Ocupação 29 de Março resiste na mobilização popular
7 de Fevereiro de 2019, 16:29Dois meses depois do incêndio, rede de voluntariado se mantém atuante na reconstrução das moradias e articulação por acesso a políticas públicas nas ocupações
Já faz dois meses desde o dia que moradores de quatro ocupações do bairro Cidade Industrial de Curitiba buscaram diversas formas de denunciar ameaças policiais e pediram ajuda na tentativa de que elas não se concretizassem. Mas um incêndio de fato foi provocado, na noite de 07 de dezembro de 2018, e destruiu a Ocupação 29 de Março.
As ameaças de destruição do local também foram acompanhadas de violência, física e psicológica, por parte de policiais, fardados ou não, contra os moradores também das outras três ocupações, Nova Primavera, Tiradentes e Dona Cida. Movidos pela busca do responsável pela morte de um dos membros da corporação, que morreu baleado na noite anterior, na área das ocupações, tudo o que aconteceu naquelas 24 horas, no âmbito de uma operação policial, está sendo investigado pelo Gaeco, órgão do Ministério Público, e pela corregedoria da PM, para apuração das responsabilidades.
Mas, desde o incêndio, os episódios das mortes (além do policial, outros dois moradores morreram), das ameaças e da violência deixaram de ser a única narrativa para contar a história dos moradores das ocupações, que passaram a viver, nesses dois meses, de certa forma integrados às demais famílias curitibanas através de ações de solidariedade pela reconstrução do local.
Na semana do Natal, os moradores já tinham um projeto topográfico, elaborado por estudantes de arquitetura, urbanismo e geografia vinculados às universidades federais UFPR e UTFPR, prevendo espaços públicos, viários, de saneamento. No local, os destroços do incêndio já haviam sido removidos, também por ações de solidariedade e de coletividade por parte das vítimas, e já havia recursos de financiamento coletivo para que a ONG Teto erguesse as primeiras casas. Os moradores já haviam recebido doações de roupas, móveis, alimentos.
Após essa ação de erguer as primeiras casas, a luta urbana ganhou reforço dos movimentos sociais rurais. Militantes da juventude do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que estavam em Curitiba para um curso de formação no espaço Marielle Franco, construído junto à Vigília Lula Livre, promoveram mutirões de solidariedade na 29 de Março. Os militantes realizaram trabalhos de solidariedade na organização de roupas para doações, na reforma no parquinho das crianças, na construção de casas e também na instalação de banheiros e saneamento básico na comunidade. A mais recente atuação do MST nas ocupações foi na última terça-feira, 05 de fevereiro (foto).
Para além das demandas materiais, diversas organizações sociais realizaram ações no local, muitas pessoas circularam por lá, desde representações políticas, mandatários, de órgãos públicos, como a Defensoria e o MP, para promover ações de cidadania, atuando para restabelecer documentações. A Defensoria Pública, por exemplo, realizou uma posse popular dos 15 novos defensores, como forma de integração junto à comunidade. Eles receberam cinzas do incêndio após a solenidade. Atos de solidariedade reuniram os diversos apoiadores, levando também cultura, música e lazer para essa população tão desassistida de acesso a políticas públicas.
Conforme os dias foram passando, a preocupação dos moradores ia além da reconstrução das moradias e das investigações para apuração das responsabilidades. Um ato público com apoiadores foi realizado no dia 20 de janeiro, um domingo. Lá, membros de diversas representações puderam acompanhar relatos dos coordenadores das quatro ocupações, sobre as principais demandas, todas elas relacionadas à falta de políticas públicas no local, e assinar uma carta-compromisso se continuarem presentes na área.
O Instituto Democracia Popular (IDP), que acompanha os moradores das ocupações em processos judiciais de reintegração e articula ações junto ao poder público, foi a primeira entidade convidada a assinar o documento durante o ato, que formou um Comitê de Apoio.
Uma reunião de apoiadores foi realizada no dia 30 de janeiro, como continuidade dos encontros desse comitê, que devem ser mensais. Hoje, além da segurança jurídica da posse, a preocupação mais premente dos moradores locais é o acesso formal à água e à energia nas ocupações. “O IDP já atua na articulação de demandas de políticas públicas e tanto a Defensoria quanto o MP têm se aproximado da comunidade na intenção de promover a cidadania no local”, afirma a advogada Mariana Auler, coordenadora de Direito à Cidade do IDP.
Para quem quiser ajudar, agora em janeiro diversas entidades estão arrecadando material escolar para as crianças das ocupações. Um dos pontos de arrecadação é o escritório verde do campus Curitiba da UTFPR, localizado na Av Silva Jardim, 807.
Acompanhe aqui todas as publicações do IDP sobre o incêndio na Ocupação 29 de Março
Por Paula Zarth Padilha
Instituto Democracia Popular
Foto: Bruno Alves / Juventude do MST
Juíza declara “imparcialidade” em sentença de Lula alegando informações desencontradas sobre suas próprias férias
6 de Fevereiro de 2019, 22:40Gabriela Hardt afirma que portarias do TRF de novembro de 2018 culminaram na cassação parcial de suas férias, mas diários de justiça registram que a remarcação foi feita ainda em outubro, véspera do primeiro turno
Na extensa sentença condenatória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva divulgada nesta quarta-feira, 06 de fevereiro, a Juíza Federal Substituta Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, utilizou os autos para se manifestar sobre o questionamento da defesa do ex-presidente quanto à legitimidade da magistrada no julgamento e na condução dos interrogatórios.
Hardt registrou entender ser “oportuno me manifestar brevemente acerca de alegações da defesa do réu Luiz Inácio Lula da Silva relativas a minha atuação no feito”, considerando que após ela realizar o interrogatório, no dia 14 de novembro de 2018, a defesa de Lula peticionou no processo questionamento de sua legitimidade, já que portaria do TRF, naquele momento, excluía sua atuação em processos da operação Lava Jato.
