identidade, porque nós não nos identificamos com o direito à vida, com o direito à livre circulação, com o direito de ter uma casa e um trabalho. Todos esses direitos fazem parte da nossa identidade, e o fato de estarmos fechando as portas para os imigrantes e refugiados, como está ocorrendo, significa que estamos traindo nossa própria identidade. Isso me parece bastante triste e já estamos lamentando muito.
Quero dizer que não existe uma política comum na União Europeia; cada país resolve seus problemas por sua conta: na Áustria e na França, os populistas e os xenófobos estão ganhando terreno e esse é um problema de egoísmo social, de fechar portas, de não ter vontade de resolver os problemas que no fundo são problemas nossos porque são problemas humanos. Temos a obrigação de mudar essa situação, mas é difícil quando cada país pende para o seu lado.

"O problema central é que a União Europeia assinou uma carta de valores de direitos como uma chave da identidade europeia, e a crise dos refugiados e dos imigrantes tem posto em questão esses direitos e valores que havíamos reconhecido como nossas senhas de identidade"

IHU On-Line – A Europa tem condições de receber todos os refugiados? O que seria uma maneira de lidar com essa situação neste momento?
Adela Cortina – A Europa tem a condição de trabalhar, não só Europa, mas Europa com os EUA, o Brasil e quem quer que seja, porque tratar de resolver o conflito da Síria, que é muito mais forte hoje em dia, é uma obrigação de todas as forças diplomáticas. Mas, é claro, a dificuldade é que se a Rússia vai pelo seu lado, e a União Europeia pelo seu, então não há solução. Mas temos a obrigação de trabalhar diplomaticamente nesse sentido.
Com relação aos refugiados e imigrantes, talvez não seja possível socorrer a todos, mas a quantidade que estamos socorrendo é muito pequena. A Alemanha ajudou e acolheu a muitos – critica-se muito a Alemanha, mas não creio que se deva criticá-la, porque ela tem trabalhado muito bem. Além disso, Angela Merkel disse muito bem: “O que se passa é que há medo em todos os lugares, porque há muito mais gente e, então, se fecham as portas”. Mas creio que temos de enfrentar essas questões e dizer que, em primeiro lugar, não podemos permitir que as pessoas morram, porque a cada dia estão morrendo muitas pessoas na travessia para a Europa. Isso tem de ter uma solução, tem de se trabalhar nas fronteiras, com campos de acolhimento, e ver como é possível resolver os problemas das pessoas.
Creio que é preciso trabalhar duplamente: diplomaticamente para acabar com guerras como a da Síria, e organizar conjuntamente o acolhimento a pessoas que vêm de fora, porque se dissermos que é impossível fazer isso, muitas pessoas podem morrer. Mas, até agora, estamos fazendo pouco.
IHU On-Line – O que tem em mente quando se refere a tratar da situação da Síria? Como resolvê-la diplomaticamente? 
Adela Cortina – Quando eu falo dos refugiados, refiro-me especificamente aos refugiados políticos, que vêm de conflitos, e neste momento o conflito mais forte é o da Síria. Além disso, no futuro a União Europeia será um local com muito mais gente, porque afinal de contas parece que é o lugar onde se pode viver, não? É verdade, porque do contrário as pessoas iriam para outros locais. Agora temos de pensar nesses conflitos existentes e também no futuro.
Pelo que dizem, vai aumentar o problema da escassez de água, e com o aquecimento da Terra haverá países, como já existem, que não terão água, e essas pessoas também migrarão para nossos países, para o Brasil e outros locais, porque precisarão viver. Então, o tema das imigrações é um tema que teremos de resolver enquanto seres humanos, porque as pessoas que não podem viver num determinado local, mudam para outro, e o que não pode acontecer é deixá-las pelo caminho depois de termos proclamado a Declaração dos Direitos Humanos de 1948.
Então, não é um problema da União Europeia, mas um problema global, no qual temos de pensar. A imigração para oPanamá e para a América Latina aumentou bastante, porque as pessoas migram para aqueles locais que imaginam estarem melhores. Há imigrações desde que nasceram os seres humanos; do contrário não teríamos habitado toda a Terra. Portanto, trata-se de um problema que temos de enfrentar já, visto que essa questão vai aumentar no futuro e não é possível que cada país feche as portas porque, do contrário, não podemos seguir dizendo que cremos que todos os homens têm direito à vida, como diz a Declaração dos Direitos Humanos.
IHU On-Line – Como está analisando, de outro lado, a situação do terrorismo islâmico na Europa? Como os países europeus estão tratando da questão?
Adela Cortina – Creio que a reação nos distintos países europeus está sendo muito diferente. A reação francesa deMarine Le Pen [3] vai ganhando força, na Inglaterra também há problemas, na Áustria cada vez mais e na Hungria nem se fala. Na Alemanha, Angela Merkel também tem feito uma contestação e as alternativas propostas pela Alemanha estão tendo uma ascensão muito forte. Isto quer dizer que se trata de situações diferentes em cada país e, portanto, não é possível falar da União Europeia como um todo.
Na Espanha, tenho de dizer que por enquanto, graças a Deus, não há partidos xenófobos, não há partidos islamofóbicos. Os partidos espanhóis não têm defendido em seus programas o desalojamento dos imigrantes e isso é uma boa notícia. Nesse sentido não há populismos, e se está articulando bem a convivência entre as pessoas de tradição cristã e tradição mulçumana. Por isso, pediria também aos muçulmanos que atuem com reciprocidade, o que quer dizer que nos países em que há mulçumanos e também cristãos, que os muçulmanos não ataquem os cristãos, que os deixem viver, e que os deixem ter suas igrejas, como também há mesquitas no Ocidente.
Na Espanha há cada vez mais mesquitas, sinagogas e, portanto, eu pediria que lá [Oriente] também atuem de igual maneira, porque não se pode reclamar que aqui haja uma sociedade multicultural, respeitosa com as diversas culturas, o que para mim parece algo de sentido comum e, de outro lado, em seu próprio país se impeça que haja igrejas e, além disso, se martirizem pessoas. Penso que as pessoas mais poderosas do Islã deveriam fazer um chamamento a seus irmãos dizendo que não se pode fazer isso.

 

"Pediria também aos muçulmanos que atuem com reciprocidade, isto é, que nos países em que há mulçumanos e cristãos, que os muçulmanos não ataquem os cristãos"

IHU On-Line – A situação dos terroristas jihadistas na Europa é preocupante? 
Adela Cortina – Claro que é preocupante, por Deus! Há uma quantidade de jovens que são terroristas, que estão vivendo em nossos países e se convertendo ao terrorismo jihadista. Eles necessitam dar um sentido às suas vidas, e uma ideologia forte lhes dá sentido, porque eles não têm trabalho, e a adesão ao jihadismo é vista como uma forma de vida. Há muitas razões pelas quais justificam essa adesão, e isso é preocupante porque está crescendo o número de pessoas que aderem ao jihadismo. Muitas pessoas estão sendo investigadas e as investigações mostram que elas estão ligadas a alguma célula jihadista e que vão a outros países muçulmanos para serem treinadas e depois retornam para cometer atentados na Europa.
Claro que se trata de uma situação muito preocupante e acho que deve haver missões policiais, e que é preciso tentar que as pessoas tenham trabalho, porque se diz que eles não têm trabalho, mas na Espanha, por exemplo, temos uma situação de 24% de greve. Temos que lidar com o tema do terrorismo com muito cuidado e também faço um chamado à comunidade muçulmana para que vigiem sua gente.
IHU On-Line – Filosoficamente, como devemos tratar esta questão de terrorismo que envolve os jihadistas e sua adesão à morte e compreensão acerca da vida? Na época do nazismo muitos intelectuais disseram que o movimento de Hitler era algo passageiro, e hoje a história nos mostra que muitos intelectuais, inclusive, apoiaram aquele tipo de prática. Nesse sentido, como os intelectuais devem se posicionar? Que questões são mais urgentes para pensarmos e refletirmos sobre esse tema hoje? 
Adela Cortina – Penso que não é o mesmo que foi o nazismo, mas há uma preocupação com o aumento do terrorismo e dos jovens que se tornam terroristas e não sei se a nossa polícia está suficientemente preparada para investigar todos os casos. Mas há maneiras, junto com as medidas policiais – porque não há outro remédio nesses casos – de atuação que deveriam ser muito importantes por parte da sociedade civil.
Escrevi em alguma ocasião, e continuo pensando assim, que temos de fazer multicultural a vida cotidiana, que as grandes soluções não vêm dos líderes, mas têm de vir da base, do povo, das pessoas que são de diferentes religiões e estão juntas nas escolas, nas universidades, vão juntas a festas. A sociedade civil é muito importante e sem ela não entraremos em diálogo. Veremos que são muito mais as coisas que nos unem do que as que nos separam. Eu tenho tido experiências com muitos muçulmanos e temos tantas coisas em comum, que o que nos diferencia é o que diferencia qualquer pessoa. Temos de fazer com que a vida cotidiana seja a vida do diálogo, da partilha, e não se pode admitir, por exemplo, que as mulheres sejam tratadas de modo inferior aos homens por imposição.
IHU On-Line – Mas muitas vezes quando comparamos as mulheres do Ocidente com as do Oriente, somos acusados de não compreender o estilo de vida do Oriente. Como resolver esse impasse entre choques culturais? Como aproximar o ethos do Oriente com o do Ocidente?
Adela Cortina – O Islã entende que a mulher deve ter uma determinada posição em relação ao homem, mas eu penso que é de inferioridade. Pode-se dizer que não entendemos isso e, de fato, eu não entendo, porque acredito que temos chegado à conclusão de que homens e mulheres são iguais e, além disso, estamos demonstrando que é assim: há mulheres que podem exercer exatamente as mesmas funções que os homens, e homens que podem fazer o mesmo que as mulheres. E isso me parece uma excelente notícia.
Como fazer para que isso seja compartilhado? Com esse diálogo da vida cotidiana, conversando, por exemplo, com um muçulmano, que terá de entrar em contato comigo e, ao final, acabamos nos respeitando no sentido de aceitar que a pessoa pode pensar diferente. Se uma pessoa vive numa sociedade democrática, tem de saber que as mulheres e os homens são tratados de maneira igual e que, portanto, não podemos aceitar determinadas práticas.
IHU On-Line – Mas quando se trata de ações terroristas, como a dos jihadistas, há espaço para diálogo? Como possibilitar o diálogo nesses casos?
Adela Cortina – Os jihadistas ou terroristas de qualquer tipo requerem um tratamento especial que não é o de uma pessoa comum. Quando eu falo, refiro-me a pessoas da vida corrente, em que uns são cristãos, outros muçulmanos, outros ateus, e tentar o diálogo é fundamental, porque do contrário não é possível conviver. 
Com relação ao fenômeno terrorista, trata-se de um fenômeno que precisa de um estudo psicológico e sociológico muito mais forte, porque pessoas que fazem ações terroristas são pessoas muito peculiares e requerem um tratamento à parte.
Não é igual ao jihadismo, mas na Espanha temos o fenômeno terrorista do ETA [4], e havia pessoas especializadas em estudar esse tipo de ação. Há pessoas que têm muita compreensão do fenômeno, porque são nacionalistas bascos, mas não é o mesmo se sentir nacionalista e optar por pegar em armas.
IHU On-Line – Como analisa as éticas neocontratualistas e utilitaristas? Que contribuições elas têm dado para pensarmos as relações éticas nas sociedades? Elas podem oferecer respostas para os nossos problemas atuais?
Adela Cortina – O utilitarismo é uma teoria ética, mas tem vários inconvenientes, entre eles o de que, segundo seu ponto de vista, a melhor opção ética é a que favorece o maior bem do maior número de pessoas e isso implica necessariamente em deixar excluídos. E isso me parece suficiente para entender que não é esse tipo de opção ética que deve ser aplicado em um país ou em uma sociedade. Nesse sentido, respeito a posição filosófica, mas não a compartilho.
Em relação às teorias neocontratualistas, como as de John Rawls [5], que tem sua origem em Hobbes [6], creio que são muito importantes para a vida política. Eu escrevi o livro Aliança e contrato, e o lado do contrato é o da comunidade política. Para mim, o discurso contratualista parece muito adequado para entender que Brasil e Espanha são comunidades nas quais estamos como se todos os cidadãos tivéssemos de chegar a um contrato, através do qual temos de cumprir com nossos deveres de tal modo que a comunidade política respeite nossos direitos.
Do ponto de vista político, o contratualismo é adequado e a neuroética apoia a visão cooperativa e contratualista das sociedades. Entendo que as teorias contratualistas e os contratos nas comunidades políticas podem ser mantidos porque por baixo do laço e do vínculo contratual há o vínculo dos seres humanos, que é mais profundo e anterior, que é o vínculo da aliança, o que significa dizer que entre os seres humanos há um vínculo que não contraímos voluntariamente, mas que nos une desde o momento que somos cada um como pessoa porque reconhecemos os outros como pessoas. Há um vínculo mais profundo e, além disso, há um sentimento reativo quando se reage contra alguém porque se esperava algo distinto; há uma expectativa em relação às demais pessoas, e mesmo quando não as conhecemos, temos uma esperança recíproca.
Há bastante tempo venho trabalhando na ética do discurso, teoria criada por Apel [7] e Habermas [8] nos anos 70, e venho tentando complementá-la com a ética de razão cordial. Nesse sentido, considero que a ética mais adequada para o nosso tempo é a do discurso, porque entre as pessoas vemos uma relação de reconhecimento e uma relação que pode ser a de cortar o vínculo, e isso é o pior, porque gera um mundo de excluídos. Desse modo, penso que a ética do discurso é inclusiva porque qualquer pessoa pode ser um interlocutor válido e sempre tem de ser levado em conta quando trata de questões que o envolvem.
IHU On-Line – Qual é a peculiaridade da ética da razão cordial?
Adela Cortina – O que proponho é que a ética da razão cordial vai um pouco além da ética do discurso. No meu novo livro comento distintas teorias éticas e como cada uma delas resulta insatisfatória até chegar à ética do discurso.

