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Blog do damirso

3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.

Prêmio Nobel e o Complexo de Vira-latas

21 de Julho de 2014, 9:29, por Daniel Miranda Soares - 0sem comentários ainda

Prêmio Nobel e o Complexo de Vira-latas
      Ronaldo, o fenômeno, ex-craque da seleção, que  estava com vergonha do Brasil na Copa do Mundo, criticou mais o Brasil em sua conta na rede social postando uma foto em que aparece um placar : “Alemanha 102 x 0 Brasil” em alusão aos prêmios Nobel recebidos pelo país. Na imagem ainda exibe a pergunta: “E você acha que 7 x 1 foi goleada?”.  Muitos brasileiros, como Ronaldo,  exibem seu complexo de vira-latas, sentindo-se envergonhados por que o Brasil nunca ganhou um Prêmio Nobel. E a postagem de Ronaldo não foi bem vista por seus seguidores. Diversos deles criticaram o ex-jogador e também ironizaram suas declarações.

A questão no entanto é mais profunda - na verdade é uma questão de desenvolvimento econômico e social. Países mais desenvolvidos, basearam seu próprio desenvolvimento econômico em pesquisas científicas. Estes avanços científicos os colocaram na frente da corrida industrial. Os países subdesenvolvidos sempre estiveram à margem desta corrida devido ao comércio internacional que os impediam de avançar, colocando-os sempre como fornecedores de matérias primas. Devido a este processo os países do Primeiro Mundo receberam quase todos os prêmios Nobel, restando muito pouco aos países do Terceiro Mundo. Enquanto os EUA receberam 347 prêmios, o Reino Unido ganhou 120, a Alemanha 104, França 65, Suécia 30, Rússia 27, Suíça 26, Canadá 23, Áustria 22, Itália 20, Japão 20, Austrália 13, Polônia 15, Dinamarca 14, China 9.  A América Latina recebeu 19 (Argentina 5, México 3, Chile 2, Colômbia/Costa Rica/Peru/Venezuela 1), a África 16 e a Oceania 16.