Ela alegou que “com o afastamento do magistrado que exercia sua titularidade, deve-se considerar que o juiz federal substituto lotado na mesma unidade, por disposições normativas, exerce a função de substituto automático do juiz federal titular nos termos dispostos na Consolidação Normativa da Corregedoria Regional da 4ª Região, dispensando inclusive a designação por Portaria: Art. 130. A substituição automática dar-se-á entre o Juiz Federal e o Juiz Federal Substituto”.
Em seguida, a juíza declarou que as portarias do TRF que a impediam de atuar foram alteradas em novembro de 2018 pela Corregedoria, “porque não estavam previstos os pedidos de férias e posterior exoneração do cargo formulados pelo ex-juiz federal Sérgio Moro, o que culminou ainda em cassação parcial das férias anteriormente agendadas por esta magistrada no período, por necessidade de serviço”.
Ocorre que a portaria nº 533, de 28 de maio de 2018 (acesse aqui no Diário de Justiça Administrativo nº 120, de 30/05/2018), e a portaria nº 1.034, de 03 de outubro de 2018 (acesse aqui no Diário de Justiça Administrativo nº 235, de 10/10/2018) confrontam essa informação. A de maio registra a marcação de férias pela magistrada no período de 12/11/2018 a 11/12/2018, data que inclui a do depoimento de Lula, feito no dia 14 de novembro. A de outubro já registra a remarcação de férias por Gabriela, estabelecendo novo período de férias a partir de 19 de novembro.
Portaria nº 533, de 28 de maio de 2018:
Portaria nº 1.034, de 03 de outubro de 2018:
Essa remarcação foi realizada nas vésperas do primeiro turno das eleições presidenciais. Ainda na sentença, Gabriela menciona que o pedido de férias e posterior exoneração de Sergio Moro para assumir o Ministério da Justiça “não estavam previstos”.
A cronologia oficial dessa mudança consta a partir de 01 de novembro, feriado do poder judiciário (dia de todos os santos), quando Moro viajou ao Rio de Janeiro para se encontrar com Bolsonaro, já eleito, e declarou que iria deixar a magistratura para entrar no novo governo eleito. Dia 5 de novembro, Moro anunciou que entraria em férias para o período de transição. Suas férias foram publicadas somente na portaria 1151, com data de 06 de novembro, na edição nº260 do diário de justiça administrativo, com data de 16 de novembro, mesma data que o ato de exoneração do juiz foi publicado numa edição extraordinária do informe oficial da Justiça Federal da 4ª região.
Sentença sobre reformas do sítio
Gabriela Hardt condenou o ex-presidente Lula a 12 anos e 11 meses de reclusão em regime fechado, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Nas diversas etapas da sentença, ela descreve trechos que depoimentos e interrogatórios que fez com acusados neste processo penal, por vezes alega, com base na denúncia do Ministério Público Federal, que enquanto presidente teria poder de indicar nomes nas diretorias da Petrobrás, mas para a condenação registra que “Não vislumbro configurado o ato de ofício do Presidente da República”.
Os valores elencados que seriam de origem ilícita e em benefício do ex-presidente e de seus familiares são no montante de R$ 170 mil e R$ 700 mil. A juíza determinou o confisco do sítio e reiterou diversas vezes que a propriedade do terreno não era mérito da ação penal.
A defesa do ex-presidente afirma que a sentença foi baseada exclusivamente em depoimento de colaboração premiada. Leo Pinheiro, da empreiteira OAS, foi considerado como fundamental para esclarecer as denúncias. Sua condenação ficou restrita a um ano e sete meses, em regime semiaberto e possibilidade de recorrer em liberdade. Seu genro foi nomeado pelo governo Bolsonado como presidente da Caixa. Em sentença, Hardt faz uma menção a ele: Nas mensagens de SMS encontradas no celular de Leo Pinheiro, também apreendido em cumprimento a mandado de busca e apreensão expedido por este juízo (evento 2, anexo 358), verificam-se várias menções à Atibaia. Em uma delas ele indaga a existência de aeroporto próximo ao local. Em outras, Leo avisa sua esposa e seu genro que “já está em Atibaia”.
Por Paula Zarth Padilha
Foto: Joka Madruga
Terra Sem Males
Ato em Curitiba de solidariedade às vítimas da Vale em Brumadinho pede reflexão sobre superação para impedir novos crimes nas barragens
6 de Fevereiro de 2019, 0:57Ao som de estilhaços, a representação de um rio de águas azuis que aos poucos é coberto pela lama marrom, tóxica, e depois coberto pela bandeira branca da Vale. Ao som de uma canção à capela, que descreve “corredeiras de sangue inocente”, um militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) pinta em vermelho a palavra “assassina” sobre o símbolo da empresa. As místicas são realizadas em todos os eventos de luta e celebração organizados pelos movimentos sociais que atuam no país. Na noite desta terça-feira, 05 de fevereiro, simbolizou a denúncia, iniciada após um minuto de silêncio, relembrando, até o momento do ato, as 134 vítimas e outras mais de 230 pessoas desaparecidas. Ainda uma estimativa, questionada em quantidade pela população local, o rompimento da barragem de rejeitos de lama de mineração de Brumadinho, ocorrida no dia 25 de janeiro, mudou a história de vida das famílias de mais de 300 pessoas.
“Precisamos da solidariedade, mas precisamos também construir meios de superar, para impedir que aconteça novamente”, afirmou Daiane Machado, do MAB, ao contextualizar informações sobre o crime em Brumadinho. Durante ato de solidariedade realizado em Curitiba, a militante relacionou o risco das barragens à privatização da antiga empresa estatal Vale do Rio Doce, vendida pelo governo FHC, para que as tragédias sejam um impedimento para que outras privatizações ocorram.