"A ética kantiana tem a vantagem da sua pretensão de universalidade e isso é importante"

 
IHU On-Line - A senhora é kantiana, mas sempre que fala sobre ética recupera elementos da ética aristotélica. Essas duas teorias morais, deontológica e teleológica, se complementam?
Adela Cortina – Sim, claro, porque são as duas éticas de maior transcendência que foram construídas ao longo da história. A ética aristotélica acolheu o melhor da ética de Platão e das outras e preparou o que foi de melhor até o seu momento e, posteriormente,Kant fez o mesmo, juntou o melhor do racionalismo e do empirismo, até chegar aos nossos dias, na ética do discurso, que é uma ética fundamentalmente kantiana. Então, creio que não somente se pode, como se deve articular as duas, porque a ética kantiana tem a vantagem da sua pretensão de universalidade e isso é importante, embora alguns a acusem de etnocentrismo, mas não podemos acusá-la, essencialmente porque ela é formal, ou seja, não tem conteúdo e quando temos de universalizar os conteúdos, entendo que possa ser impositiva.
O que a ética kantiana diz é que quando temos consciência de determinadas normas, pretendemos que deveriam ser universais e penso que todos os seres humanos fazem isso quando alguém diz: não deveríamos matar, não se deve tratar as mulheres de modo inferior etc. Essas afirmações são claras ao pretenderem universalidade como o faz a ética kantiana ao dizer, de forma extraordinária, que a pessoa é um fim em si mesma e não pode ser tratada como um simples meio. Portanto, esse tem de ser o núcleo de qualquer uma das nossas éticas.
Creio que Aristóteles, ao tratar desse componente da felicidade e de que todas as atividades têm uma meta, uma finalidade, põe outro lado que não é o da norma, mas o do fim, da felicidade. E as duas são articulações sobre o caráter, e articulando as duas é preciso tê-las em conta para ter uma ética mais íntegra.
IHU On-Line – A ética kantiana foi mal compreendida no que se trata da sua proposta de universalidade?
Adela Cortina – Eu concordo que a ética kantiana não é bem compreendida e por isso se tem uma tentativa de aclará-la no que não é bem compreendida: se é uma ética que afirma que temos consciência das normas, que todos tenderíamos a cumprir os seus conteúdos, me parece que seria uma ética impositiva, mas é uma ética formal, ou seja, pretendemos que valha universalmente. Tenho me encontrado com muitas pessoas que estudam a ética kantiana e que são contrárias ao universalismo kantiano, porém elas dizem que não pode ter pena de morte, que não há razões para não acolher os imigrantes etc. - agora não estou olhando para os conteúdos, porque poderiam ser os contrários -, mas cada vez que uma pessoa diz “não se deveria fazer determinada ação”, está universalizando, ou seja, isso se chama universalidade. Ou seja, não são ações morais que pensamos serem boas para nós ou para nosso grupo, ao contrário, nós universalizamos essas normas. A vantagem da ética do diálogo é ver qual é o conteúdo dessas normas dialogicamente, mas é claro que há uma série de atitudes que pensamos que são desumanas.
IHU On-Line – Nessa linha, a senhora defende a tese de que todos temos uma estrutura moral, mas que os conteúdos morais são distintos. Segundo a sua compreensão da ética do diálogo, é possível falar de uma moralidade objetiva? Em contrapartida, quais são as consequências de a moral ser entendida como algo subjetivo? Ainda nesse sentido, como a estrutura moral se relaciona com os diversos conteúdos morais? 
Adela Cortina – Entendo que a moral é objetiva porque é intersubjetiva, então, penso que a grande vantagem da ética do diálogo é que ela toma como ponto de partida não a consciência, mas a linguagem, as ações comunicativas, e nessas ações há uma relação entre sujeitos. Justamente essa relação entre sujeitos é a intersubjetividade. Quando falamos de normas morais, que é sobre o que fala a ética do discurso, para determinar se uma norma é justa, é preciso pôr em diálogo os afetados por elas, porque as normas se decidem intersubjetivamente.
Nesse sentido, não há uma moral subjetiva; o subjetivismo moral é falso. Quando alguém afirma que algo é uma norma moral ou um dever moral, está indo mais além da subjetividade, mas tampouco está indo a uma objetividade como se tivéssemos algo em frente com o que contrastar; é uma norma construída intersubjetivamente. Por isso é tão importante construir sujeitos morais capazes de trabalhar em intersubjetividade e por isso é importante cuidar das relações.
IHU On-Line – Então a senhora pensa que os valores intersubjetivos e os valores morais, em alguma medida, podem ser uma construção que se dá pela intersubjetividade? Se não, o que são?
Adela Cortina – Não. Creio que têm razão as éticas dos valores de Max Scheler [9] e Ortega, por exemplo. Creio que os valores valem por si e por isso nos atraem. Nós os valoramos não porque os valoramos, mas porque eles têm um valor e por isso nos atraem. A justiça nos atrai, a liberdade nos atrai, e elas efetivamente são valores. A questão é que conteúdo tem a justiça e a liberdade. A liberdade que nos faz livres não é a mesma da época de Aristóteles. Tivemos de experimentar muito para dotar de conteúdo a liberdade; não os decidimos de uma maneira arbitrária, mas vamos dotando-os de conteúdo ao longo da história, em um diálogo vital.
IHU On-Line – Através do diálogo intersubjetivo e do reconhecimento histórico dos valores, então, conseguimos reconhecer uma hierarquia de valores? 
Adela Cortina – Acredito que sim, porque o mais importante na vida é saber priorizar. Há valores que são superiores a outros e acerca disso estou de acordo com a ética dos valores. Os valores da bebida, da comida, da utilidade, na hierarquia estariam abaixo dos valores culturais, do intelecto, da beleza etc. Nesse sentido a hierarquia dos valores depende do momento em que estamos.

 

"Tivemos de experimentar muito para dotar de conteúdo a liberdade"

IHU On-Line – Mas toda vez que se fala em priorizar alguns valores, não lhe parece que algumas pessoas podem considerar que, ao fazer isso, se está “dogmatizando” ou impondo alguns valores em detrimento de outros? 
Adela Cortina – Não. Na Espanha, por exemplo, neste momento há uma enorme preocupação com os valores e isso não está acontecendo somente no mundo da educação. Na educação tem havido uma enorme preocupação em educar segundo valores, precisamente porque nos damos conta de que educar para a liberdade não é o mesmo que educar para a escravidão, e justamente a ética cívica contém um conjunto de valores que são compartilhados, como o de que a liberdade é superior à escravidão, que a solidariedade é superior à não solidariedade, a igualdade à desigualdade. Pensa-se que esses valores devem educar as crianças nas escolas e efetivamente, de alguma maneira, há muita preocupação com o que está se fazendo com os valores no âmbito da política e da economia. O que ocorre é que não se está dizendo que os valores são objetivos, mas que ao longo da história experimentamos que a liberdade é superior à escravidão e a igualdade é superior à desigualdade.
Eu disse em alguma ocasião que os valores têm de ser degustados como são degustados os bons vinhos, porque para saber de vinho e de música, temos de degustá-los. Do mesmo modo, temos visto ao longo da história que as sociedades livres são sociedades mais gratificantes em relação àquelas totalitárias, e que a igualdade é melhor que a desigualdade, porque o desenvolvimento humano é maior nos países do norte da Europa, onde há maior igualdade.
IHU On-Line - A senhora sempre fala da importância de formarmos um bom caráter. Quais são os elementos que estão formando nosso caráter hoje? 
Adela Cortina – De alguma maneira as virtudes da nossa época, e acredito que as clássicas continuam servindo: a prudência, a justiça, a temperança, não estão nada mal. São virtudes que precisamos manter e aplicar em diversos âmbitos. Depois, existem virtudes que dependem de contextos concretos, e para cada uma das atividades profissionais há que se desenvolver virtudes distintas. Tenho trabalhado esse aspecto ao tratar da ética das profissões, porque cada profissão tem de desenvolver a excelência para alcançar a meta da profissão, conforme dizia Aristóteles.
IHU On-Line – Quais as crenças fundamentais que nos fazem falta nos dias de hoje?
Adela Cortina – O que nos falta hoje em dia depende do âmbito. Não sou pessimista, porque acredito que há muitas pessoas que estão “altas de moral”. O que seria importante em nossa sociedade neste momento é a capacidade de respeitar as opções e posições dos outros, embora não se compartilhe delas, porque estamos em sociedades bastante intolerantes, não estamos aceitando que o outro pense de maneira diferente, o que gera conflitos e isso é mal para construirmos algo juntos.
IHU On-Line – A ética deve assumir compromissos metafísicos?
Adela Cortina – A metafísica é a filosofia primeira e segue sendo a chave de toda a filosofia. Desde o ponto de vista de entender a metafisica como ontologia, como estrutura, minha ética dialógica não tem princípios ontológicos.
IHU On-Line – Por que isso não lhe parece um problema?
Adela Cortina – Para mim não é um problema, absolutamente, porque assim tem de sê-lo, porque se vamos nos remeter a normas morais ou valores, ou às virtudes, podemos construí-los experencialmente a partir da intersubjetividade, e temos nossos critérios. Uma antropologia metafísica tem, hoje em dia, um inconveniente muito grande no sentido de que não pode servir de base para a ética de uma sociedade pluralista, porque numa sociedade pluralista há distintas antropologias metafísicas e filosóficas. E como fazer para que toda a sociedade mantenha uma mesma antropologia se não por imposição? Seria maravilhoso, mas não é assim; a realidade é pluralismo. Adotar uma antropologia para toda a sociedade é cair numa doutrina de bem que se impõe e com isso se acaba com o pluralismo.