 Criado pelo milionário sueco Alfred Nobel (1833-1896) para evitar que seu nome fosse lembrado somente pela invenção da dinamite, desde 1901, a Academia de Ciências Sueca escolhe seus preferidos, causando um rebuliço digno de final de Copa do Mundo. A academia só não divulga como. O processo de escolha é secreto e recebe indicações.  Poucos sabem que o Brasil já esteve muito perto de ganhar o Prêmio Nobel, por diversas vezes. Vamos enumerar os casos mais famosos:
1) Santos Dumont foi uma possibilidade, mas os irmãos Wright tinham a preferência dos países do Norte;
2) o brasileiro Cândido Rondon foi indicado por Albert Einstein;
3) Carlos Chagas (1878-1934) chegou pertíssimo, foi indicado 4 vezes. A Real Academia Sueca de Ciências procurou organismos científicos no Brasil, em busca de mais dados sobre a personalidade e a obra do cientista. Aparentemente, o prêmio estava reservado para Chagas, mas o instituto sueco recebeu a informação que a doença era falsa. Curiosamente, a principal oposição à indicação de Chagas não vinha da comissão do Nobel, mas de alguns de seus compatriotas do Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos (hoje, Fundação Oswaldo Cruz) e da Academia Nacional de Medicina, ao ponto de se negar a existência da doença e de se levantar dúvidas sobre a seriedade do trabalho de Chagas. Essas desavenças chegaram aos ouvidos da comissão do Nobel, que, por via das dúvidas, deixou o ano de 1921 sem a premiação da área para a qual Chagas estava indicado;  
4) O alagoano Jorge de Lima (1893-1953) chegou perto,foi um talento reconhecido em 1947 por um olheiro do Nobel. Impressionado com a obra do poeta, Artur Lunkvist convenceu a academia a dar o Nobel de Literatura a ele no ano de 1958, já que havia uma lista de autores para ganhar antes. Infelizmente, Jorge morreu em 1953. E o Nobel só premia vivos;
5) O bioquímico carioca Maurício Rocha e Silva (1910-1983) descobriu a bradicinina, substância importante para a controle da pressão arterial, em pesquisa com o veneno da cobra jararaca;
6) O bioquímico paulista Sérgio Henrique Ferreira (1934-) continuou o trabalho de Rocha e Silva ajudando na criação de drogas a partir da bradicinina. Fez parceria com o britânico John Vane, que levou o Nobel de Medicina em 1982, sozinho;
7) Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) não queria saber do jogo. Quando, em 1967, seu tradutor para o sueco pediu todas as suas traduções disponíveis, ele não quis colaborar, disse que o merecedor era Jorge Amado;
8) O baiano Jorge Amado (1912-2001) ofereceu perigo de gol até os últimos minutos do segundo tempo. Mas acabou partindo antes que o prêmio chegasse. O momento em que esteve mais próximo do Nobel de Literatura foi em 1967, logo após o sucesso de Dona Flor e seus Dois Maridos. Nesse ano, perdeu para o guatemalteco Miguel Angel Astúrias;
9) Celso Furtado (1920-2004) paraibense, também chegou a ser cogitado, mas parece que a cartolagem preferia economistas matemáticos. Grande economista de fama mundial, representante do “estruturalismo”, o seu estudo mais importante trata-se do desenvolvimento econômico e seus problemas. Este prêmio foi atribuído em 1998 ao economista bengali Omortia Sem; 
10) O mais espantoso é que um brasileiro nato já ganhou um prêmio Nobel. Peter Brian Medawar, Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 1960, era brasileiro, nascido no hospital Santa Tereza, em Petrópolis, onde viveu até os 14 anos de idade antes de mudar para a Inglaterra e se naturalizar. Com justiça, os britânicos o arrolam como um Nobel inglês. Entusiasta da pesquisa científica, nos anos trinta queria continuar a investigar sem renunciar à sua nacionalidade brasileira. Para isto solicitou do governo brasileiro que o isentasse de fazer o serviço militar obrigatório. O governo recusou-lhe tal isenção, assinando o escrito de recusa o ministro Salgado Filho. E este grande investigador, que  trabalhara com Fleming, de pai libanês, brasileiro de nascimento e com estudos primários e secundários no Brasil, a quem se deve a importantíssima teoria da “Tolerância Imunológica Adquirida”, vital para que hoje possamos, por exemplo, fazer transplantes de órgãos, não teve outro remédio, para poder continuar a pesquisar, senão solicitar a nacionalidade britânica;

11) Cesar Lattes (1924-2005) foi injustiçado em 1950 por não ter ganho o prêmio de Física. O brasileiro comprovou experimentalmente a existência da partícula subatômica méson pi e quem levou o prêmio foi o britânico Cecil Powell, que ajudou na redação do estudo.César Lattes tinha apenas 22 anos quando publicou, em 1947, na revista Nature, a descoberta do méson pi. O artigo era assinado por Lattes, Occhialini (Giuseppe Occhialini, físico italiano) e Powell (Ceci Powell, chefe da equipe de pesquisadores da Universidade de Bristol, Inglaterra). Powell recebeu o prêmio e sua equipe nem foi citada. Powell trabalhava para Lattes que liderava e desenvolvia a pesquisa. Lattes disse:  "Eu fiz a experimentação e as medidas. Ele apenas ajudou a redigir, porque possuía maior domínio da língua inglesa.”. Contudo, em 1949, o japonês que propôs a partícula ganhou o Nobel, e em 1950 Cecil Powell que trabalhava para Lattes ganhou o Nobel pela pesquisa liderada e desenvolvida por Lattes. Até hoje isso contínua sendo um grande mistério para a comunidade científica.  Um dos prêmios mais injustos até hoje; 