Comparando o rompimento em Brumadinho com o ocorrido em Mariana, no ano de 2015, que completou 39 meses nesta mesma noite, Daiane explicou que a quantidade de rejeitos espalhados pela natureza foi menor desta vez: 13 milhões de metros cúbicos; no anterior foram 50 milhões. Mas a falta de segurança, como sirenes ou mesmo um plano de evacuação na área, justamente nas instalações administrativas da Vale, culminou nessa quantidade de vítimas. “A empresa não se preocupa com os trabalhadores”, declarou. Os rejeitos atingiram a sede administrativa e o refeitório da mina, onde trabalhavam aproximadamente 650 pessoas, entre trabalhadores da empresa e terceirizados, casas, sítios, uma pousada. No rompimento de Mariana, foram 19 vítimas fatais, mas diversas localidades arrasadas. “Nenhuma casa foi reconstruída, nenhuma família foi realocada”, denuncia o MAB.
Outra estratégia da Vale, de acordo com os atingidos, é controlar informações. A população ribeirinha não sabe sobre as minas, sobre as licenças; a Vale controla o acesso à água, tenta coibir a organização coletiva dos atingidos. De acordo com dados divulgados pelo MAB, no Brasil existem cerca de 24 mil barragens, incluindo as hidrelétricas, de água e de minério. Dessas, somente 4.510 são submetidas a um plano de segurança. E desse contingente, somente 3% é vistoriado. A barragem que rompeu em Brumadinho teve sua vistoria realizada em 2018. Nela, foi autorizada sua utilização por mais 10 anos; a classificação de risco caiu de 5 para 4, que representa risco menor. Também foi autorizado aumento de capacidade de produção da barragem em mais de 50%, num complexo que representa 2% da extração de minério da Vale. “Esse modelo de barragem é feito porque é mais barato. Nós precisamos pensar em como se organizar para manter as empresas estatais e refletir sobre as consequências da privatização de uma empresa estratégica”, alerta o MAB. “Precisamos construir meios de superar isso e impedir que aconteça novamente”, defendeu Daiane.
O ato de solidariedade às vítimas de Brumadinho teve a presença de representantes de diversas organizações sociais, e se manifestaram Regina Cruz, pela Frente Brasil Popular, Darci Frigo, pela Terra de Direitos, Mikail, pelo Movasse, a vereadora Professora Josete, a deputada estadual Luciana Rafagnin, o deputado estadual Professor Lemos e Angelo Vanhoni, pelo Partido dos Trabalhadores. O repórter fotográfico Joka Madruga, do SindijorPR e do site Terra Sem Males, falou sobre a atuação do MAB em Mariana, que ele acompanhou in loco para registrar as ações logo após o rompimento da barragem em 2015. “O MAB é um importante movimento que auxilia e organiza as famílias atingidas para lutarem por seus direitos”, destacou. O militante Rodrigo Zancanaro falou sobre as famílias atingidas por barragens no Paraná e sobre a atuação do MAB junto a essa população. O ato em Curitiba de solidariedade às vítimas de Brumadinho foi realizado na sede da APP Sindicato na noite de terça-feira, 05 de fevereiro.
Por Paula Zarth Padilha
Foto Joka Madruga
Terra Sem Males
Povos originários protestam contra as mudanças na demarcação de terras
31 de Janeiro de 2019, 21:35Povos indígenas de várias etnias ocuparam as ruas de Curitiba, nesta quinta-feira (31), para protestar contra as mudanças na demarcação de terras e para exigir que o sangue dos indígenas deixe de ser derramado.
A APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, organizou em várias regiões do Brasil uma mobilização com o lema “Sangue indígena: nenhuma gota a mais!”
A fotógrafa Giorgia Prates esteve lá e registrou este momento de luta dos povos originários, que estão sendo atacados por madeireiros, latifundiários e políticos de direita.
Clique aqui para ler a nota completa da APIB.
Fotos: Giorgia Prates
Familiares das vítimas se organizam coletivamente para acompanhar desdobramentos do rompimento de barragens em Brumadinho
28 de Janeiro de 2019, 15:51Com base na longa espera após rompimento em Mariana, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) articula enfrentamento popular para denunciar descaso com familiares de vítimas
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que acompanha os atingidos pelo rompimento da barragem de Mariana há três anos, que ocorreu dia 05 de novembro de 2015, articula em Brumadinho o enfrentamento popular em apoio às vítimas desse novo crime ambiental protagonizado novamente pela mineração.
De acordo com dados oficiais, até o momento existem 60 vítimas fatais e 292 pessoas desaparecidas após o rompimento da barragem de Córrego da Mina de Feijão, que aconteceu na última sexta-feira (25) e despejou aproximadamente 12 milhões de m³ de rejeito de minério, que ainda se alastra no trajeto do rio Paraupeba e pode chegar ao São Francisco.
O MAB denuncia que o número de vítimas pode ser ainda maior, considerando que familiares de desaparecidos que não eram trabalhadores da Vale não encontram seus nomes nas listas oficiais divulgadas pela empresa, que foi privatizada no governo FHC.
O enfrentamento popular, articulado pelo MAB, começou a ser organizado em reunião no último domingo, 27 de janeiro, na Paróquia católica de São Sebastião, em Brumadinho, com a presença do prefeito, da defensoria pública, da igreja e representantes dos movimentos sociais, que questionam decreto do governo federal que exclui a participação popular da sociedade civil e também de familiares as vítimas. O comitê definido pelo governo federal tem em sua composição somente ministérios.
O MAB também organizou brigadas voluntárias que atuam na área na tentativa de encontrar sobreviventes e então acionar as equipes de socorristas para o resgate.
Por Paula Zarth Padilha
Com informações do MAB
Foto: Isis Medeiros
Escola zero à esquerda
28 de Janeiro de 2019, 14:34Eu sou assim porque sofri doutrinação quando estava na escola.
Minha melhor lembrança foi de um dia, já no ensino médio, em que eu e mais dois colegas – hoje um deles é uma espécie de neonazi, o outro publicitário – flagramos a professora de química indo embora ouvindo no toca-fitas do Uno Mille “Outro tijolo no muro”, do Rogério Águas. Demos risada, porque conhecíamos a letra da música. A professora também riu, quando falamos com ela, no dia seguinte. Ela era legal, apesar de ser de exatas.