"Uma antropologia metafísica tem, hoje em dia, um inconveniente muito grande no sentido de que não pode servir de base para a ética de uma sociedade pluralista"

IHU On-Line - As grandes perguntas da filosofia, pelo justo e pelo verdadeiro, por exemplo, ainda fazem sentido num mundo que afirma que não existem mais verdades? Qual é o sentido de aspirar à verdade se ela não existe?
Adela Cortina – Para mim parece diferente se perguntar pela justiça e pela verdade. A verdade está relacionada com as proposições, ou seja, as proposições podem ser verdadeiras ou falsas; a verdade não existe e a justiça tampouco. Elas são maneiras de substantivar; o que há são proposições verdadeiras ou falsas e formas justas ou injustas, ou instituições justas ou injustas, e isso é importante porque do contrário dá a sensação de que há a verdade, e quem não a tem está em erro, e isso não é verdade, porque o que pode ser verdadeiro ou falso são as proposições.
Por exemplo, dentro do cristianismo se utiliza a expressão “Eu sou o caminho, a Verdade e a Vida”. Isso significa dizer que este pode ser um modelo na vida que se merece seguir, mas não significa dizer que isso é uma verdade ontológica e quem não está de acordo com essa verdade ontológica está errado. Em absoluto. Essa seria uma péssima interpretação. A questão é que há caminhos que são mais justos que outros, proposições que são mais justas que outras porque as podemos comprovar ou não, e normas justas ou injustas. É muito perigoso achar que existe a Justiça, porque muitas doutrinas estão convencidas de que estão com a Justiça, e consideram que todos os demais estão no erro.
Por Patricia Fachin
Notas:
[1] Amartya Sen (1933): Economista indiano autor do livro Desenvolvimento com liberdade (São Paulo: Cia das Letras, 2000). Em 1998, a Real Academia da Suécia conferiu o prêmio Nobel de Economia a Sen “por devolver uma dimensão ética ao debate dos problemas econômicos vitais”. Foi galardoado com o prêmio em memória de Alfred Nobel das Ciências Econômicas, pelas suas contribuições ao Welfare Economics. Confira a entrevista Amartya Sen e uma nova ética para a economia publicada na edição 175 da IHU On-Line, de 10-04-2006. (Nota da IHU On-Line)
[2] José Ortega y Gasset (1883-1955): filósofo espanhol, que atuou também como ativista político e jornalista. Sobre o autor, confira a entrevista concedida por José Maurício de Carvalho, Pampa. Um espaço humano de promessas e realizações, concedida à IHU On-Line nº 190, de 07-08-2006, disponível em http://bit.ly/ihuon190. (Nota da IHU On-Line)
[3] Marine Le Pen: é uma advogada e política de direita da França. Deputada do Parlamento Europeu desde 2004, foi eleita presidente da Frente Nacional em 16 de janeiro de 2011, em substituição a seu pai, Jean-Marie Le Pen. É também conselheira regional de Nord-Pas-de-Calais desde março de 2010 e conselheira municipal de Hénin-Beaumont desde março de 2008. (Nota da IHU On-Line)
[4] Euskadi Ta Askatasuna (basco para Pátria Basca e Liberdade, mais conhecida pela sigla ETA): organização nacionalista basca armada. É a principal organização do Movimento de Libertação Nacional Basco e o principal ator do chamado conflito basco. Foi fundada em 1959 como um grupo de promoção da cultura basca. No final dos anos 1960, evoluiu para uma organização, paramilitar separatista, lutando pela independência da região histórica do País Basco (Euskal Herria), cujo antigo território atualmente se distribui entre a Espanha e a França. Ao mesmo tempo, a ETA assumiu uma ideologia marxista-leninista revolucionária. É classificada como um organização terrorista pelos governos da Espanha, da França, do Reino Unido dos Estados Unidos e pela União Europeia em bloco. Em geral, a mídia doméstica e internacional também se refere aos integrantes do grupo como "terroristas". A organização reivindica a zona do nordeste da Espanha e do sudoeste da França, na região montanhosa junto aos Pirenéus, virada para o Golfo de Biscaia, região denominada por Euskal Herria (País Basco). A ETA reivindica, em território espanhol, a região chamada Hegoalde ou País Basco do Sul, que é constituído por Álava, Biscaia, Guipúscoa e Navarra; também reivindica, em território francês, a região chamada Iparralde ou País Basco do Norte, que é constituído pelos territórios históricos de Labourd, Baixa Navarra e Soule. (Nota da IHU On-Line)
[5] John Rawls (1921 - 2002): foi um professor de filosofia política na Universidade de Harvard, autor de Uma Teoria da Justiça (A Theory of Justice, 1971), Liberalismo Político (Political Liberalism, 1993) e O Direito dos Povos (The Law of Peoples, 1999). Retomando a teoria do contrato social, Rawls propõe-se a responder de que modo podemos avaliar as instituições sociais: a virtude das instituições sociais consiste no fato de serem justas. Em outros termos, para o filósofo norte-americano, uma sociedade bem ordenada compartilha de uma concepção pública de justiça que regula a estrutura básica da sociedade. Com base nesta preocupação, Rawls formulou a teoria da justiça como equidade. (Nota da IHU On-Line).
[6] Thomas Hobbes (1588–1679): filósofo inglês. Sua obra mais famosa, O Leviatã (1651), trata de teoria política. Neste livro, Hobbes nega que o homem seja um ser naturalmente social. Afirma, ao contrário, que os homens são impulsionados apenas por considerações egoístas. Também escreveu sobre física e psicologia. Hobbes estudou na Universidade de Oxford e foi secretário de Sir Francis Bacon. A respeito desse filósofo, confira a entrevista O conflito é o motor da vida política, concedida pela Profa. Dra. Maria Isabel Limongi à edição 276 da revista IHU On-Line, de 06-10-2008. O material está disponível em http://bit.ly/ihuon276. (Nota da IHU On-Line)
[7] Karl-Otto Apel (1922): filósofo alemão que combina as tradições filosóficas analítica e continental. Professor emérito da Universidade de Frankfurt am Main. (Nota da IHU On-Line)
[8] Jürgen Habermas (1929): filósofo alemão, principal estudioso da segunda geração da Escola de Frankfurt. Herdando as discussões da Escola de Frankfurt, Habermas aponta a ação comunicativa como superação da razão iluminista transformada num novo mito que encobre a dominação burguesa (razão instrumental). Para ele, o logos deve contruir-se pela troca de idéias, opiniões e informações entre os sujeitos históricos estabelecendo o diálogo. (Nota da IHU On-Line)
[9] Max Scheler (1874-1928): conhecido como o filósofo dos valores. Nasceu em uma família judaica. Na sua juventude converteu-se ao catolicismo, do qual se foi gradualmente distanciando depois de 1923, aproximando-se de um panteísmo inspirado em Spinoza e Hegel. Ensinou nas Universidades de Iena, Munique e Colônia. De suas obras destacamos O lugar do homem no Mundo. (Nota da IHU On-Line)



"A Democracia brasileira está sob ataque", afirma Naomi Klein

6 de Junho de 2016, 7:20, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


A Doutrina do Choque, publicado em 2007, marcou uma geração ao apresentar como, ao contrário do que se afirmava, a implementação do neoliberalismo tinha poucas relações com o avanço da democracia liberal pelo mundo. A jornalista canadense Naomi Klein (foto), autora da obra, afirmava: as visões da Escola de Chicago foram primeiramente postas em prática em regimes autoritários, justamente porque contrariam as necessidades da maior parte da população.
 
