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Cúpula dos Povos

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Cupula dos Povos

11 de Junho de 2012, 21:00 , por Vicente Aguiar - | No one following this article yet.

Movimentos discutem alternativas para geração de energia e criticam indústria extrativa

17 de Junho de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

O dilema da produção de energia não é tecnológico, mas político, pois o essencial é saber para que, para quem e sob o controle de quem é produzida a energia. Essa constatação perpassou a plenária de convergência sobre energia e indústria extrativa da Cúpula dos Povos nesse domingo (17).

Esse espaço reuniu movimentos sociais, em especial da América e da África, para discutir os problemas do modelo energético e da indústria extrativa e fazer o exercício de propor uma alternativa que não agrida o meio ambiente, as comunidades atingidas e os trabalhadores.

Os participantes identificaram o problema no papel das corporações transnacionais, que avançam sobre os territórios desrespeitando a soberania dos povos, em especial nos países do hemisfério sul, com o objetivo de acumular lucro. As falas da plenária trouxeram muitos exemplos regionais de como ocorre esse processo. Em Moçambique, é a Vale extraindo carvão; na Guatemala, há mais de 100 projetos de hidrelétricas que, apesar de recusados pelo povo em plebiscito, continuam a serem impostos; nas áreas indígenas de Roraima e Rondônia, no Brasil, o problema são as grandes barragens.

De manhã, sob a proposta de identificar os problemas estruturais nessa área, Gustavo Castro, do Movimiento de los Afectados por las Presas y em Defensa de los Ríos (Mapder), do México, explicou que a crise do capital leva à intensificação da indústria extrativa, que coloca sob controle das grandes empresas não só os mineirais, mas também o ar, a água, os  bens vegetais.

Gilberto Cervinski, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), do Brasil, destacou a centralidade da energia para o capital, pois ela aumenta a produtividade do trabalho dos trabalhadores, e ressaltou que o problema central não é com relação à matriz, mas diz respeito ao controle das corporações sobre a geração de energia.

Fabian Masisa, da Articulação Internacional dos Atingidos pela Vale, de Moçambique, trouxe o relato da extração de carvão pela transacional brasileira Vale em seu país e denunciou a absoluta falta de respeito pelas comunidades atingidas, que têm sua vida mudada para pior.

Também denunciaram a situação predatória do capital extrativista na África Bobby Peck, do Friend of Earth Africa, e Thembeka Majali, do One Million Climate Jobs, já no período da tarde, quando a tônica do debate foi discutir as alternativas dos povos para solucionar esses problemas.

João Antônio de Moraes, da Federação Única dos Petroleiros (FUP), do Brasil, ressaltou que os trabalhadores do setor da energia não são adversários das comunidades atingidas pelas obras nem do meio ambiente, pois são também vítimas dessa indústria predatória. Ele destacou a importância da luta contra a privatização e destacou que as energias ditas “renováveis” também têm impactos sobre o meio ambiente e as comunidades e devem, como todas as formas de geração de energia, serem debatidas pelos trabalhadores e não impostas pelo capital.



ONU e Via Campesina debatem economia verde na Cúpula dos Povos

17 de Junho de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Por Cristiane Passos

No final da tarde do último sábado (16), foi promovido um debate entre representantes da Via Campesina e de organizações da sociedade civil com o presidente do PNUMA, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Achim Steiner, sobre economia verde, a proposta da ONU e as reais implicações desta na vida das populações do mundo.

Larissa Parker, advogada da organização Terra de Direitos e membro do coletivo Carta de Belém, inicou o debate questionando o presidente do PNUMA sobre exemplos paupáveis de várias partes do mundo onde a implantação da economia verde se mostra danosa. A financeirização e mercantilização do meio ambiente tornam a natureza um ativo, um título no mercado, ficando sujeito à ação especulativa. Sendo assim, como garantir, dentro da economia verde, a conservação ambiental, já que sua escassez elevará seu valor de mercado?