Eu ia mal em exatas. Mas ia bem em humanas.
Falando nisso, mais ou menos na mesma época, o nosso professor de história – sempre esses de história – veio com outra coisa que me marcou, mas em outro sentido: disse com todas as letras que aquele cara de barba, cabelo comprido e boina com estrelinha era muito perigoso. Absolutamente perigoso. E quem usava camiseta com a cara dele era imbecil. Havia uma colega de turma que estava usando uma camiseta dessas.
A isso que o meu professor de história falou, claro, se juntavam outras pregações – de vários outros professores, e também de pessoas da direção – sobre o quanto era importante passar no vestibular de uma boa universidade, para se formar como pessoa de bem nesse mundão de “malvadeza neoliberal”, como dizia Paulo Freire – e como pareciam fazer questão de não dizer os meus educadores. A ideia, nesse respeitável colégio de classe média alta, era simples: você precisa conseguir a vaga, para fazer jus ao investimento dos seus pais. Quem consegue a vaga, depois consegue o emprego. Há que fazer jus ao mérito, porque só se dá bem quem tem o que tem, e é assim que as coisas são.
Enfim, escola muitas vezes é espaço de doutrinação capitalista.
Apesar de nunca ter me dado bem em exatas – só sei fazer aquela conta pra saber se está valendo mais a pena abastecer com etanol ou gasolina – virei mais ou menos aquilo que se costuma chamar de “adulto”.
Daí eu constituí família. Porque eu sou dotado de sistema reprodutor.
E, a partir daí, pensei seriamente, junto com minha companheira, se valia a pena colocarmos as crianças na escola. Ou melhor, se era justo, e válido, encampar a batalha por manter as crianças fora da escola. Ainda não há lei que regule o que fazer com crianças, nesse caso. E isso gera um longo debate – cheio de tabus, tanto à esquerda quanto à direita: como essa lei seria e quem a redigiria? E, mais importante: como ela afetaria as diferentes classes sociais?
Andamos nos informando a respeito, com pais que mantinham os filhos fora da escola. Vimos que é bem recorrente uma dúvida que tínhamos: já que não vou botar meu filho no ensino institucional, como vou suprir as demandas intelectuais dele, ou seja, como vou prover à criança “o lado bom” do ensino? E o que obtivemos como uma espécie de quase resposta foi que, assim como existem trocentos modelos de escola, afinal, existem diversas formas de não-escolarizar. Da mesma forma, vimos que existem duas brigas: uma pelo direito a não-escolarizar, e outra pelo direito de escolarizar em casa, simplesmente. Fora isso, vimos dois extremos nesse grupo tão difuso, dos que querem ter o direito de educar fora da escola.
Primeiro descobrimos os pais ultraconservadores que acreditam em criacionismo, por exemplo. Não devem estar pensando em educação livre, José Pacheco e tudo mais: provavelmente vão contratar professores particulares, pra educação domiciliar. É uma galera que em geral curte o Escola Sem Partido. Mas não querem seus filhos na escola, de qualquer forma. Criticam Paulo Freire sem sequer ter lido metade do verbete sobre ele na Uiquipédia – o que é engraçado, já que estão adotando certa postura crítica frente ao ensino institucionalizado (a meu ver equivocada, claro, mas que não deixa de ser coisa que o educador sempre defendeu). Enfim, nesse caso, o da educação domiciliar, que difere muito da não-escolarização, existe conteúdo pedagógico dado por outras pessoas que não os pais. Espera-se, aí, que a socialização dessas crianças possa se dar em ambiente religioso. E coisa e tal.
No outro lado, tem uma galera que prega um tipo de liberdade bem difuso e irrestrito, em todos os campos da vida. Um tipo de liberdade muitas vezes definido como radical, mas que, talvez, quem sabe, seus adeptos não saibam exatamente como definir melhor, em termos práticos, quero dizer. Que fazer nesse caso, a não ser não fazer nada? Então, quando perguntados a respeito, normalmente lançam mão de alguma tirada poética: “Não escolarizo meus filhos porque a vida é como a água movendo as pedrinhas do riacho”. Ok, não discordo. Só tenho medo que o rio esteja poluído. Conhecemos gente assim, que se retirou das grandes cidades, pra viver na natureza, sem professores, sem vizinhos, sem trânsito, sem estímulos consumistas (tenta-se, né?), sem agrotóxicos na comida – mas também sem museus, sem bibliotecas, sem manifestação nas ruas, sem planetários, e talvez mesmo sem simples reuniões com outras pessoas. Nesses casos acho que não existe preocupação com conteúdo: o conteúdo é ir pro rio catar pedrinhas. Aí não há educação domiciliar porque o domicílio, no caso, é o mundo. E por aí vai.
Tem gente aí, dentro desses dois grupos que citei, que não quer se socializar, ou quer se socializar só um pouco, em encontros eventuais – e com outras famílias não-escolarizadas de cabeça mais ou menos igual. E tem gente aí que não está preocupada com o futuro profissional da piazada. Mesmo a partir do momento em que estamos falando de crianças que, em tese, ainda vão sentir os efeitos da reforma trabalhista de 2017.
O que ocorre é que, no fim, acho que tanto nós, aqui, em casa, quanto os criacionistas e os das pedrinhas do riacho temos a percepção de que nenhum de nós, pais, vai dar conta de “ensinar” nada. Tratar-se-ia, então, de darmos a nossos filhos possibilidades de relações com o mundo outras do que aquelas previstas institucionalmente. Não preciso dizer o quanto isso é subjetivo. E vago. E não preciso dizer que somos, em maioria, brancos e de classe média pra alta – mesmo quem aí não pode ser considerado “elite” no sentido econômico, pode muito bem ser “elite” no sentido intelectual.
De qualquer forma, algumas coisas são importantes aí nesse debate, agora que o governo via Uatzáp começou, em 2019. A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos parece estar interessada em liberar a prática rápido, com regulação afinada somente com os argumentos do primeiro grupo que citei, acima. A ANED, a Associação Nacional de Educação Domiciliar, gosta muito dessa senhora, ao contrário de muita gente na Holanda.