12) Dom Hélder Câmara - foi autor de um dos maiores programas sociais do Nordeste nas décadas de 1960 e 1970, o Operação Esperança.  Em 1970, reuniu mais de 20 mil pessoas em Paris para denunciar torturas no Brasil. Por suas obras, foi indicado ao Nobel da Paz de 1970 a 1973. Era favorito absoluto nas quatro vezes, mas nunca ganhou por causa de pressões do governo brasileiro na época. Dizem que o próprio Médici instruiu os embaixadores brasileiros na Suécia e na Noruega que impedissem o prêmio para o "bispo comunista".   O que muitos desconfiavam foi confirmado no livro Dom Hélder Câmara - Entre o Poder e a Profecia, de Nélson Pilitti e Wálter Praxedes. Os autores revelam que uma campanha afastou, entre os anos 70 a 73, o arcebispo do Nobel da Paz. Estão no livro documentos provando que o Governo Garrastazu Médici (1969-74) moveu, por meio da embaixada brasileira em Oslo (Noruega), uma campanha secreta contra a eleição do arcebispo. "Nunca soube do fato", garantiu dom Hélder, quando o livro foi lançado. Os autores mostram trechos de telegramas enviados ao Ministério das Relações Exteriores pelo embaixador do Brasil na Noruega, Jaime de Souza Gomes, em que ele presta contas de sua ação pelo discreto esvaziamento da candidatura de dom Hélder ao prêmio;

13) O químico Otto Gottlieb (1920-2011) foi proposto nos anos 1998,1999 e 2000 para receber este prêmio. Tinha elaborado um interessante índice para medir a biodiversidade dos ecossistemas da Floresta Amazônica e da Mata Atlântica. Escreveu mais de 700 artigos científicos e foi um investigador de verdadeira categoria ; 

14) Miguel Nicolelis, neurocientista brasileiro, o único brasileiro hoje em dia em condições de ganhar o Nobel,  tem 52 anos, é médico com doutorado pela Universidade de São Paulo, pós-doutorado no Hospital Universitário Hahnemann (EUA) e há duas décadas é professor na Universidade Duke (EUA), onde lidera um grupo de pesquisadores da área de neurociência....primeiro cientista brasileiro a ser capa da Science. Já realizou duas palestras na Fundação Nobel de Estocolmo, em 2007 e 2011. Já ganhou 38 prêmios internacionais por suas pesquisas, três deles, em 2010, do NIH - Instituto Nacional de Saúde dos EUA. Seu experimento, o exoesqueleto foi boicotado pela FIFA, na abertura da Copa do Mundo de 2014 (lhe deram apenas 3 segundos) e pela mídia brasileira (Reinaldo Azevedo e Diogo Mainardi da revista VEJA). A Rede Globo cortou a transmissão para mostrar o ônibus da Copa, e acabou não dando destaque ao exoesqueleto. Diogo Mainardi, ex-colunista da Veja, resolveu se aventurar no universo da ciência e criticou o Projeto Andar de Novo liderado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis. “Exatamente como Santos Dumont, Nicolelis inventou o que já havia sido inventado”, provocou Mainardi no Twitter. Nicolelis respondeu. “Pena que não. Nenhum paciente havia usado pensamento para controlar um exoesqueleto que devolve feedback tátil para o usuário. Talvez em Veneza não tenha chegado a notícia, mas Santos Dumont inventou o voo controlado, sem o qual o avião não seria possível. Portanto, procure se informar, estudar um pouco mais, durante seus passeios de gôndola. Ciência não é o seu forte”, concluiu o cientista.
Enquanto Miguel Nicolelis é achincalhado por Veja e seus leitores, as principais publicações científicas do mundo exaltam o seu trabalho. É que nas cabeças brilhantes dos nossos cientistas de ocasião, o sucesso do exoesqueleto seria contabilizado como uma vitória de Lula e Dilma, e não do Brasil, dos brasileiros e da comunidade científica mundial. Assim como o governo americano, o Brasil fez alto investimento no projeto: R$33 milhões. Não fez mais do que a obrigação. Mesmo assim, oposicionistas desejam minar qualquer possível ganho político que o governo venha a ter com o sucesso do projeto. Mesmo que para isso seja necessário vandalizar essa importante contribuição do país para a humanidade. É o famoso viralatismo brasileiro, misturado com campanha política em ano de eleição.
Mas nada disso mostrou-se suficiente para evitar que Nicolelis fosse alvo dos ataques dos calunistas de plantão, que o acusaram de midiático, perdulário com o dinheiro público, farsante e de criar algo que pode ter futuro uso militar - claro, como a pólvora, o avião, os alimentos enlatados, o satélite, o computador, o telefone celular.
Paulo H. Amorim disse que a mídia resolveu desqualificar um dos "maiores cientistas brasileiros vivos" por ter visto nele um "amigo de Lula".