Fonte: https://goo.gl/1yCNSW  
As ideias neoliberais, para Klein, se aproveitariam de momentos de crise para avançar. Ela concedeu uma entrevista exclusiva para o Brasil de Fato na qual analisou o momento vivido por nosso país à luz dos debates de seu livro.
Segundo ela, o programa defendido pelo governo interino de Michel Temer teria poucas condições políticas de ser implementado através de eleições. “Não há dúvida de que a democracia brasileira está sob ataque. É um tipo diferente de golpe”, afirma. “Eles estão explorando uma situação de caos, uma falta de democracia, para impor algo que eles não conseguiriam sem crise e com uma democracia real”, completa.
A entrevista é de Rafael Tatemoto, publicada por Brasil de Fato, 01-06-2016.
Eis a entrevista.
Em seu livro, você denuncia o que considera a falsa relação entre neoliberalismo e democracia política. As ditaduras militares latino-americanas ocupam um papel importante no seu argumento. Você poderia explicar isso para nós?
O argumento que eu desenvolvo neste livro é o de que nos contaram um conto de fadas sobre como esta forma extrema do capitalismo colonizou o mundo. Essa versão fantasiosa é a de que ela se espalhou pacificamente através das democracias, que a teriam escolhido. Entretanto, se olharmos para a história dos primeiros lugares onde o neoliberalismo foi imposto, ele foi imposto exatamente no oposto [do que nos é dito]: foi necessária uma derrubada da democracia para que ele se desenvolvesse.
As raízes do pensamento neoliberal estão na Universidade de Chicago, que recebeu muito apoio dos industriais norte-americanos, que estavam bastante preocupados com uma virada à esquerda nos EUA. Ela recebeu apoio, por exemplo, do presidente do Citibank. Havia muita preocupação de que, nos anos 1960, o espectro ideológico estivesse se movendo muito à esquerda.
O que é muito interessante é que quando houve um presidente [norte-americano] de direita no final dos anos 1960 e início dos 1970, Richard Nixon, apesar de ele ter contratado conselheiros que vieram da Universidade de Chicago, eles não conseguiram impor essas mesmas ideias neoliberais extremas em uma democracia, porque essas ideias eram muito impopulares. É famoso o fato de que Nixon foi contra os conselhos dados pelos economistas da Escola de Chicago, como Milton Friedman. Ele introduziu uma série de regulações ambientais e medidas de controle de salários e preços, porque a inflação estava muito alta. Friedman disse que "Richard Nixon foi o presidente mais socialista dos EUA" [risos]. O que é importante é que enquanto este projeto falhou nos EUA naquele momento, esses mesmos economistas introduziram as ideias neoliberais na América Latina durante a década de 1970, mas apenas após a realização de golpes de Estado.
O exemplo mais famoso é o Chile: após a queda do [presidente SalvadorAllende, quando os militares fizeram uma parceria com os economistas da Escola de Chicago, tornando o país um laboratório para essas ideias. Friedmansempre afirmou que a implementação dessas ideias através da brutalidade não tinha relação com as ideias em si, mas pessoas como Orlando Letelier [diplomata chileno durante o governo Allende] diziam que eram dois lados da mesma moeda: nunca é possível introduzir, através da democracia, esse tipo de ideias em países com uma grande população pobre que se beneficia de políticas redistributivas.
Você demonstrava esperança sobre a resistência aos "choques", já que as pessoas teriam aprendido com experiências anteriores. Como você vê, por exemplo, o que aconteceu na Europa após 2008, quando a crise financeira internacional estourou e políticas de austeridade foram implementadas nos países do sul daquele continente?
Esta é uma pergunta muita boa. Eu publiquei A Doutrina do Choque em 2007, pouco antes do colapso financeiro. Honestamente, eu diria que quando escrevi, eu era ingênua. No meu entendimento de como resistir a esta tática, eu acreditava que se as pessoas realmente entendessem a tática - as crises e o caos sendo aproveitados pelas elites para defender políticas inaceitáveis que as enriquecem e empobrecem a maioria - e dissessem "não", a resistência funcionaria. Mas eu acho que o que nós vemos com a experiência do que ocorreu na Grécia e na Espanha, e, na verdade, em todo o sul da Europa, é que resistir somente dizendo "não" - "não queremos a austeridade" - é apenas o primeiro passo, não é suficiente.
O caso do Syriza é exemplar: mesmo quando governos antineoliberais ganham, há maneiras de cercá-los. É necessário haver um "não" forte à "doutrina do choque", mas, especialmente em momento de grandes crises econômicas, também deve haver um "sim" no qual acreditar: deve haver uma articulação simultânea das alternativas à "doutrina do choque", que devem ir além do status quo. Esses momentos de crises demandam uma reposta. As crises dizem que alguma coisa está errada com o sistema. Nós sabemos que a direita tem a tática do choque, mas também deve haver o que eu chamo de "choque popular": uma forma alternativa de responder às crises.
Essa é a razão pela qual eu escrevi This Changes Everything [Isto Muda Tudo, sem edição em português], porque vivemos em um tempo de múltiplas crises, nas quais o sistema está falhando em várias dimensões. Está falhando economicamente, mas também ecologicamente. O que eu acredito é que nós precisamos responder a essas múltiplas crises desenvolvendo uma visão corajosa sobre como a próxima economia deva ser, que possa nos tirar dessa situação de crises em série.
A falha da centro-esquerda, em geral, foi a de não conseguir articular uma alternativa audaciosa o suficiente não só ao neoliberalismo, mas à economia extrativista de forma ampla.
Como você analisa o impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff? Alguns analistas brasileiros utilizam suas ideias para explicar o que está ocorrendo. Você concorda com eles?
Eu vi essas análises aplicando a doutrina do choque ao que está acontecendo neste momento no Brasil, e eu penso que elas são convincentes. O fato de que ela [Dilma] foi reeleita certamente frustou as elites brasileiras. Também está claro que há temores [dos políticos] em serem investigados nos escândalos [de corrupção], o que também impulsionou este desejo [de ver Dilma fora do governo]. Eu não sei qual é a grande motivação, mas há diversas coisas acontecendo: o desejo de se livrar das acusações de corrupção e o oportunismo de "nunca desperdiçar uma crise". Esta é uma frase de Rahm Emanuel, prefeito de Chicago. Ele impôs uma série de políticas neoliberais que foram incrivelmente destrutivas, particularmente para a educação e para a habitação.
PT, sob nenhum aspecto, foi perfeito. Entretanto, a redistribuição levou a uma redução da desigualdade e se combateu a pobreza extrema. Isso é significativo e criou as condições para a reeleição.
Eu realmente não sei qual foi a força motriz, mas a reeleição de Dilma certamente desmoralizou as elites brasileiras e as fez entender que não tinham as condições [políticas] de impôr essas políticas lucrativas para elas.
Responder a crises não é algo novo. O que eu argumento no livro A Doutrina do Choque é que o neoliberalismo foi uma maneira oportunista de fazer isso, não para resolver as causas das crises, mas apenas para impor políticas que enriquecem as elites e causam mais crises. É isso que estamos vendo no Brasil.
FMI [Fundo Monetário Internacional] acabou de publicar um relatório há alguns dias no qual diz que o neoliberalismo falhou completamente: não produziu crescimento, produziu desigualdade massiva e instabilidade. E essas são precisamente as políticas que estão sendo impostas no Brasil como uma suposta solução à crise econômica, ainda que saibamos que não funciona. Isso não ocorre porque as elites brasileiras não leram o relatório do FMI, mas sim porque são políticas incrivelmente lucrativas para uma minoria da população. Eles estão explorando uma situação de caos, uma falta de democracia, para impor algo que eles não conseguiriam sem crise e com uma democracia real.
Você concorda com a ideia de que se trata de um golpe?
Não há dúvida que a democracia brasileira está sob ataque. O combate à corrupção foi apenas um pretexto para se livrar da presidenta eleita democraticamente. É um tipo diferente de golpe. Não se trata de um golpe militar, com tanques nas ruas - e nós não devemos dizer que são a mesma coisa -, mas, efetivamente, há um profundo ataque à democracia acontecendo.
A “história oficial” do neoliberalismo aponta os governos Reagan [EUA] e Thatcher [Reino Unido], em países tidos como democráticos, como a origem dessas políticas. Em seu livro, porém, você cita como Thatcher combateu os sindicatos. Até mesmo em democracias, o neoliberalismo é autoritário? Devemos esperar a mesma situação no Brasil?
O que eu argumento em A Doutrina do Choque é que Thatcher não foi capaz de impôr a agenda neoliberal no Reino Unido no seu primeiro mandato. Ela até escreveu uma carta a [Friedrich vonHayek que eu cito no livro: em uma democracia, é impossível fazer o que foi feito no Chile. O que aconteceu é que a Guerra das Malvinas [da Inglaterra contra a Argentina] estourou e ela explorou o sentimento hipernacionalista e se reinventou como a "primeira-ministra para tempos de guerra", tal como Churchill, e conseguiu ganhar sua reeleição, e então atacou os sindicatos.
Os sindicatos são sempre uma grande barreira à implementação da agenda neoliberal. Eu conto a história do que ocorreu na Bolívia nos anos 1980, quando líderes sindicais eram sequestrados para que não pudessem se organizar, enquanto o choque neoliberal era imposto.
Obviamente, haverá algum tipo de estratégia para desmobilizar. Mas eu acredito que, no Brasil, o jogo ainda não terminou. As histórias estão mudando a todo momento, as pessoas estão fazendo exatamente o que elas deveriam fazer, resistindo nas ruas. Os vazamentos das conversas revelando a trama antes do golpe continuam a criar uma crise [política]. Isso precisa ser divulgado fora do Brasil, colocando pressão sobre governos estrangeiros. Nós não precisamos aceitar a ideia de que tudo vai continuar como está.
Recentemente, tivemos um grande desastre ambiental no Brasil. Em sua última obra, This Changes Everything, você coloca que o capitalismo não só aumentou as desigualdades, mas, hoje, também representa um risco para a própria existência da humanidade. Pode nos explicar isso?
O que sabemos é que se continuarmos fazendo o que estamos fazendo, alcançaremos um nível de aquecimento insustentável. Estamos em um momento em que o capitalismo e a busca pelo crescimento perpétuo estão em guerra contra a vida na Terra. Estamos chegando a um nível em que boa parte do planeta será inabitável por humanos. Está acontecendo mais rápido do que o imaginado. O branqueamento dos corais ano passado foi em uma escala sem precedentes. A Índia e o Paquistão estão passando por ondas de calor de 51º C - algo que os humanos não conseguem aguentar. E isso representa, na média global, um aumento de apenas 1º C - e nós estamos caminhando para um aumento de 6º C, a não ser que ações governamentais diferentes das que estão sendo implementadas até agora sejam tomadas.
As crises são sinais nos dizendo que há algo errado na forma como organizamos nossa sociedade. As crises econômicas apontam para o fato de que é algo sistêmico. Quando nós pensamos nas décadas de 1920 e 1930, quando ocorreu a Grande Depressão, a esquerda respondeu com alternativas muito fortes: propostas sobre como reinventar aquele sistema. Quando nós enfrentamos um choque climático - enchentes, incêndios, grandes tempestades - nós devemos responder tentando mudar o sistema para que nós paremos de enfrentar esses choques.
Acordo de Paris [sobre o clima] não está próximo o suficiente das nossas necessidades, ele não tem poder vinculativo - é por isso que Donald Trump disse que cancelaria [a participação dos EUA no acordo].
Isso está ocorrendo porque temos um sistema que nos encoraja a empreender uma busca pelo crescimento infinito a qualquer preço. Nós temos economias extrativistas, e vemos que governos de esquerda também falharam em confrontar essa lógica. Isso é verdade para a Venezuela, o Equador e para o Brasil também.
É por isso que digo que, nesses momentos de crise, o sistema revela a si mesmo como irrealizável. Nós devemos dizer "não" à doutrina do choque, mas também devemos ir além, propor um "sim". Temos que elaborar uma visão que vá até a raiz, tanto da instabilidade econômica, como da ecológica. Nesse momento, esse é o verdadeiro desafio para as brasileiras e os brasileiros. O que nós sabemos de outros países é que o "não" sozinho não é suficiente, porque em crises econômicas, as pessoas querem soluções. Elas não querem a doutrina do choque, então a pergunta é: Qual a solução? Qual o plano?
Essa era minha próxima pergunta…
Eu não posso responder para o contexto brasileiro, mas eu posso dizer que no Canadá, onde vivo, estive envolvida em um processo com diversos movimentos sociais que culminou no Manifesto do Salto [Leap Manifesto]. É uma antevisão da sociedade que queremos: como passar de uma economia extrativista - que explora sem fim a Terra, os corpos e a sociedade - para um modelo que respeite o planeta e que garanta o respeito pelo outro. Nós elaboramos 15 demandas por políticas que nos fariam chegar lá. Foi um processo maravilhoso de conectar movimentos - ambientalistas; organizações contra austeridade, contra tratados de livre comércio como o TTPP; a favor dos direitos indígenas.
Nossa perspectiva se fundamentou na visão de mundo dos povos originários, aprendendo com as primeiras nações do nosso país. Defendemos, por exemplo, o uso de energia 100% renovável, mas queremos também mudar a forma de propriedade: nem o controle das grandes corporações, nem do grande poder estatal, queremos controle comunitário. Além disso, os primeiros beneficiários desse novo modelo devem ser as comunidades atingidas pela indústria suja. Assim, [no Canadá], em primeiro lugar os indígenas e, logo em seguida, os latinos e negros.
É o que chamamos de transição justa para a próxima economia. Nós tentamos elaborar isso, talvez seja útil para as pessoas no Brasil conhecerem e se inspirarem a realizar um processo semelhante: se juntar e imaginar o desenho de uma economia pós-extrativista.