Larissa questionou, ainda, a engenharia de novas tecnologias propostas pela ONU, como uma forma de manter o colonialismo e o discurso da erradicação da pobreza, sem falar em distribuição de riquezas e de terras. Além disso, esse modelo proposto pela ONU vem a ser uma nova roupagem da tão falada revolução verde, que prometia o fim da fome com as tecnologias desenvolvidas de sementes resistentes e novos pesticidas, e o que se viu foi a continuidade da fome, o endividamento das famílias camponesas que passaram a comprar esses produtos, o envenenamento da comida e, até mesmo, a morte de camponeses e camponesas, principalmente na Índia, desiludidos com essa forma de produção. “As alternativas estão acontecendo, são visíveis, é preciso que a ONU olhe para elas, olhe para os povos que aqui estão reunidos, e para as experiências em vários territórios que aqui estão representados”, finalizou Parker.

Já Edwin Vásquez, representante da Coica, organização indígena da bacia amazônica, do Equador, interpelou o representante da ONU dizendo-lhe o que para eles significaria economia verde. Uma economia verde, com características limpas como querem remeter a ela as Nações Unidas, seriam seus territórios e o que produzem neles, e não as empresas petrolíferas, a produção de carvão ou a mineração. “Para nós, povos indígenas e sem terra, a economia verde não é a cor do dinheiro, é a cor da nossa Amazônia”, completou Vásquez.

Juan Herrera, da Via Campesina, ressaltou a importância da luta dos povos camponeses contra esse modelo proposto, principalmente, para beneficiar os países ricos e o capitalismo. Segundo ele, a Via Campesina vem lutando contra as mudanças climáticas, provocadas pelo modelo de desenvolvimento do capital, e contra a fome, que também é resultado da ganância do mercado e da não distribuição de terras e riquezas. Todo esse trabalho da Via Campesina é contrário às soluções propostas pelo capitalismo, que são sempre elaboradas com a finalidade de que o capital possa sempre crescer mais. Juan aproveitou a ocasião para reforçar o processo de luta da Via Campesina, “nós da Via Campesina vamos continuar nas ruas lutando por todos os povos do mundo. A ONU propõe a massificação do uso de transgênicos e agrotóxicos, e nós lutamos por uma alimentação saudável para o nosso povo, e que todos tenham acesso a ela”.

As interpretações da economia verde segundo a ONU
Segundo Achim Steiner existem muitas interpretações diferentes para economia verde e formas diversas de lidar com ela. Ele afirmou não discordar dos questionamentos e análises feitas até o momento sobre o assunto e assumiu que a ONU também ficou frustrada com o pouco avanço após a Eco 92. De acordo com ele, o pensamento econômico domina todas as nações, pode não dominar em algumas comunidades, mas a ótica das nações é a econômica. Afirmou, ainda, que o relatório do PNUMA como um todo seria uma crítica aos mercados que não conseguiram aplicar o desenvolvimento sustentável, definido como prioridade na Eco 92.

Sobre as novas tecnologias Steiner destacou, “nossa visão é permitir que as pessoas possarm ver o desenvolvimento sustentável como algo diferente do que foi mostrado até agora. As tecnologias de energia renovável e transgênicos são boas ferramentas, mas que foram apropriadas por grandes multinacionais. O caminho foi feito de cima para baixo. As economias não podem ser totalmente controladas por um lado ou por outro, elas devem conviver e não ser dominada somente pelo mercado ou pelos governos. Ao falar da economia, não falamos do modelo do passado, mas do futuro”.

Já Pat Mooney, da organização ETC Group, frisou que os governos estão no lugar errado. Segundo ele, já que é aqui no espaço da Cúpula que a economia se torna realidade, é aqui que estão as discussões importantes.