Não preciso dizer que parte dos que são a favor da não-escolarização, parte da galera das pedrinhas no riacho, rejeita o rumo que as coisas estão tomando. Em silenciamento e surdez, essa discrepância entre os extremos não-escolarizados é só mais um Fla x Flu.
Enquanto isso, boa parte da esquerda parece disposta a encarar o fim da obrigatoriedade da presença infantil nas escolas como uma tentativa de ataque ao ensino público, alegando que a contribuição de pais e cuidadores sobrecarregados por suas jornadas de trabalhos jamais se daria conforme certas pessoas idealizam. E é isso mesmo. O problema é que é isso também. Sinceramente não sei se há esquerda a favor da prática. Porque, afinal, se você defende que criança esteja fora da escola (de qualquer forma que isso possa acontecer), só pode ser um individualista incurável. Mas penso que poderia ser uma boa, se houvesse. Porque, por mais que eu reaja automaticamente com um “ora, vai tomar no **” toda vez que dou de cara com algo que a ministra supracitada diga, por achar que ela nem deveria ser ministra, deixar de imiscuir-se na questão da educação fora da escola, pensando-se as formas com que isso pudesse ocorrer legalmente – com a devida fiscalização estatal – talvez seja justamente o que está jogando a pauta do dito homeschooling – que é diferente da não-escolarização – no colo das pessoas que pensam como a ministra. Ou seja: é a galera que acreditou na história da mamadeira de pinto que está redigindo a medida provisória que trata do ensino domiciliar. Desse jeito, o texto a regulamentar a prática realmente vai dar brecha para que as crianças vendendo bala no sinal, ou artesanato indígena nas rodovias, sejam colocadas no mesmo balaio que a piazada classe média KKK, e estejam nessa por opção dos pais, oficialmente.
Outra coisa que eu não sei é dar a minha opinião a respeito do que é melhor pras crianças, em geral. Tipo a Glória Pires, mesmo. Porque é complexo demais. Cada caso é um caso e eu posso muito bem estar errando feio com as minhas próprias filhas. Mas acho legal frisar esses pontos aí:
1) Não há evidência empírica documentada de que a educação domiciliar seja ineficaz do ponto de vista do desenvolvimento intelectual, nem necessariamente nociva do ponto de vista da socialização, que pode se dar de mil formas, apesar disso continuar servindo de argumento aos pró-escola custe o que custar;
2) As pessoas se educam fora das instituições, também. Pra mal e pra bem;
3) Querer deixar as crianças fora da escola não significa necessariamente querer uma educação domiciliar sem regulamentação;
4) O criacionismo é uma merda, e manter uma obrigatoriedade não o combaterá. Aliás, ele deve ser combatido? O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos da ONU, do qual o Brasil é signatário, talvez indique que não;
5) Somos uma sociedade em mudança, com demandas flutuantes, e é natural que a legislação reconheça isso. A Lei de Diretrizes e Bases e as disposições sobre a educação na Constituição pretendem defender a educação pública, de qualidade. Isso, imagino, TODOS QUEREMOS. Ou quase. Mas permitir que se eduque fora da escola não significa necessariamente tirar responsabilidades do Estado. Não entendi até agora esse raciocínio como outra coisa que não presunção e medo – mas posso estar errado, me ajudem.
O Brasil é signatário de tratados internacionais, como esse troço aí da ONU que eu escrevi, onde o país se responsabiliza pela educação. E os desrespeita. Desrespeita também o que o Paulo Freire escreveu. O que fazer pra que a escola – pública ou privada – não seja depósito de criança?
Se a obrigatoriedade do ensino institucional é mesmo esse barbante tentando impedir que um elefante caia num penhasco, bom, talvez o problema não esteja no barbante, mas no tamanho do elefante, na qualidade e na inclinação do solo onde ele desliza e na proximidade do penhasco.
Sei que eles querem enfraquecer mais ainda a educação pública. Mas, talvez, ao invés de se manter uma inflexibilidade pra uma parte da sociedade civil, seja hora de nos perguntarmos por que isso necessariamente reduziria recursos para a educação pública. Existem estratégias que poderiam gerar garantias, nesse sentido? Talvez um bom começo seja nos perguntarmos por que o governo gasta mais lavando carros oficiais da Câmara do que investindo em museus. E, aí é que vai a parte difícil, tentar mexer nisso.
A nossa filha que está em idade escolar, aliás, está matriculada numa instituição de ensino presencial. Ela gosta. Ainda não foi zoada por ir pra aula com camisa alguma. As coisas são infinitamente mais complexas do que se imagina.
Por Bruno Brasil, jornalista curitibano radicado no Rio de Janeiro, escreve para o Terra Sem Males na coluna “entre aspas”
Foto: Arquivo pessoal
“Nossa existência agride a sociedade”
28 de Janeiro de 2019, 11:19Foi a primeira grande campanha idealizada pela própria população transgênera. Desde então conquistas importantes foram obtidas, sendo a principal delas o direito garantido por lei de alterarem o prenome (nome civil) e gênero (masculino e feminino) no registro civil, sem a necessidade de redesignação de sexo ou de autorização judicial. Esse direito foi obtido em março do ano passado, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu essa possibilidade no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275.
Essa decisão histórica contou com a participação da advogada paranaense Gisele Alessandra Schmidt e Silva, a primeira transexual brasileira a subir à tribuna da Suprema Corte do país, em junho de 2017. “Estou aqui perante Vossas Excelências hoje não apenas por mim, mas sim por toda uma população de pessoas que ainda sofre imenso constrangimento e têm sua dignidade violada diariamente. Negar a uma pessoa o direito ao nome, à expressão de sua identidade, é negar o direito de existir. Requer-se a vossas excelências que não nos neguem esse direito”, disse Gisele na ocasião representando o Grupo Dignidade.