As vozes da multidão que grita contra a cultura do estupro em São Paulo

6 de Junho de 2016, 7:19, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


"Nós, da primavera feminista, viemos dar um recado: a cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. A cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil e a culpa nunca é da vítima", gritaram elas, em jogral, diante do Masp na av. Paulista em São Paulo. Foram as vozes multiplicadas que deram o início à marcha de uma multidão de mulheres e homens nesta quarta-feira para protestar contra o machismo e lembrar do estupro coletivo sofrido por uma adolescente no Rio de Janeiro da semana passada.
A reportagem é de Marina Rossi, publicada por El País, 02-06-2016.
Muitas mulheres se emocionaram e choraram, numa mistura de raiva e comoção pela grandiosidade do ato - a Polícia Militar não divulgou estimativa, mas o grupo cortou a avenida e terminou lotando a Praça Roosevelt, no centro, já sob chuva. Assim como no ano passado, no despontar do que ficou conhecido como a "primavera feminista", o grito era feroz, de quem há muito tempo engole cantadas nas ruas, machismo em casa e no trabalho e quer ver seus direitos respeitados. Como no ano passado, Eduardo Cunha, presidente afastado da Câmara, e coautor de um projeto de lei que dificulta o atendimento às vítimas de estupro, foi lembrado pelas manifestantes, que pediram sua saída. A advogada Ana Lúcia Ramos, 45 anos, levou a filha Carla Vitória, 9 anos para " aprender.
"Nem recatada, nem do lar, a mulherada está na rua pra lutar", era um dos gritos entoados, lembrando de um perfil darevista Veja que rotulou a primeira-dama interina, Marcela Temer, de "bela, recatada e do lar". Muitos dos manifestantes entoaram "Fora Temer" e criticaram o Governo interino. Carol, de 21 anos e estudante de uma universidade federal, afirmou que, independentemente da conjuntura política, é importante a mobilização das mulheres.
No caminho da manifestação rumo à rua da Consolação, havia um outro protesto, do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), naquela altura da avenida. O movimento ocupou o escritório da presidência, o que casou repressão policial poucas horas antes da marcha das mulheres.
Depois de uma breve divisão, a marcha seguiu pela rua Augusta. Débora, de 20 anos, disse que era importante se manifestar por causa do número de estupro - 47.000, considerando apenas os denunciados em 2014, de acordo com o Anuário de Segurança Pública.
"Segura, segura, segura seu machista, a América Latina vai ser toda feminista", mexeu com uma, mexeu com todas" e "que contradição, aborto é crimehomofobia não" foram algumas das palavras de ordem do que algumas chamaram de começo do "Junho Lilás", uma referência à cor do movimento feminista e aos megaprotestos de 2013. Ao longo do percurso, as manifestantes contaram até 33, para lembrar do estupro coletivo do Rio - em um de seus depoimentos, a vítima, agora sob proteção federal, disse ter sido agredida por 33 homens armados. A polícia diz que o vídeo da violação distribuído nas redes prova o estupro e investiga quantos participaram do crime. "São 33 contra todas", dizia um cartaz. Entre a maioria de mulheres, muitos homens foram protestar. Juco, 18, diz que a presença masculina era importante : "Lutamos por igualdade para todos."



Questionado decreto de MG sobre declaração de bens de agentes públicos

6 de Junho de 2016, 7:18, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


A Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 411, com pedido de liminar, contra o Decreto 46.933/2016, de Minas Gerais. A norma prevê que os agentes públicos estaduais são obrigados a apresentar declaração de bens e valores que compõem seu patrimônio privado na posse, anualmente e quando deixarem o cargo, emprego ou função.
Para a entidade, o decreto contraria os seguintes dispositivos da Constituição Federal: artigos 2º (separação e independência dos poderes) e 5º, incisos II (princípio da exclusiva reserva absoluta de lei em sentido formal), X (inviolabilidade de intimidade e privacidade), XII (inviolabilidade de sigilo de dados pessoais) e LIV (devido processo legal).
Segundo a confederação, o governador Fernando Pimentel usurpou o exercício de competência privativa normativa primária da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, pois não poderia se valer de decreto como sucedâneo de norma estadual para disciplinar o artigo 13 da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito.
A CSPB aponta que não há nenhuma lei mineira que disponha sobre a obrigatoriedade anual de apresentação da declaração de bens e valores do patrimônio privado do servidor público. Por isso, a seu ver, o ato do governador afrontou os artigos 2º e 5º, inciso II, da Carta Magna, já que o decreto não regulamentou nenhuma norma estadual sobre o assunto, o que deveria ser feito pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
De acordo com a entidade, é “evidente” que, no decreto, há uma “imediata e prévia ruptura da esfera de intimidade” do servidor público sem que haja uma prévia ordem judicial fundamentada autorizando o acesso a dados e informações sigilosas pessoais dos agentes. Na sua avaliação, a norma viola os incisos X e XII do artigo 5º da Constituição Federal que instituem as garantias da intimidade e do sigilo de dados.
“Não se justifica a prévia e abusiva quebra de sigilo e de invasão de intimidade do servidor sem a existência de prévia e regular sindicância ou algum processo administrativo disciplinar, para apurar a possibilidade de o servidor ter cometido algum crime, e mesmo assim deixando claro que a quebra de sigilo somente pode ocorrer por ordem judicial fundamental, e, ainda, assim nas hipóteses que a lei federal estabelecer e apenas para fins de investigação criminal ou instrução penal”, alega.
Por fim, a confederação argumenta que o decreto afronta o inciso LIV do artigo 5º da Carta Magna (ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal), “uma vez ser totalmente desproporcional e desarrazoado” que um ato administrativo, não prevista em lei editada pela Assembleia Legislativa, autorize a “bisbilhotagem” da vida íntima e privada de todos aqueles atingidos por seus efeitos e imponha aos servidores estaduais novas hipóteses de obrigações, deveres, infrações e sanções funcionais.
Pedidos
Na ADPF 411, a CSPB requer liminar para suspender a vigência e eficácia do Decreto Estadual 46.933/2016. No mérito, pede a declaração de que a norma descumpre preceitos fundamentais constitucionais e sua retirada do ordenamento jurídico.
O relator da ação é o ministro Edson Fachin.
RP/CR
Processos relacionados
ADPF 411



STF rejeita embargos de Eduardo Cunha e determina reautuação do inquérito como ação penal

6 de Junho de 2016, 7:17, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou nesta quinta-feira (2), por unanimidade, os embargos de declaração apresentados no Inquérito (INQ) 3983 pelo deputado federal afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e pela a ex-deputada federal Solange Almeida, atual prefeita de Rio Bonito (RJ). No julgamento, foi determinada a reautuação dos autos como ação penal, independentemente da publicação do acórdão relativo aos embargos. Com a decisão, os investigados passam formalmente à condição de réus perante o Supremo.
Nos embargos, ambos alegaram que a decisão na qual o STF recebeu a denúncia pela suposta prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro (Eduardo Cunha) e corrupção passiva (Solange Almeida) conteria omissões, contradições e obscuridades, mas segundo o relator do processo, ministro Teori Zavascki, não há o que corrigir ou esclarecer. 
“No caso, não se constata a existência de nenhuma das deficiências apontadas nos declaratórios dos embargados. Ao contrário, o que existe é a invocação de fundamentos já esgotados na decisão recorrida”, afirmou o ministro Teori, destacando que, a pretexto de sanar obscuridades e contradições, os recursos “traduzem mero inconformismo com a conclusão adotada”.
Segundo Eduardo Cunha, haveria dúvida no acórdão pelo fato de o STF ter reconhecido a prática de duas condutas realizadas em dois momentos distintos, as quais, em seu entender, não corresponderiam à tipificação penal descrita na denúncia. A denúncia apontava a participação de Cunha em acerto para o recebimento de propinas na contratação de dois navios-sonda pela Petrobras, ocorridas em 2006 e 2007. Apontava, também, sua atuação em 2011 pelo restabelecimento dos pagamentos que haviam sido suspensos. Mas, no entendimento do Plenário, só houve a comprovação de indícios materiais de autoria e participação em relação ao segundo momento e, por essa razão, o recebimento da denúncia foi parcial.
“É certo que, da forma como postulado, não pretende o embargante qualquer tipo de esclarecimento com os declaratórios, mas sim o rejulgamento da matéria, o que não se mostra apropriado”, afirmou o relator ao ressaltar que o acórdão questionado abordou claramente essa questão.
Segundo o ministro Teori, o acórdão foi enfático ao confirmar a descrição do fato criminoso e todas as suas circunstâncias – tempo, local e maneira de ação –, bem como a presença da materialidade e dos indícios de autoria, o que é suficiente para o recebimento da denúncia. Da mesma forma, ainda de acordo com o relator, não existe a alegada contradição de que Cunha estaria sendo processado pela prática de um suposto crime de corrupção passiva que sequer foi descrito na denúncia ou no seu aditamento.
“A decisão embargada afirma, como fato típico e autônomo, uma conduta praticada pelo embargante Eduardo Cunha em um segundo momento, a partir de 2010/2011. Constou expressamente do acórdão impugnado a existência de indícios suficientes, descritos na denúncia, em relação aos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em razão de fatos típicos precisamente narrados na inicial acusatória”, enfatizou o ministro Teori.
Quanto aos embargos apresentados pela ex-deputada Solange Almeida, o ministro Teori afirmou que eles apontam uma contradição inexistente, "com o nítido objetivo de rediscutir e alterar a conclusão cristalina constante no acórdão", no sentido de que os indícios existentes apontam também que ela teria concorrido para a prática do delito de corrupção passiva ao apresentar requerimentos à Comissão de Fiscalização e Finanças da Câmara dos Deputados exigindo informações sobre contratos relativos a fornecedores da Petrobras, como forma de pressão para o pagamento de propinas em atraso. “Ademais, ao contrário do sustentado, há descrição de várias ações por parte da embargante, denunciada como partícipe e não como coautora”, conclui o ministro Teori.  Todos os ministros presentes acompanharam o voto do relator.
VP/AD
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José Dirceu e o erro irreparável de uma geração

4 de Junho de 2016, 7:18, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


O caso de José Dirceu junta-se aos milhões que demonstram o que um judiciário não democratizado é capaz de fazer com uma constituição cidadã.


Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil


Victor Mendonça Neiva* - Diálogos do Sul
Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil


Esta semana nos deparamos com a condenação a 23 anos de prisão do septuagenário José Dirceu pelo conhecidíssimo juiz Moro. Esta sentença, somada a expropriação da casa da quase centenária mãe do condenado findou por revelar uma contemporânea forma de imolação medieval capaz de provocar nos raros corações que se mantiveram sensíveis à injustiça a mais completa estupefação.

Não adianta argumentar que delação premiada não é prova, que para condenar é necessário algo mais substancioso que suposições, que existem princípios historicamente construídos para assegurar ao cidadão ficar a salvo de surpresas do Estado que possam cercear a sua liberdade. Juristas bem melhores que este que vos fala já o fizeram.