A crise financeira que tem atingido boa parte do mundo foi causada pelos sistemas financeiros. A crise das mudanças climáticas foi causada pelas tecnologias que destruíram o meio ambeinte. Agora, de acordo com Mooney, querem juntar essas duas crises e buscar uma solução. Crises essas que o próprio mercado criou. “Como a economia verde vai fazer uma nova tecnologia que resolva o que a outra destruiu? Essas tecnologias não são verdes e não funcionam para nós, e quando digo isto não estou dizendo que elas não são operativas, mas que não nos servem”, questionou ele. “Não podemos permitir que esses que destruiram o sistema financeiro, destruam o meio ambiente”, enfatizou.

O representante da CUT, Arthur Henrique, destacou que não se pode aceitar um modelo que mercantiliza os bens comuns. “Precisamos mudar o modelo de produção e consumo no mundo. A própria ONU já admitiu que o modelo não deu certo’, destacou. Os pilares ambiental e social ficaram para último plano nos debates mundiais. O trabalho verde, segundo Arthur, é o trabalho decente, não é apenas combater o trabalho escravo e o trabalho infantil. “Não queremos só sermos ouvidos, queremos discutir juntos as saídas para o desenvolvimentos sustentável”, encerrou ele.

Pablo Solón, da Global South, interpelou Steiner questionando porque ele não estava sendo sincero e não assumiu realmente os interesses do capital sobre a economia verde. Segundo ele, a economia verde é para que os países ricos continuem seu modelo de desenvolvimento, através de políticas compensatórias como as REED’s e o crédito de carbono. E concluiu criticando o modelo econômico preterido pelos países ricos, “o modelo econômico não pode estar embasado na exploração indiscriminada da natureza. Não necessitamos seguir crescendo eternamente, precisamos redistribuir as riquezas e os recursos. Isso a economia verde não diz”.

Assista ao vídeo sobre o debate:



Plenária sobre energia expõe postura leviana de empresas extrativas

17 de Junho de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Plenárias de convergência começam hoje (17) e vão até amanhã (18). Cinco temas centrais serão discutidos para embasar as Assembleias.

Novas alternativas para a geração de energia é assunto recorrente a ser debatido. Aqui na Cúpula não foi diferente: o assunto foi o tema principal na plenária “Energia e indústrias extrativas”, que aconteceu em dois turnos, pela manhã e à tarde. Representantes de organizações e de movimentos sociais da América Latina, América do Norte, Europa e da África expuseram brevemente seus pontos de vista, a fim de debater ideias e propor possíveis soluções.

É impossível falar de novas alternativas sem mencionar as indústrias que se apropriam do processo de extração e transformação da matéria-prima para a geração de energia. Muitas vezes, essas mesmas indústrias, com discursos em prol do desenvolvimento (sustentável), avançam em seus projetos, mas se esquecem de manter as necessidades básicas dos moradores das regiões onde se instalam, ou de cumprir com o papel ambiental que devem seguir.

Problemas estruturais e falsas soluções
Mas qual modelo de desenvolvimento sustentável é esse que não se preocupa com a maneira como a instalação destas empresas é feita? Durante a plenária, discutiu-se muito a questão dessas apropriações que alteram as vidas dos moradores da região, por vezes realocando-os para outros espaços menores e/ou mais distantes da comunidade de origem e do comércio da região. Sem falar, é claro, nos danos sérios ao meio ambiente, como a contaminação dos reservatórios de água, da destruição de biomas e da poluição.

Fabiano Maciça é de Moçambique e discursou na plenária. Ele e seus vizinhos vivem na pele os problemas estruturais causados por grandes empresas que se instalam em áreas onde já havia comunidades estabelecidas, com suas tradições e hábitos.

A Vale, um das maiores mineradoras do mundo, explora carvão e minério em Moçambique. De acordo com o relato de Fabiano, a empresa preocupa-se mais com as atividades exploratórias do que com a alteração na vida daqueles que moram próximo às áreas onde ela exerce suas atividades.