Um ano depois de sustentar a fala na Suprema Corte sobre os direitos das pessoas trans, Gisele foi uma das palestrantes da Brazil Conference At Harvard & MIT, nos Estados Unidos. O convite partiu do ministro do STF, Luis Roberto Barroso.
Bacharel em Direito pela Unicuritiba, advogada criminalista e militante dos Direitos Humanos da população LGBTI, Gisele concedeu entrevista ao Porém, onde falou dessas experiências, do desafio de assumir uma identidade diferente do sexo biológico, de sua transição na época da faculdade e da realidade de transexuais, o segmento populacional que carrega o maior estigma e preconceito dentro das identidades LGBTI. Consequentemente, o segmento que sofre maior violência e discriminação. “O Brasil é o país que mais assassina pessoas trans no mundo e nossa expectativa de vida, que antes era de 35 anos, caiu para 27”, comenta.
Defensora do Garantismo Penal, base teórica do Direito Penal fundamentado no viés da redução dos danos, das garantias individuais e respeito à Constituição, a paranaense criticou aqueles que o associam à impunidade. Ela confessou decepção com recentes declarações do ministro Luis Roberto Barroso relativas ao tema. Confira na entrevista.
Porém.net: Como foi sua transição?
Gisele: Desde muito cedo eu soube que não me identificava com o gênero que nasci. Durante muitos anos de minha vida isso ficou dentro do armário. Eu usei uma máscara, representei um papel, porque no meu íntimo eu sabia as consequências disso, sejam profissionais ou no seio da família. Quando eu resolvi me assumir e fazer a transição, já na época da faculdade, minha família parou de falar comigo, perdi todo apoio. A minha sorte é que eu já tinha a faculdade de Direito e pensei: agora vou ter que fazer valer esse curso. Estudei, passei no exame da Ordem [OAB] com a média de 9.55 e de lá para cá comecei a advogar. Paguei um preço, mas por outro lado não me arrependo nenhum pouco de ter feito a transição e tirado esse peso das minhas costas. Eu representava o papel do Marcus (nome de batismo), um papel que não era eu.
Porém.net: E daí partiu o convite para palestrar em Harvard?
Gisele: Isso, o convite partiu do ministro [Luis Roberto] Barroso, para compor um painel com ele neste evento.
Porém.net: Por falar no ministro Barroso, ele fez declarações ao jornal Zero Hora, nos últimos dias de 2018, criticando o Garantismo Penal e acusando seus defensores de serem “tolerantes” com o “quadro geral” de impunidade no país. O que achou dessas afirmações?
Gisele: Eu conheci pessoalmente o Barroso, então por isso essa opinião dele me surpreendeu. Não sei se ele não estava num bom momento, mas confesso que fiquei surpresa.
Porém.net: E a que credita essas críticas ao Garantismo Penal e o porque é importante defendê-lo?
Gisele: O Garantismo Penal não é passar mão na cabeça de bandido ou legitimar atos ilícitos, mas sim preservar as garantias legais da Constituição. Preservar que se tenha o devido processo legal, que a pena não seja exacerbada, que não haja tortura, que não tenha crueldade. Isso é defender o direito de todos nós, não especificamente da pessoa ali detida, pois o garantismo penal serve para que você amanhã ou depois não tenha sua casa invadida por policiais, você não seja preso sob tortura. Para que não seja preso sem o mínimo de provas contra você. É uma garantia para toda sociedade. Essa semana tivemos um caso de uma pessoa negra ficar detida uma semana e depois ser constatado que ela não tinha nada a ver com o crime. Imagina o trauma de você ser privado de sua liberdade sem ter culpa.
Porém.net: Esse cenário de poder abusivo do estado e ausência de liberdades individuais se potencializa nas populações marginalizadas. Neste sentido como afeta a população trans?
Gisele A gente costuma falar que se acontecer qualquer coisa, a primeira culpa recai logo na travesti. Elas estão na rua fazendo programa e se acontece qualquer coisa pelas redondezas a culpa vai cair sobre elas. A população trans é marginalizada, ela é praticamente empurrada à marginalização, para atividades como a prostituição, que é um ambiente que você entra em contato com um mundo que não é legal. E obviamente você acaba sendo uma vítima primordial dessa ausência de garantias constitucionais.
Porém.net: E a situação da população trans apenada e encarcerada?
Gisele: O sistema penitenciário brasileiro como um todo e, especificamente no Paraná, não conta com dados sobre a população trans presa. Estou desenvolvendo um projeto, junto a 12ª Vara Criminal e o Transgrupo Marcela Prado, de fazer um levantamento de todo o sistema carcerário no Paraná para verificar quem são as pessoas trans encarceradas e saber se elas estão tendo a dignidade delas preservadas nestes espaços. Se elas não estão sendo colocadas em celas junto com o gênero oposto ao qual se identificam. Imagine uma mulher trans colocada numa cela com homens. Ali provavelmente ela será estuprada todos os dias, várias vezes ao dia. Há violações graves de direitos humanos. Sabemos de casos de trans que são obrigadas a tomar banho de sol sem camisa, cabelo que é cortado, não tem acesso aos hormônios, além dos estupros. No caso de um homem trans, aquela pessoa que nasceu fêmea mas fez a transição pra o gênero masculino, acontece casos de estupro corretivo e coletivo. Corretivo no sentido: vou te estuprar para você aprender a ser mulher. Por isso estamos com esse projeto para saber quem é a população trans presa e buscar garantir a dignidade dessas pessoas.
Porém.net: E quais as principais demandas em relação a políticas públicas à população trans?