Tampouco importa apresentar juízos de verossimilhança e razoabilidade que tornam absolutamente incompatível com a realidade o motivo da condenação. De fato, causou até surpresa quando, do depoimento do então acusado, o juiz apresentou apenas um patrimônio de cerca de três ou quatro milhões de reais, que se mostrou bastante pequeno para quem, com mais de 50 anos de carreira, possuía ao menos três fontes de renda lícita conhecidas. Como perseguido político da ditadura, tem ele direito à indenização em prestação mensal, além da pensão de ex-deputado e das atividades de consultoria. Se fosse economista, até me apresentaria para prestar assessoria para que administrasse melhor suas receitas. Mas presumo que, além de não considerarem os princípios jurídicos, também não se levará em conta a realidade. Receio que não tenhamos nos atentado à advertência dos Titãs nos anos 1980 e permitimos que a televisão nos deixasse burros, muito burros demais.

Da mesma forma, a história de democracia interrompida e de opressão perpetuada que caracterizou o nosso país, que foi chamado por Darcy Ribeiro de “máquina de moer gente”, nos tornou insensíveis à dor do outro, frustrando a esperança de Vinícius de Moraes de ver um mundo melhor pela transfiguração pela poesia.


Que sirva então este texto ao menos para usar este caso para chamar atenção para aquele que talvez seja o maior erro de nossa “redemocratização”: depositar as esperanças de que a cidadania se faria sem uma efetiva democratização do Judiciário.

Mantivemos os mesmos juízes e a mesma estrutura de um Judiciário que se prestara ao papel de braço de ferro da Ditadura atribuindo-lhe, desta feita, a missão de fazer cumprir a Constituição Cidadã.

Enquanto depositário das esperanças de realização de direitos, podemos perceber que o Judiciário viveu claramente dois momentos bem distintos: um de acanhamento e um de desfaçatez.

No primeiro, acostumado a servir aos arautos do regime, não soube como agir em relação às prerrogativas que lhe foram atribuídas. Por exemplo, permitiu reedição indefinida de medidas provisórias e esvaziou o poder de regulamentação de direitos fundamentais quando o Congresso ficasse omisso. Por outro lado, a sua raiz positivista lhe deu um perfil garantista que manteve certa eficiência quanto a defesa de direitos fundamentais principalmente relacionados à área criminal, o que permitiu o mínimo de segurança jurídica quanto ao exercício de atos de poder. Havia, neste momento, uma certa preocupação com a coerência de suas decisões e com busca a que os precedentes de um caso pudessem, nas mesmas circunstâncias, serem universalizados. Por outro lado, deixou bem claro que não seria o Judiciário o ambiente apropriado para intervir em políticas públicas, muito embora expressamente autorizado a isso.

Na segunda fase, após uma renovação do Supremo e a oxigenação das teorias constitucionais, que ampliou sobremaneira a margem hermenêutica de decisão judicial, inicia-se claramente um processo de transição. O Judiciário assume um maior protagonismo e celebres julgamentos revigoram a expectativa de que se assumiria de fato o papel de ser “a última trincheira da cidadania. São notáveis, por exemplo, a interferência na prestação de serviços de saúde e o reconhecimento do direito ao casamento de homossexuais.

Em paralelo a esta mudança, uma série de alterações legislativas ampliam enormemente o espectro de decisões possíveis a partir de um processo judicial, principalmente daqueles em que se discute a validade ou não de leis em face da Constituição. Mantiveram entretanto o esquecimento da advertência de Manoel Bomfim feita em 1903, a saber:

O Estado – essa abstração – dissimula homens, de carne e osso, com todas as suas paixões e defeitos, desenvolvidos na luta pérfida e terrível que sintetiza a política; chegados por ali ao posto de autoridades, o gozo do mando os corrompe – mesmo aos ricos de virtude; e, senhores do “poder”, raros são os que não descambam para o despotismo. Como esperar, então, que esses homens – os que se colocaram no governo por ocasião da independência das colônias – procedessem diversamente, e não só vencessem a tendência normal ao exagero das prerrogativas governamentais, como destruíssem, de chofre, os costumes já consagrados?… Eles não o fizeram, nem pensaram nisto: uns, porque se esforçavam justamente por conservar todos os antigos abusos, costumes, privilégios e processos propícios à exploração; outros – os bem intencionados e radicais – porque estavam convencidos de que, para dar independência e liberdade à sua pátria, fora bastante fazer cessar o domínio formal da metrópole, e decretar Constituições liberais. Vieram as Constituições, mas não chegaram a mudar o conceito geral de Estado, porque, em verdade, elas não tiveram como efeito constituir nenhum Estado, que já estava constituído, e em função, havia mais de dois séculos.

A excessiva liberdade abriu margem a casuísmos e tornou-se quimera o dever de coerência e a busca por segurança jurídica. O mesmo tribunal que edita uma súmula vinculante a partir da prisão de um banqueiro permite que se arrombe residência de cidadãos normais sem mandado judicial, autoriza prisão antecipada mas impede o recebimento de dividas em face do Estado, concede liminares para atribuir a si próprio vexatórias vantagens funcionais enquanto restringe justas pretensões trabalhistas como o relativo ao adicional de insalubridade.

Tampouco a reputação ilibada deixa de ser uma exigência inafastável do exercício do cargo. Já tivemos ministro do supremo que se vangloriou te ter fraudado o texto da Constituição quando era parlamentar, ministro montando empresa em apartamento funcional para praticar elisão fiscal, ministro acusando outro ministro de ter capangas, ministro apontado como autor de atos gravíssimos de improbidade quando no executivo, ministro acusado de proteger irmão, ministro acusado de estar em lista de corrupção… E nada se apura. Nada gera consequências.

Como se não bastasse, a esse fenômeno soma-se a inequívoca partidarização da Justiça. Causada pelo dolo de alguns e pela omissão de muitos, inclusive de outros poderes, assistimos ao poder que deveria ter na imparcialidade sua característica ontológica assumir efetivo protagonismo na luta política.

O marco inicial deste momento pode ser fixado a partir do julgamento do mensalão. A partir deste momento, torna-se inequívoco o desapego à equidistância e o firme desiderato de interferência perniciosa no processo político. A vedação ao financiamento privado de campanha ficou engavetado por mais de um ano em um gabinete. O mesmo ministro que afasta o presidente da Câmara por ser um delinquente finda por legitimar o afastamento da presidente da república por “ausência de provas” de que este sujeito tenha interferido no processo, muito embora tenha sido o autor da admissão do processo. Impede-se a nomeação de um ministro investigado pela presidência eleita de um partido e autoriza-se a de outros em condição pior pelo presidente substituto de outra agremiação.

O resultado desta transformação não poderia ser outro: frustração. E não só do ponto de vista do processo político. Atualmente mais de 40% dos presos estão aguardando julgamento, alguns por vários anos, é mais fácil punir uma babá por tortura que um agente do estado, condenações criminais por escravidão praticamente inexistem, ofensas jurídicas em massa se materializam a todo o dia sem expectativa de reprimenda, permanece o genocídio de minorias e os assassinatos no campo e assim por diante. Juristas e intelectuais sérios em atividades de pesquisa começam a apontar que o direito de declarar em processos objetivos normas inconstitucionais tem servido muito mais ao Estado e a corporações do que a realização de direitos fundamentais.

Não é à toa, portanto, que segundo o Índice de Confiança na Justiça Brasileira da Fundação Getúlio Vargas do segundo trimestre de 2012 ao primeiro de 2013, “comparando-se a confiabilidade no Poder Judiciário com a confiabilidade nas outras instituições, o resultado não foi muito positivo, uma vez que o Judiciário foi considerado uma das instituições menos confiáveis, ficando a frente apenas de 4 entre 11 instituições pesquisadas: os partidos políticos, o Congresso Nacional, as emissoras de televisão e a polícia. De acordo com os entrevistados, o Judiciário foi considerado uma instituição menos confiável que o Governo Federal, as grandes empresas, a imprensa escrita, o Ministério Público, a Igreja Católica e as Forças Armadas”.

Nesse sentido, o caso de José Dirceu junta-se ao dos milhões de Amarildos a demonstrar o que um judiciário não democratizado é capaz de fazer com uma constituição cidadã. Se o pedreiro nos mostrou que é mentira a inexistência de pena de morte no Brasil, o político o fez quanto à inexistência de prisão perpétua. Obviamente, todos os casos tem a sua especificidade, e o de Dirceu seria até pitoresco se não fosse repugnante ver um ser humano condenado por literatura ser submetido não a um julgamento, mas a um justiçamento visceral.

Oxalá a próxima geração consiga corrigir equívoco tão visceral à nossa liberdade. Enquanto isso, que nos salvem dos livros! Eles dão cadeia até para quem não os lê.

*Victor Mendonça Neiva é advogado e colaborador do Diálogos do Sul, de Brasília. Publicado originalmente no sitio Diálogos do Sul.



Créditos da foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil



Mãe de menino de 10 anos morto pela PM acusa policiais de plantar arma

4 de Junho de 2016, 1:11, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Estadão Conteúdo
Hoje em Dia - Belo Horizonte
 
RAFAEL ARBEX/ESTADÃO CONTEÚDO /
A doméstica Cintia Ferreira Francelino, de 29 anos, chegou no Instituto Médico-Legal (IML) Oeste, na Vila Leopoldina, zona oeste de São Paulo, acompanhada de quatro familiares, só um deles sem calçar chinelos. Passou pela porta, foi até o balcão e disse, com lábios tremendo: "Meu filho". O atendente pediu para ela aguardar. Ela é mãe do menino de 10 anos morto por policiais militares enquanto tentava fugir com um carro furtado de um condomínio da Vila Andrade, na zona sul, na quinta-feira, 2. Segundo o boletim de ocorrência, o menino atirou contra os policiais. 

Moradora de uma favela perto da Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, no Campo Belo, na zona sul, a mãe questionava: "Como ele (o policial que deu um disparo na cabeça do menino) não viu que era uma criança, meu Deus? Ele não tem filho?"

A mãe contou que o filho morava com a avó paterna e que havia abandonado a escola neste ano. "Ele estava andando muito na rua, mas não tinha arma. Quero que façam exame da digital na mão dele", afirmou, referindo-se ao exame residuográfico, capaz de detectar registros de pólvora e indicar se ele chegou a fazer disparos com revólver. Ela disse acreditar que os policiais tenham plantado a arma na criança.

Chorando muito, ela falou com jornalistas em espasmos de desabafo, enquanto aguardava a liberação do corpo. Ao ser informada de que a demora se devia ao fato de que o projétil que atingiu o garoto ainda estava sendo retirado, parou de falar, começou a derramar lágrimas e saiu para fumar. 

O desespero da mãe era acompanhado da revolta dos familiares que a ajudavam. Um tio do menino, que não quis dar o nome, também falou. "A gente sabe como é as coisas onde a gente mora. Todo mundo sabe. Todo mundo ali sabe que ninguém daria uma arma para um menino de 10 anos", disse. "Tem consequência. Então, não tinha como ele ter uma arma."