Pois é, Nicolelis não é o primeiro a ser ignorado no Brasil. Ah, mas quando os americanos fizeram um homem voar na abertura das Olímpiadas aí sim todo mundo achou o máximo.
Parece que o complexo de vira-latas, que atingiu muita gente no Brasil, nos impede de dar valor à ciência nacional.

Outros brasileiros também mereceriam o prêmio. O mais extraordinário escritor do Brasil em toda a história foi Joaquim Mª Machado de Assis (1839-1908), poderia ter sido agraciado com o prêmio já que morreu em 1908 e o prêmio começou a ser distribuído em 1901; Cecília Meireles (1901-1964): esta grande poeta e educadora nunca foi proposta para o Nobel. Mesmo no Brasil, de forma injusta e incompreensível, foi só reconhecida postumamente, recebendo os prêmios mais importantes uma vez falecida; João Guimarães Rosa (1908-1967) ;Graciliano Ramos (1892-1953);  Ariano Suassuna ; Érico Veríssimo (1905-1975), José Lins do Rego (1901-1957), João Cabral de Melo Neto (1920-1999), etc...
Dom Paulo Evaristo Arns (1921-) foi um dos defensores da camisa canarinho na disputa pelo Nobel da Paz. Ele concorreu em1990, mas teve que encarar o megacraque Dalai Lama, que ficou com o título. Zilda Arns, o sociólogo Betinho e até o presidente Lula também deram a sua contribuição para emplacar na categoria. Imagina o Lula candidato ? Choveria dezenas de cartas e protestos da direita brasileira endereçada ao comitê sueco do Prêmio Nobel.

O prêmio Nobel é tão excêntrico e político como o próprio Nobel. O prêmio Nobel, como todos sabem, sempre teve um caráter político e geo-político muito forte. O filósofo francês Jean Paul Sartre, ganhador do Nobel de Literatura de 1964, simplesmente recusou o prêmio – não queria que o reconhecimento institucional influenciasse sua obra. A meritocracia nunca foi o tema mais importante para o prêmio. Einsten não ganhou pela teoria da relatividade e sim por uma pesquisa muito menos significativa. Isso pelo medo da teoria da relatividade ser falha.Por pressão do regime nazista, Einstein teve o prêmio negado mesmo sendo indicado por anos seguidos. Apenas em 1921 ele recebeu o Nobel de Física pelos estudos sobre o efeito fotoelétrico.
Ghandi nunca ganhou o prêmio Nobel da paz, contudo Kissinger (envolvido na guerra do Vietnã e na queda do regime democrático do Chile em 1973) já levou o prêmio para os EUA. Entre 1937 e 1948, Gandhi recebeu 12 indicações à láurea apesar de ter se formado em Direito em Oxford, na Inglaterra, ele não era europeu, nem americano, nem um político de carreira, nem pertencia a alguma organização oficial. O escritor soviético Boris Pasternak (autor de Doutor Jivago) escolhido para o Nobel de Literatura em 1958 (aquele que estava prometido para o brasileiro Jorge de Lima), foi um dos que tiveram que declinar, por pressão do governo de Moscou, que acusava a fundação Nobel de sempre favorecer os países capitalistas.