Gisele: Tivemos avanços significativos, mas podemos estar diante de uma fase de retrocessos. Aqui no Paraná, por exemplo, temos o CPATT – Centro de Pesquisa e Atendimento para Travestis e Transexuais – que foi inaugurado em 2014 e que fornece tratamento médico, fornece hormônio, atendimento psicológico. Porém é um órgão que com a mudança de governo a gente não sabe qual será o futuro. A coordenadora era a Carla Amaral, que é uma mulher trans, mas foi exonerada com o novo governo e não sabemos o que será deste órgão. Como não é uma política permanente então a gente não sabe se vai continuar, quem irá coordenar, quem serão os médicos, se irão continuar a fornecer hormônio. Houve avanços, mas ainda há uma grande ausência de políticas de preservação das pessoas trans no ambiente escolar, que é um ambiente inóspito a população trans. Políticas para que essas pessoas tenham capacitação para depois serem inseridas no mercado de trabalho com dignidade e não apenas em empregos precários.
Porém.net: No âmbito federal, como avalia o novo governo e, especificamente, a nomeação da pastora Damares Alves como ministra da Família, Mulher e Direitos Humanos. O que isso representa para a população trans?
Gisele: Acho esse governo completamente equivocado. Em relação a ministra acho que é uma pessoa que legitima discursos de ódio e preconceito. Veja essa declaração sobre a Holanda, é uma vergonha para o Brasil ter uma pessoa dessa no poder. Infelizmente as igrejas fundamentalistas dominam as pessoas pelo medo e essa ministra é a representação disso. Nada que ela fala tem coerência: é a história da menina que veste rosa e menino azul, é o Jesus na goibeira, é masturbação de crianças na Holanda. Uma pessoa que está no comando de um ministério não pode falar essas coisas. Isso não pode ser motivo de piadas, isso precisa ser repudiado. É um cenário preocupante.
Porém.net: Para terminar, a marginalização e preconceito à população trans passa somente pela “questão sexual”? O que incomoda tanto a sociedade?
Gisele: É uma boa pergunta que sinceramente não tenho uma resposta conclusiva. Mas acho que a sociedade ainda não está preparada para lidar com o que é diferente. A nossa existência, de alguma maneira, agride a sociedade. E no Brasil isso está aliado com a questão da religião, com a questão do fundamentalismo, ao ponto de falarem que a gente tem “possessão demoníaca”. Há toda uma cultura negativa e de ódio construída em cima da população trans.
Por Júlio Carignano, com fotos de Gibran Mendes
Gaeco e Corregedoria da PM cumprem mandados em investigação sobre mortes e incêndio na Ocupação 29 de Março em Curitiba
18 de Janeiro de 2019, 15:58De acordo com informações divulgadas pelo Ministério Público do Paraná, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e a Corregedoria da Polícia Militar do Paraná cumpriram dez mandados de busca e apreensão na manhã desta sexta-feira, 18 de janeiro, nas cidades de Curitiba, Campo Largo, Guaratuba e Piraquara como parte das investigações do incêndio na Ocupação 29 de Março.
O procurador de Justiça e coordenador estadual do Gaeco, Leonir Batisti, falou que dois desses mandados foram solicitados pela Corregedoria da Polícia Militar, que investiga as “transgressões de caráter militar dos policiais” que atuavam na área das ocupações da CIC nos dias 06 e 07 de dezembro de 2018.
Segundo Batisti, o Gaeco investiga os três homicídios (do policial antes das ações da PM na área e de dois moradores na noite do incêndio) e também uma tentativa de homicídio contra um motorista de aplicativo de transporte. O Gaeco também é o responsável pelas investigações do incêndio e solicitou os outro oito mandados, que foram deferidos pela 1ª Vara do Tribunal do Júri de Curitiba.
O Instituto Democracia Popular acompanha as denúncias dos moradores das ocupações desde o dia 07 de dezembro, antes do incêndio na 29 de Março. Confira as matérias publicadas:
07/12/2018 – Famílias das ocupações da CIC estão assustadas com ação da PM
08/12/2018 – Após denúncias de moradores, incêndio consome ocupações na CIC
08/12/2018 – Moradores acusam os policiais de terem iniciado o incêndio e de terem executado a tiros a testemunha
08/12/2018 – Moradores vasculham escombros procurando desaparecidos após incêndio na Ocupação 29 de Março
10/12/2018 – Confira depoimentos de moradores da Ocupação 29 de Março após incêndio
11/12/2018 – Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Paraná recebe moradores da Ocupação 29 de março
14/12/2018 – Voluntários atuam para promover planejamento urbano na reconstrução das moradias da Ocupação 29 de Março
18/12/2018 – Uma semana após incêndio que destruiu ocupação, moradores limpam terreno e iniciam reconstrução da comunidade
19/12/2018 – Organizações brasileiras denunciam para organismos internacionais a violência contra a Ocupação 29 de Março
11/01/2019 – Moradores da Ocupação 29 de Março denunciam novas ameaças recebidas em ações policiais no local
Por Paula Zarth Padilha, Instituto Democracia Popular
Foto: Joka Madruga/Terra Sem Males
Prefeitura de Curitiba ameaça blocos de pré-carnaval e restringe regras para artistas de rua
15 de Janeiro de 2019, 19:10Centenas de foliões ocuparam as ruas centrais de Curitiba no último fim de semana, com atividades musicais carnavalescas populares de sexta a domingo promovidas por diversos blocos de carnaval.
A novidade para o Carnaval 2019 é a tentativa do prefeito Rafael Greca de inviabilizar manifestações culturais que não tenham vinculação com o Carnaval oficial da cidade, coordenado por uma comissão da Fundação Cultural de Curitiba.
De acordo com matéria institucional divulgada pela Prefeitura, uma reunião na última segunda-feira, 14 de janeiro, mobilizou prefeito e diversas secretarias municipais e a partir desse momento não serão admitidos eventos convocados pela internet que não fizerem requerimento oficial.
O Carnaval 2019 será dia 05 de março e, oficialmente, a Fundação Cultural tem programação de pré-carnaval somente para a semana de 12 a 16 de fevereiro.
Na prática, o pré-carnaval já tomou as ruas de Curitiba com fantasias desde a primeira semana de janeiro, com a estreia da Bloca Ela Pode, Ela Vai e do Bloco Brasilidades, no dia 6. No último fim de semana, diversos eventos de facebook divulgavam a realização de atividades pré-carnavalescas por blocos de rua em Curitiba, como a Bloca Ela pode, Ela vai; Bloca Saí do Armário e me dei bem; Siri Bloco; Bloco 10afinados 2019.