A família contou que o menino tinha uma caixa de engraxates e que, às vezes, ia até o aeroporto ver se conseguia algum dinheiro. "Os meninos lá só querem ficar na lan house, por isso ele queria dinheiro", afirmou o tio. 

Embora tenha reconhecido que o menino não estudava e vivia na rua, a mãe negou que ele já tivesse cometido crimes. Há, entretanto, dois boletins de ocorrência registrando furtos anteriores praticados pelo filho, em janeiro e em abril deste ano. 

A mãe disse ainda que o pai da criança, de quem é separada, estava viajando - sem dar detalhes, disse que a família mantinha bom relacionamento.

Até o início da tarde desta sexta-feira, 3, o corpo estava no IML. A família ainda não sabia onde seria o enterro.




Soldado será o 1º gay a casar de farda da Brigada Militar em 178 anos

4 de Junho de 2016, 1:08, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Soldado Martins deve  casar em dezembro. (Foto: Reprodução/ Facebook)
Soldado Martins deve casar em dezembro. (Foto: Reprodução/ Facebook)


O soldado Miguel Martins, de 29 anos, morador de Uruguaiana, será o primeiro policial militar homossexual a casar com o uniforme de gala da BM (Brigada Militar) em 178 anos da corporação. O casamento de Martins com o modelo Diego Souza, de 21, deve ocorrer no dia 23 de dezembro. Ele já recebeu o  aval do comando geral da BM para usar o uniforme.

Martins e Souza. (Foto: reprodução Facebook)
“Como o regulamento da BM prevê o uso do uniforme nessa ocasião [casamento], e como é comum a união entre mesmo sexos, não seríamos nós que iríamos impedir alguém de usar o uniforme”, relatou o subcomandante do Batalhão de Patrulhamento de Áreas de Fronteira, capitão Gerson Corrêa de Mello. Ele destacou ainda, que Martins tem aval, inclusive do Comando Geral da BM para usar a vestimenta no grande dia.

Fonte: http://www.osul.com.br/soldado-sera-o-1o-gay-a-casar-de-farda-da-brigada-militar-em-178-anos/



TRE de São Paulo confirma: Michel Temer está inelegível por oito anos

3 de Junho de 2016, 8:00, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

"FICHA SUJA"





Para o Tribunal Regional Eleitoral, o presidente interino Michel Temer está inelegível pelos próximos oito anos. Nesta quinta-feira (2/6), o tribunal enviou à zona eleitoral de Temer uma certidão para constar do sistema da Justiça Eleitoral que o vice-presidente não é mais um “candidato ficha limpa”, nos termos da alínea “p” do artigo 1º da Lei Complementar 64/1990, a Lei das Inelegibilidades.
Em maio deste ano, quando o TRE-SP confirmou a condenação de Temer por doações acima do limite legal, a Procuradoria Regional Eleitoral do estado chegou a dizer que o presidente em exercício estaria inelegível. Temer disse, então, que a sua inelegibilidade era uma "especulação precipitada".
A certidão publicada nesta quinta-feira, no entanto, é uma praxe do tribunal, definida em regra interna para se adequar à Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010). De acordo com esse despacho, toda vez que alguém é condenado em segundo grau pela Justiça Eleitoral, deve constar de seu cadastro eleitoral que ele é inelegível, nos termos da LC 64, sem necessidade de um despacho do relator.
A certidão não gera qualquer problema para que Temer exerça o cargo de presidente em exercício ou de vice-presidente, para o qual já foi eleito. Será um obstáculo apenas para uma futura candidatura — ele já disse que não pretende concorrer à reeleição.
Advogado que representa Temer considera essa certidão do TRE “tecnicamente errada”.Reprodução
O documento, publicado nesta quinta no andamento processual, diz: "Certidão de que, nesta data, em cumprimento ao despacho normativo proferido pelo Presidente nos autos do Recurso Eleitoral  1901-88.2011.6.26.0000, foi transmitida mensagem eletrônica à 2ª Zona Eleitoral de São Paulo, para o comando do ASE 540 - inelegibilidade no Sistema ELO em nome de Michel Miguel Elias Temer Lulia".
No entanto, como a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral afirma que as condições de elegibilidade devem ser conferidas apenas no momento do registro, pode ser que o juiz responsável por uma eventual candidatura de Temer releve a condenação e autorize o registro.
Temer foi condenado em novembro de 2015 por ter feito doações eleitorais acima do limite permitido por lei. De acordo com o Ministério Público Eleitoral de São Paulo, ele declarou rendimentos de R$ 840 mil e fez doações de R$ 100 mil, durante as eleições de 2014. Pela lei, ele só poderia ter doado10% do rendimento bruto auferido no ano anterior.
A condenação foi confirmada pelo TRE em maio deste ano. Com isso, Temer tornou-se inelegível, conforme os requisitos da Lei da Ficha Limpa. Conforme a explicação do TRE, a partir do momento em que a Zona Eleitoral receber o comunicado, constará da certidão de quitação eleitoral de Temer que ele não é mais ficha limpa.
O advogado eleitoralista Gustavo Guedes, que representa Temer no TSE, considera essa certidão do TRE “tecnicamente errada”. “Ele não foi condenado à inelegibilidade, ele foi condenado por doação acima do limite legal. A inelegibilidade pode ou não ser uma consequência dessa condenação, mas isso quem vai dizer é o juiz que analisar o pedido de registro de candidatura”, afirma.
Guedes explica que a condenação por doação acima do limite legal tem como pena apenas o pagamento de multa. É diferente da condenação por abuso de poder econômico, crime eleitoral descrito no artigo 22 da LC 64, que tem como pena expressa a perda do mandato e a inelegibilidade por oito anos, diz ele. “Não se pode condenar alguém à consequência da pena, só ao que está escrito.”
Nos casos de doação acima do limite legal, de acordo com a explicação de Guedes, decisões do TSE afirmam que o juiz deve avaliar cada caso para saber se houve ou não abuso de poder econômico nelas. Caso isso não tenha acontecido, a doação não pode ser considerada causa de inelegibilidade.
RE 18.564
*Texto alterado às 19h22 do dia 2 de junho de 2016 para acréscimo.
Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico



Promulgada Lei que Anistia Policiais e Bombeiros Militares do Paraná e outros Estados por participarem de movimentos reivindicatórios

3 de Junho de 2016, 7:48, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


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Os Policiais e Bombeiros Militares do Estado do Paraná foram contemplados com a Lei de Anistia publicada, nesta quinta-feira (2), no Diário Oficial da União. A lei sancionada pelo atua presidente da República, Michel Temer (PMDB), concede anistia aos policiais e bombeiros militares dos Estados de Alagoas, de Goiás, do Maranhão, de Minas Gerais, da Paraíba, do Piauí, do Rio de Janeiro, de Rondônia, de Sergipe, do Tocantins, da Bahia, do Ceará, de Mato Grosso, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Santa Catarina, do Amazonas, do Pará, do Acre, de Mato Grosso do Sul, do Paraná e do Distrito Federal.

Conforme ainda o Diário Oficial, a anistia foi concedida aos policiais e bombeiros militares que participaram de movimentos reivindicatórios por melhorias de vencimentos e condições de trabalho, ocorridos entre o dia 1º de janeiro de 1997, até a data de publicação da Lei.

O DOU aponta ainda que a Lei abrange os crimes definidos no Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 – Código Penal Militar, e na Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 – Lei de Segurança Nacional, e as infrações disciplinares conexas, não incluindo os crimes definidos no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e nas demais leis penais especiais.

LEI Nº 13.293, DE 1º DE JUNHO DE 2016.
Altera a Lei nº 12.505, de 11 de outubro de 2011, que “concede anistia aos policiais e bombeiros militares dos Estados de Alagoas, de Goiás, do Maranhão, de Minas Gerais, da Paraíba, do Piauí, do Rio de Janeiro, de Rondônia, de Sergipe, da Bahia, do Ceará, de Mato Grosso, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Santa Catarina, do Tocantins e do Distrito Federal punidos por participar de movimentos reivindicatórios”, para acrescentar os Estados do Amazonas, do Pará, do Acre, do Mato Grosso do Sul e do Paraná.


O VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA no exercício do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu promulgo, nos termos do parágrafo 5o do art. 66 da Constituição Federal, a seguinte Lei:
Art. 1o A ementa e os arts. 1º e 2º da Lei nº 12.505, de 11 de outubro de 2011, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Concede anistia aos policiais e bombeiros militares dos Estados de Alagoas, de Goiás, do Maranhão, de Minas Gerais, da Paraíba, do Piauí, do Rio de Janeiro, de Rondônia, de Sergipe, do Tocantins, da Bahia, do Ceará, de Mato Grosso, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Santa Catarina, do Amazonas, do Pará, do Acre, de Mato Grosso do Sul, do Paraná e do Distrito Federal.”

“Art. 1º É concedida anistia aos policiais e bombeiros militares que participaram de movimentos reivindicatórios por melhorias de vencimentos e condições de trabalho ocorridos:

I – entre o dia 1º de janeiro de 1997 e a data de publicação desta Lei, inclusive, nos Estados de Alagoas, de Goiás, do Maranhão, de Minas Gerais, da Paraíba, do Piauí, do Rio de Janeiro, de Rondônia, de Sergipe e do Tocantins;

II – entre a data de publicação da Lei nº 12.191, de 13 de janeiro de 2010, e a data de publicação desta Lei, inclusive, nos Estados da Bahia, do Ceará, de Mato Grosso, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Santa Catarina, do Amazonas, do Pará, do Acre, de Mato Grosso do Sul, do Maranhão, de Alagoas, do Rio de Janeiro, da Paraíba, do Paraná e do Distrito Federal.” (NR)
“Art. 2º A anistia de que trata esta Lei abrange os crimes definidos no Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 – Código Penal Militar, e na Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 – Lei de Segurança Nacional, e as infrações disciplinares conexas, não incluindo os crimes definidos no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e nas demais leis penais especiais.” (NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

Brasília, 1º de junho de 2016; 195º da Independência e 128º da República.
MICHEL TEMER

* com informações do Diário Oficial da União – Seção 1 Edição nr 104 de 02/06/2016 Pág. 1-2 LEI Nº 13.293, DE 1º DE JUNHO DE 2016. ANISTIA POLICIAIS MILITARES



Uso de arma de fogo pela Guarda Municipal é discutido em seminário

2 de Junho de 2016, 8:38, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Foto: Anete Poll
Uso de arma de fogo pela Guarda Municipal é discutido em seminário
Professor Eduardo Pazinato acredita que ações não dependem do uso de arma de fogo
    Durante o 1º Seminário de Segurança do Rio Grande (realizado dias 30 e 31), um amplo debate se formou sobre a Guarda Municipal, suas atribuições e seu papel. Uma das principais lutas, hoje, da instituição, aqui na cidade, refere-se ao uso de equipamentos como colete balístico e armas de fogo.

    O professor e mestre em Direito, Eduardo Pazinato, em sua palestra, realizada no último dia 31, frisou: "nesse particular (uso de arma de fogo), sustento que a definição da identidade da Guarda Municipal não se dá pela ferramenta que utiliza, mas sim pela prática socioprofissional que a corporação empreende, o que pode ocorrer com ou sem arma de fogo, a depender, isto sim, das atividades e tarefas efetuadas. Mas esta é, sem dúvida, uma grande decisão", ressaltou.