Fabiano conta que a Vale transporta carvão e minério numa distância de 600 km da sua base até o porto. ”Nós, que temos a tradição de comer do lado de fora das nossas casas, já não podemos mais. Além de o comboio passar dentro das nossas propriedades, ainda existe o problema da poluição”, desabafa.

Para o, pior que essa atitude invasiva por parte da empresa é a expropriação. Uma vez expropriados, as vidas dos moradores de uma região mudam completamente. “Nós somos transferidos para espaços muito menores do que a casa que construímos. Ninguém está contra o desenvolvimento. Desenvolvimento, sim. Mas desenvolvimento sustentável”, esclarece.

Mas o que conduz toda essa lógica de degradação? O modelo economico neoloberal e a voracidade do capitalismo, com sua lógica de produção e consumo — que, no fim das contas, o próprio sistema acaba justificando. Gilberto Cervinsky, do Movimento dos Militantes Atingidos por Barragens no Brasil, diz que o capital acelera e pressiona a lógica econômica por novas demandas tecnológicas. Essa lógica, por sua vez, ao invés de libertar, aumenta a exploração sobre os trabalhadores. O sistema econômico faz com que se produza cada vez mais para tornar obsoletas as mercadorias. Isso cria um círculo vicioso e “a energia é um dos polos centrais para essa apropriação”, explica.

Ainda de acordo com Gilberto, o desenvolvimento sustentável defendido na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) é sinônimo de “negócios com alta lucratividade e vida longa”. Tudo isso acabaria se traduzindo na ‘economia verde’, uma justificativa para a intensificação da apropriação da propriedade privada sobre as terras, as reservas minerais, as águas.

Afinal de contas, a “energia é para quê e para quem?”, provoca Gilberto. É preciso que haja a soberania energética para os povos, mas quem acaba por controlá-los são as corporações.

A real solução
Após a exposição dos problemas estruturais e de suas causas, a parte da tarde da Plenária foi dedicada às soluções que os povos propõe aos governos: energias renováveis. Mas, segundo os participantes do debate, é preciso questionar se essa energia sustentável é para todos, já que os bancos, as empresas energéticas, petrolíferas e outros representantes do capital apresentam propostas na Rio+20 oficial justamente sobre essa questão.

As Plenárias de Convergência seguem até amanhã (18). Ao todo são cinco, dedicadas a temas-chaves para a elaboração do documento final da Cúpula dos Povos, que será produzido durante as Assembleias dos Povos: Soberania Alimentar; Energia e indústrias extrativas; Defesa dos bens comuns contra a mercantilização; Direitos, por justiça social e ambiental; Trabalho: por outra economia e novos paradigmas.



Feminismo, elemento central na construção das alternativas à economia verde

16 de Junho de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Compreender que o trabalho que as mulheres realizam é algo central na vida em sociedade e não apenas “ajuda”, “apoio” ou algo “complementar” é fundamental na construção de uma alternativa ao modelo de desenvolvimento capitalista, patriarcal y racista, expresso hoje na chamada economia verde. Esse foi um dos pontos de destaque durante a atividade “Feminismo, agroecologia e soberania alimentar: construindo um novo paradigma de sustentabilidade para a vida humana”, realizada no dia 16, em conjunto pela Marcha Mundial das Mulheres (MMM), Via Campesina (VC), GT de Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), mulheres da Coordenação Andina de Organizações Indígenas (CAOI), Contag, Rede de Economia Feminista (REF), Movimento de Trabalhadoras Rurais do Nordeste (MMTR-NE) e Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar (FBSSAN).

A partir das análises e dos testemunhos das mulheres presentes, concluiu-se que o que estão chamando de economia verde é parte de uma história de mudanças que começaram a acontecer nos anos 1950 na agricultura e que a tornaram cada vez mais artificial. Esse pacote de mudanças, iniciado com a chamada “revolução verde”, se caracteriza pela expansão da monocultura, agroquímicos e, mais recentemente, pelas chamadas biotecnologias, com a produção de sementes artificiais, transgênicas, produzidas em laboratório e que rompem as fronteiras entre as espécies. E esse processo se acelerou ainda mais nos últimos 20 anos, depois da chamada Eco-92, resultando no aumento assustador do poder das grandes corporações e das formas de dominação da natureza.