Outras festas com blocos de carnaval foram realizadas em bares fechados, como o Fui Pará e o Caí no Cavalo Babão. E a programação não para: o Bloco Segura o Curitiba e Aguenta o Baculejo tem atividade agendada para 03 de fevereiro; Garibaldis e Sacis vai desfilar a partir de 25 de janeiro.
Em resposta às manifestações populares, a Prefeitura divulgou que o pré-carnaval de rua é vinculado a edital da FCC e quem ficou de fora deve fazer uma requisição formal e obedecer a critérios, como disponibilização de banheiro químico, por exemplo.
Os editais para o pré-carnaval de rua foram estabelecidos na gestão Greca, tiveram início no Carnaval do ano passado. Para 2019, somente quatro blocos de carnaval foram contemplados por edital pela FCC para atividades de pré-carnaval, e que só serão realizadas em fevereiro: Bloco Fui Pará; Bloco Carnavalesco Púrpura; Bloco Carnavalesco Fogosa; e Bloco Boêmios e Madames.
O calendário oficial do Carnaval 2019 na cidade também tem outra exigência para os blocos de pré-carnaval tomarem as ruas: a presença do Rei Momo, da Rainha e das Princesas da folia, que serão eleitos em concurso no dia 07 de fevereiro. Uma curiosidade do edital é a exigência do candidato a Rei Momo ser do “sexo masculino” e da Rainha e Princesas serem do “sexo feminino”.
No momento, a única atividade carnavalesca permitida pela Prefeitura são ensaios abertos do grupo Afoxé 2019, que são realizados toda terça-feira, às 19 horas, no Quintal da Maria (Rua Jaime Reis, 366, São Francisco).
Artistas de rua protestam contra decreto do prefeito
Outra ação nesta semana do prefeito Rafael Greca foi a publicação de um decreto que inviabiliza a ocupação das ruas por artistas populares realizarem suas manifestações culturais. A partir desse decreto, os artistas de rua devem preencher um cadastro online disponibilizado pela Fundação Cultural de Curitiba para pleitear autorização. Os artistas terão que respeitar um rodízio e poderão permanecer em poucos espaços da cidade. Um protesto foi realizado nesta terça-feira (15).
Foto: Giorgia Prates
Texto: Paula Zarth Padilha
Primeira medida do governo Bolsonaro extingue Ministério do Trabalho
10 de Janeiro de 2019, 12:29MP 870, publicada no dia 01 de janeiro, cumpre promessa que presidente eleito fez durante transição e Ministério do Trabalho não existe mais
Por Paula Zarth Padilha
Foto: José Cruz/Agência Brasil
A Medida Provisória 870/2019 foi o primeiro documento oficial assinado por Jair Bolsonaro como Presidente da República, ainda no dia 01 de janeiro de 2019. A MP tem força de lei e realocou atividades ministeriais, como as desempenhadas pelo Ministério do Trabalho.
As responsabilidades sobre geração de emprego e renda e de apoio ao trabalhador; da “modernização” das relações de trabalho; de fiscalização e aplicações de sanções; política salarial; formação e desenvolvimento profissional; segurança e saúde no trabalho; e regulação profissional foram destinadas ao Ministério da Economia, numa “Secretaria Especial” de Trabalho, dividindo status com a da Previdência. Outros três Conselhos relacionados ao trabalho são parte desta estrutura: Conselho Curador do FGTS, Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o Conselho Nacional do Trabalho, este último será tripartite, com participação dos trabalhadores e dos empregadores junto ao governo na composição.
O planejamento estratégico para políticas públicas, da Previdência Social e também a complementar privada estão sob responsabilidade desse Ministério da Economia. Um Conselho Nacional de Previdência Complementar, uma Câmara de Recursos da Previdência Complementar, um Conselho Nacional da Previdência e um Conselho de Recursos da Previdência Social (nesta ordem) também são parte da nova estrutura desse que está sendo chamado de Super-Ministério.
A MP 870/2019 também estabeleceu para o Ministério da Economia uma Secretaria Especial para assuntos sobre empregabilidade e seu enfoque é em “Produtividade, Emprego e Competitividade”.
Já a competência sobre o registro sindical, que anteriormente era atribuição do Ministério do Trabalho, foi redirecionada para o Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Direito à Cidade e regularização fundiária
Em seu artigo 19, a MP 870 define quais são os 22 ministérios atuais e nenhum deles faz referência às relações trabalhistas ou previdenciárias. Também não existe mais pasta ministerial para Cultura, Esporte, Desenvolvimento Social. As questões sobre regularização fundiária foram incorporadas ao novo Ministério da Cidadania, que deverá atuar junto ao da Agricultura especificamente junto aos quilombos.
Ações sobre política nacional de desenvolvimento urbano, de habitação, mobilidade e saneamento, que até 2016 eram parte do Ministério das Cidades, foram realocadas para o Ministério do Desenvolvimento Regional, em conjunto com o Ministério da Defesa. Esse ministério ficará responsável pelas diretrizes e critérios na alocação de recursos do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e das metas de programas de habitação popular com recursos do Fundo de Garantia (FGTS) e de recursos oriundos de outros subsídios para a moradia.
Confira quais são os novos ministérios do país conforme definido pela MP:
Art. 19. Os Ministérios são os seguintes:
I – da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;
II – da Cidadania;
III – da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações;
IV – da Defesa;
V – do Desenvolvimento Regional;
VI – da Economia;
VII – da Educação;
VIII – da Infraestrutura;
IX – da Justiça e Segurança Pública;
X – do Meio Ambiente;
XI – de Minas e Energia;
XII – da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos;
XIII – das Relações Exteriores;
XIV – da Saúde;
XV – do Turismo; e
XVI – a Controladoria-Geral da União.