    O coordenador do Gabinete de Gestão Integrada do Município (GGI-M), Daniel Nascimento, salientou que o processo de aumento da guarda é importante. "Mas o que tem que ficar claro, neste processo, é que ele não pode se pautar no uso ou não de arma. Temos que ter em mente as características da guarda cidadã, de aproximação, não deixando de ser guarda patrimonial, mas em casos de maior ostensividade e que esteja em risco a vida dele ou de terceiro, se faz necessário o uso de arma".

    Ainda, conforme pronunciou Nascimento, para se chegar a isso, um longo caminho tem que ser percorrido."Temos que entender também que nem todos têm o perfil para andar armados”, salientou, apontando que, em sua opinião, deveria haver sim um grupo com porte de arma.

    Segundo o professor Pazinato, este é um processo demorado e que depende de várias questões."Observe-se que, a exemplo do que já ensejava o Estatuto do Desarmamento, o art. 16, da Lei n.º13.022/2014, permite o porte de arma de fogo para as Guardas Municipais, respeitados os requisitos constantes nas demais leis que regulam a matéria".

    Aponta ainda Pazinato, que os requisitos previstos no Estatuto do Desarmamento exigem comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, além da  apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa do servidor, comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo e apresentação da documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente, sejam observados o alinhamento da premência da utilização do armamento.

    Pazinato afirma que as Guardas Municipais são a principal agência municipal de segurança pública, atuando 24 horas por dia, sete dias por semana e 365 dias por ano. "Mas,ainda existe uma grande carência no campo da gestão da informação. Um dos maiores desafios para a consolidação desta instituição, no Estado (e no Brasil), sem dúvida, relaciona-se com a gestão da informação. Os registros de atendimentos, com exceções, são ainda, majoritariamente, feitos em papel.

    O uso de recursos tecnológicos afigura-se fundamental para potencializar a transição paradigmática, porque passam as Guardas Municipais de uma “Guarda Patrimonial” para uma “Guarda Comunitária”. "Inúmeras Guardas Municipais cumulam as atividades da Defesa Civil, sendo esta uma tendência verificada no Estado e no País. Algumas cumulam as funções de patrulhamento preventivo, vigilância patrimonial e ordenamento do trânsito", salientou o professor.

    "O caminho, certamente, passa por uma maior e melhor aproximação dessa instituição com a comunidade, assim como por uma integração mais direta com os demais órgãos de segurança (e justiça), em consonância com a advogada e demandada gestão integrada da segurança pública", finalizou Eduardo Pazinato.


    Por Anete Poll
    anete@jornalagora.com.br



    Propostas de Alexandre de Moraes para segurança chocam especialistas

    2 de Junho de 2016, 8:36, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


    POR GUILHERME AMADO

    Eduardo Valente
    Eduardo Valente | Frame/Agência O Globo
    As propostas de Alexandre de Moraes para a segurança pública, apresentadas ontem no Ministério da Justiça, foram muito mal recebidas por especialistas no tema.
    Falta de planejamento, improviso e desconhecimento do tema foram alguns dos problemas identificados por especialistas de diferentes espectros políticos.
    Disse o sociólogo Cláudio Beato (UFMG), um dos formuladores do programa de governo do PSDB em 2014 para o setor:
    — Moraes está improvisado, visivelmente sem um plano. Ele vai precisar de um tempo para sair de São Paulo. Assumiu com uma agenda de xerife, como essa mudança na progressão de pena.
    Moraes afirmou ontem que vai propor o endurecimento do regime de progressão de pena, que permite a liberdade de criminosos antes do tempo da condenação.
    Diretor da Open Society para América Latina e ex-secretário nacional de Justiça, Pedro Abramovay também atacou a ideia:
    — Quem quiser resolver o problema da segurança para valer deve diminuir a quantidade de presos e não aumentar. Foi isso que engendrou o PCC. Como propor isso sem pensar no sistema carcerário?
    Vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima apontou alguns problemas nas propostas de Moraes para combater violência da mulher:
    — Faltou falar na origem do dinheiro para pagar diárias extras de policiais em áreas de violência contra a mulher e dizer quando isso será feito. E não pode ignorar que já existiam trabalhos nessa área sendo feitos.



    CÁLCULO PRESCRICIONAL DA PRETENSÃO PUNITIVA E EXECUTÓRIA

    1 de Junho de 2016, 12:52, por POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

    Cálculo dos prazos prescricionais (CP, art. 109)  

    Os prazos prescricionais da pretensão punitiva podem ser estabelecidos pela lei (CP, art. 109) ou pela sentença condenatória transitada em julgado para a acusação (art. 110, § 1°). 

    Os prazos legais são os seguintes: 

    a)  20 (vinte) anos, se o máximo da pena for superior a 12 (doze); 

    b)  16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) e não excede a 12 (doze) anos; 

    c)  12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) e não excede a 8 (oito) anos; 

    d)  8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) e não excede a 4 (quatro) anos; 

    e)  4 (quatro) anos, se o máximo da pena é superior a 1 (um) e não excede a 2 (dois) anos; e 

    f)  3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.


    É indiferente, em termos de prescrição, que a pena privativa de liberdade tenha sido efetivada aplicada ou substituída, na sentença, por restritiva de direitos, pois os prazos prescricionais para as penas restritivas de direitos são os mesmos previstos para as penas privativas de liberdade (CP, art. 109, parágrafo único).  

    A contagem dos prazos da prescrição da pretensão punitiva não sofre o acréscimo de 1/3 em razão da  reincidência,  uma  vez  que  esse  aumento  é previsto  exclusivamente  para  a  prescrição  da pretensão executória (CP, art. 110, caput). 

    Nos termos da Súmula 220 do STJ: “A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.   Ex.: agente, já condenado anteriormente de forma definitiva, comete crime de homicídio simples (art. 121, caput – pena: reclusão de 6 a 20 anos). 

    Antes da nova condenação definitiva, mesmo ele sendo reincidente, o prazo prescricional mantém-se em 20 (vinte) anos, conforme o art. 109, I, do CP, pois se  trata  de  caso  de  prescrição  da  pretensão  punitiva.  Caso  ele  seja condenado definitivamente a pena de 8 (oito) anos, o prazo prescricional seria de 12 (doze) anos (CP, art. 109, III) acrescido de 1/3 (um terço) em razão da reincidência, ou seja, a prescrição da pretensão executória somente ocorreria depois de 16 (dezesseis) anos.  

    No caso de fuga do condenado ou de revogação do livramento condicional, o prazo prescricional deve ser calculado de acordo com o restante da pena a ser cumprida (CP, art. 113). Ex.: condenado a 6 (seis) anos, cumpre quatro antes de evadir-se da prisão. Restam, portanto, 2 (dois) anos de pena a cumprir. A partir  do momento da  fuga,  a  polícia tem um período  de  4  (quatro)  anos para recapturá-lo, pois esse é o prazo prescricional relativo ao restante da pena. Esse prazo, que era de 2 (dois) anos, foi aumentado para 3 (três) anos pela Lei nº 12.234, de 2010. 

    CRIMINAL.  HABEAS  CORPUS.  ESTELIONATO. TENTATIVA.  TEMPO  DE PRISÃO PROVISÓRIA. DETRAÇÃO. FINS DE CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 113 DO CÓDIGO PENAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. ORDEM DENEGADA. A aplicação do art. 113 do Código Penal é restrita às situações por ele especificadas, quais sejam, evasão de condenado ou revogação de livramento condicional. Impossibilidade de aplicação extensiva ou analógica. O período de prisão provisória do réu é levado em conta apenas para o desconto da pena a ser cumprida, sendo irrelevante para fins de contagem do prazo prescricional, que deve ser analisado a partir da pena concretamente imposta pelo Julgador e, não, do restante da reprimenda a ser executada pelo Estado. Precedentes. Ordem denegada. (STJ, HC 193415 / ES, julgado em 07/04/2011). 

    A prescrição da pena de multa ocorrerá (CP, art. 114): a)  Em 2 (dois) anos, se a pena de multa for a única cominada (pretensão punitiva) ou aplicada (pretensão executória). Trata-se de hipótese que ocorre apenas nas contravenções, pois, nos crimes, multa sempre vem acompanhada de reclusão ou detenção. Neste caso, não há possibilidade de aumento do prazo em razão da reincidência, pois o art. 110, caput, que dispõe a respeito do aumento, refere-se expressamente ao art. 109, que trata somente de penas privativas de liberdade; 

    b)  No mesmo prazo estabelecido para a pena privativa de liberdade: se a multa for alternativa ou  cumulativamente  cominada  (pretensão  punitiva)  ou cumulativamente  aplicada (pretensão executória).

    Em complemento, o art. 118 do CP determina que as penas mais leves prescrevem juntamente com as penas mais graves. Assim, havendo penas cominadas, conjunta ou alternativamente, para o mesmo delito (reclusão e/ou detenção, detenção e/ou restritiva de direitos, detenção e/ou multa, etc.), o prazo prescricional a ser considerado para ambas sempre será o da pena mais grave.  

    O prazo prescricional é diminuído pela metade se o criminoso era (CP, art. 115, I) ao tempo do crime menor de 21 (vinte e um) anos. O fato de o Código Civil de 2002 ter determinado que a maioridade absoluta é alcançada aos 18 (dezoito) anos e não mais aos 21 (vinte e um) anos (como previa o CC de 1916) é indiferente para a concessão desse benefício. 

    De acordo com o STJ, “para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil”, ou seja, por meio de certidão de nascimento.  Também é prevista redução à metade se, na data da sentença, o condenado é maior de 70 (setenta) anos. Completar 70 (setenta) anos apenas na data do acórdão não dá direito ao benefício. O fato de o Estatuto do Idoso (Lei n° 10.741, de 2003) dar especial proteção aos maiores de 60 (sessenta) anos (art. 1°) não altera os requisitos de concessão desse benefício.  

    Habeas corpus. Prescrição da pretensão punitiva. Inocorrência. Paciente condenado a pena privativa de liberdade, cumulada com multa. Pena privativa de liberdade substituída pela restritiva de direitos. Inaplicabilidade do inciso I do art. 114 do Código Penal. Incidência do parágrafo único e caput do art. 109 do CP. Ordem denegada. 1. O paciente foi condenado à pena de um ano e quatro meses de reclusão e doze dias-multa (art. 168, caput, do Código Penal), sendo que a pena privativa de liberdade foi substituída pela restritiva de direitos (pagamento de prestação pecuniária), fato que não impede a aplicação dos prazos prescricionais fixados pelo art. 109 do CP. Dispositivo que, em seu parágrafo único, estende, expressamente, “às penas restritivas de direito os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade.” 2. A pena restritiva de direitos é  de natureza jurídica distinta da pena de multa. Inaplicabilidade, portanto, do inciso I do art. 114 do CP. Disposição legal que estabelece, de modo particularizado, o prazo prescricional de 2 (dois) anos para a pena de multa, quando essa multa “for a única cominada ou aplicada”, o que não é a hipótese dos autos. Precedentes. 3. Habeas corpus indeferido. (STF, HC 101669 / SP, julgado em 05/10/2010).




    Fonte: Direito penal Contemporanêo