 

Em todo o mundo as mulheres estão resistindo contra a mercantilização e a artificialização da vida. Nancy Iza, da CAOI, contou como as mulheres indígenas do Equador lutam pelo reconhecimento do seu saber tradicional, responsável pela manutenção e ampliação de um patrimônio de biodiversidade de espécies. Ao mesmo tempo, relatou como isso está desaparecendo com o avanço dos transgênicos e de como as mulheres do campo têm que lidar com novas doenças que resultam do uso de agrotóxicos e têm que ser tratadas com medicamentos industrializados, não naturais, ampliando ainda mais a dependência.

 

Rejane Medeiros, da MMM do Rio Grande do Norte, falou sobre a resistência das mais de 150 famílias contra um projeto de inundação da chapada de Apodi. Nessa área, há mais de 60 anos vem se desenvolvendo uma agricultura familiar baseada na agroecologia, no princípio da soberania alimentar e na convivência com o semi-árido. “O governo diz que o projeto é para erradicar a fome. Isso significaria fortalecer as experiências que já estão construídas aqui. Mas implementar esse projeto de irrigação significa aumentar a fome!”, conta Rejane. O mesmo projeto já implementado em parte do estado do Ceará resultou no aumento da pobreza e da exploração dos trabalhadores que perderam suas terras e tiveram que buscar trabalho nos latifúndios da região ou migrar para as cidades como trabalhadores precários. A unidade dos movimentos sociais da região e o apelo à solidariedade nacional e internacional foi fundamental para parar o projeto, que ainda ameaça a região.

 

Se no passado as populações indígenas, quilombolas e rurais não eram nem consideradas nos projetos, hoje é comum se falar de reconhecimento do saber tradicional. Porém, no campo da empresas isso está associado com a apropriação e a privatização desse saber e o controle dos territórios. Por meio de mecanismos como Redd, por exemplo, empresas privatizam áreas de florestas e indicam a organizações não-governamentais como responsáveis dessas áreas. E as populações que aí viveram tradicionalmente, extraindo algum recurso para construir casas e pequenos barcos, essas sim responsáveis por sua preservação, passam a ser tratadas como criminosas.

 

Adriana Mezadri, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), destacou outra falsa solução apresentada pela economia verde que são os combustíveis supostamente limpos, criados com base na agricultura de cana de açúcar e soja: “são monocultivos que utilizam muito petróleo, muito agrotóxico e muita água, destinados ao consumo externo”. O mesmo se aplica ao cultivo de eucalipto para a produção de papel que açambarca territórios por mais de 10 anos e mata todo o solo e a biodiversidade. “Ficamos somente com a desgraça, tanto social quanto ambiental, desse modelo” que, além do mais, cria dependência do agricultor. Adriana chamou a atenção para a necessidade de pensar em que medida as mulheres do campo realmente têm poder de decisão sobre o que e como produzir, especialmente na agricultura de larga extensão. “Nosso papel é reconhecido, mas precisamos avançar mais para que ultrapasse a idéia de que é apenas ajuda”.

 

As mulheres não estão passivas, são cada vez mais sujeitos políticos dessa história, mobilizam-se em grupos e movimentos de mulheres, constroem redes, participam dos enfrentamentos nas áreas que sofrem esses processos, negociam juntos a governos. O impacto do capitalismo verde é vivido, mas há reação de construção e alternativa ao mesmo tempo. Em todas as falas, foi reafirmada a importância da agroecologia e da possibilidade de alimentar o mundo com outro modelo de produção e consumo alimentar, diferente do modelo dominante, que resulta em impactos sociais e ambientais.

 

A economia verde não compensa

Miriam Nobre, da MMM, chamou atenção para duas grandes questões em debate na conferência oficial Rio+20: a categoria de economia verde como uma resposta à crise econômica e financeira e à situação de pobreza no mundo e a criação de mecanismos e institucionalidade nas ONU correspondentes a economia verde. O principio básico da economia verde é o de compensação, a idéia de que não precisa mudar o modelo de produção e consumo, de que uma empresa pode continuar produzindo mas de que ela pode compensar isso com alteração de alguma parte ou evitando que aconteça poluição em algum outro lugar. “Esse conceito não enfrenta a questão da desigualdade no mundo, fala de combater a pobreza mas não a situação de desigualdade. Isso não funciona mesmo, nos últimos anos houve um processo de aumento de eficiência das empresas, de diminuir a utilização de recursos e de energia para a produção mas com incentivo ao aumento da produção e do consumo, e, com isso, se aumentou a utilização de energia de recursos mas ainda mais por determinados setores da população e determinados setores do mundo”, explica Miriam. Um dilema real que existe é como ampliar o acesso de muitas populações a água potável, energia e alimento de qualidade ao mesmo tempo que conceber a natureza com direitos e não instrumentalizada, a serviço da humanidade. Os operadores dos capitais – bancos, empresas, governos associados – dizem que pra isso são necessárias grandes obras, tecnologias, mas o que acontece concretamente é a diminuição desse acesso. Um exemplo é o caso da água.  “Nós mulheres somos responsabilizadas por buscar água e temos que caminhar vários quilômetros para isso para ter acesso. Na ONU, a solução apresentada para lidar com esse problema foi a de comprometer empresas, privatizando o serviço de acesso de água. Isso só fez aumentar o preço e quem não tinha dinheiro teve acesso a água impedido”. A resistência e a mobilização no mundo inteiro mostra, em particular em Cochabamba, na Bolívia, mostrou que é, sim, possível reverter os processos de privatização da natureza e da vida.



Movimentos sociais e organizações debatem os malefícios dos agrotóxicos

16 de Junho de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Convergência de Comunicação da Cúpula dos Povos – MST

A Via Campesina, em sua primeira atividade na Cúpula dos Povos, debateu a questão dos agrotóxicos no campo, em conjunto com outras organizações, como os Amigos da Terra e a Abrasc o e a Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz). Participaram do debate Cláudia Gerônimo, dos Amigos da Terra da Guatemala, Cléber Folgado, membro da Via Campesina e coordenador nacional da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e pela Vida, Fábia Londres, da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e Lia Giraldo, da Fiocruz.

Cláudia falou de sua experiência pessoal com os agrotóxicos. “Quando estava na universidade de agronomia, tive que aprender a aplicar agrotóxicos. Fui completamente desprotegida, passei mal e um professor me resgatou de lá”. Ela afirma que não é possível garantir que as pessoas se protejam, pois as instruções não são claras, além do fato de muitos camponeses não conseguir ler os rótulos de proteção.

Segundo Cláudia, na Guatemala, assim como no Brasil, os produtores são incentivados pelo governo a utilizar agrotóxicos. “Fiquei perplexa com o fato de que não há incentivo à outra alternativa para produzir. Acredito que devemos adotar o modelo agroecológico, que para mim deve ser amigável ao meio ambiente, sem uso de venenos e resgatando conhecimentos ancestrais de produção. Ao ver que os agricultores são forçados a usar agrotóxicos, sinto que nossos conhecimentos estão sendo tolhidos”.

Cléber, por sua vez, contextualizou o surgimento dos agrotóxicos. “O agrotóxico surgiu como resto da segunda guerra mundial, para resolver os problemas das indústrias bélicas, adaptando o uso de venenos à agricultura, e os governos tiveram um papel fundamental nisso. Por isso os agrotóxicos nunca podem ser chamados de ‘defensivos agrícolas’. As formas que o capitalismo encontra para resolver suas crises é fazer guerra e se apropriar dos bens naturais”.

Exemplo do papel do governo brasileiro no incentivo ao agrotóxico é o crédito agrícola. “Os camponeses na década de 60 tinham que pegar o agrotóxico para receber o crédito. Como é hoje? A mesma coisa”, enfatiza Cléber. O membro da Via Campesina desmentiu vários argumentos muito usados pelo agronegócio e os setores que o apoiam.

O primeiro ‘mito’ é que há formas seguras de usar agrotóxicos. “Há técnicas e proteções que evitam intoxicações agudas, mas a intoxicação ainda acontece. Também é mentira que ‘não podemos produzir com veneno, pois o preço da comida sobe’, pois quem produz 70% da comida neste país é a agricultura familiar”. O argumento de que O camponês também usa veneno é contestado. “É claro que usa, estão obrigados por conta do crédito agrícola. No entanto, o Censo diz que o agronegócio usa 80% de agrotóxicos, e os camponeses, 30%”. Por fim, a questão da Balança comercial, cujo agronegócio é responsável por 30% do PIB, o que corresponde à 151 bilhões de reais. “Para produzir isso, os latifundiários pegam do orçamento público 110 bilhões. Coloca esse dinheiro nas mãos dos camponeses para ver o que fazemos. O agronegócio é economicamente impotente, além dos custos ambientais, que ninguém calcula”.

Cléber também fez um balanço da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. “A Campanha não trouxe nenhuma novidade, pois desde que o agrotóxico existe há lutas contra ele. O mérito da Campanha está emsomar as forças das pessoas que lutam contra os agrotóxicos, para fortificar essa luta, denunciando à sociedade os problemas causados pelo agronegócio. Estamos obtendo resultados, como levar pautas referentes ao tema à mídia burguesa, e a Presidenta Dilma garantiu queira criar um grupo de Política Nacional de Enfrentamento ao Agrotóxico, mas ainda não está nada assinado por ela, então a pressão vai continuar”.

Fábia apontou que a Campanha contra os agrotóxicos é a culminância de trabalhos que vem sendo desenvolvidos a anos por pesquisadores, ONGs e movimentos sociais. “A Campanha foi um acerto político, pois é absolutamente insustentável sermos o primeiro maior consumidor de agrotóxicos no mundo, e a sociedade não pode ficar alheia mais a essa questão”. Ela também reforçou o papel da agroecologia como modelo de desenvolvimento alternativo. “Na Rio92, a agroecologia era apenas uma aposta incerta; hoje,há milhares de experiências de sucesso, com relatórios de organizações como a FAO reconhecendo a importância do modelo para a erradicação da fome”.

Apesar do papel da agroecologia estar reconhecido, é necessário que haja políticas públicas para incentivá-la. Nesse sentido, Flávia denuncia que “está prometido para sair na Rio+20 uma Política Nacional de Agroecologia. No entanto, estamos tendo sinais de que a promessa pode não ser cumprida na Cúpula”.

Dossiê Abrasco – O debate de hoje foi marcado também pelo lançamento da segunda parte do dossiê da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) sobre agrotóxicos. De acordo com Lia, a problemática dos agrotóxicos atravessa todos os segmentos da vida, e não só o campo. Por isso, essa deve ser uma luta da sociedade. “Os inseticidas, que usamos nas cidades para nos proteger de mosquitos, contém as mesmas substâncias que muitos agrotóxicos, mas são vendidos como algo ‘limpo’ para a população”.

O dossiê, segundo Lia, indaga como a sociedade brasileira chegou ao ponto de maior consumidora de agrotóxicos, além de mostrar como o agronegócio depende da aplicação de venenos para continuar crescendo. “O desenvolvimento agrário com acumulação de capital está casado de forma indissociável no país com a utilização de agrotóxicos.



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