      Ozires Silva (Reitor da Unimonte, de Santos; foi ministro da Infraestrutura e presidiu empresas como Embraer, Varig e Petrobras) responde a pergunta: porque o Brasil nunca ganhou um Prêmio Nobel? Em 1994 quando participava de uma reunião na Real Academia Sueca de Engenharia fez a pergunta a um colega sueco e ele respondeu: "Vocês, brasileiros, são destruidores de heróis". E acrescentou que brasileiros indicados devem ter sido retirados das listas de candidatos, muito possivelmente, por cartas e manifestações, duras e ácidas, produzidas por outros brasileiros. Ao contrário dos Estados Unidos, onde, disse ele, há um aplauso generalizado aos candidatos ao Nobel,  no Brasil, as pessoas usualmente se sentem constrangidas quanto a produzir elogios, mas são extremamente desenvoltas quanto a fazer críticas. Como vimos pela lista dos possíveis ganhadores do prêmio vários candidatos brasileiros foram caluniados e desconstruídos pelos próprios brasileiros na indicação do Nobel - como é o caso de Carlos Chagas e D. Hélder Câmara; fora os outros que não sabemos (Miguel Nicolelis e Lula ?). Mas também houve casos que poderíamos ter ganho o prêmio mas a política de premiação e/ou preconceito ou discriminação impediram (César Lattes, Sérgio Henrique). E outros casos que não tivemos sorte (Jorge de Lima, morreu antes de receber o prêmio) ou descaso do governo (Peter Brian Medawar).


"Darcy Ribeiro costumava dizer que temos as elites mais reacionárias do mundo e aquelas que mais internalizaram dentro de si o processo de colonização que implica submeter-se ao senhor estrangeiro, considerar-se sempre dependentes dele, e para manter vantagens como sócios subalternos e agregados, nunca se oporem a ele", analisa o teólogo, filósofo e escritor Leonardo Boff. Ele identifica que esta estratégia ainda está em vigor na mente das elites políticas brasileiras, que sempre se alinharam ao poder do momento. Primeiro a Inglaterra, agora os EUA.   

No dia 17 de dezembro de 2010, durante uma aula de abertura da Universidade Aberta do Brasil em Moçambique, o Presidente Lula defendeu a necessidade de integração entre os países do Hemisfério Sul, para que deixem de ser submissos aos do Norte ou que se sintam inferiorizados: "Como tivemos nossa cabeça colonizada durante séculos, aprendemos que somos seres inferiores e que qualquer um que enrola a língua é melhor do que nós. O que queremos agora é levantar a cabeça juntos e construir juntos um futuro em que o Sul não seja mais fraco do que o Norte, em que o Sul não seja dependente do Norte. Se nós acreditarmos em nós mesmos, podemos ser tão importantes quanto eles, tão sabidos quanto eles", afirmou.... ( in : http://www.webartigos.com/artigos/porque-o-brasil-nunca-ganhou-um-premio-nobel/55611/).


Daniel Miranda Soares é economista e EPPGG aposentado. Mestre pela UFV e ex-professor.



A Crise neoliberal representa um retrocesso social

25 de Junho de 2014, 7:48, por Daniel Miranda Soares - 0sem comentários ainda

 

A crise neoliberal é a crise do capitalismo financeiro

 

François Chesnais, economista e professor da Universidade de Paris, em seu livro mais recente “A Finança Mundializada” (Boitempo Editorial) distingue dois tipos mais destacados de empresas capitalistas: os grandes grupos industriais transnacionais (ou multinacionais) e ao seu lado menos visíveis e menos analisadas estão as instituições financeiras. Este último capital, também chamado por ele de “capital portador de juros” busca “fazer dinheiro” sem sair da esfera financeira, sob a forma de juros de empréstimos, dividendos e outros pagamentos recebidos a título de posse de ações. Os investidores institucionais atuam com fundos de pensão, fundos coletivos de aplicação, sociedades de seguros, bancos que administram sociedades de investimento, bônus do Tesouro e outras formas de títulos da dívida pública, obrigações das empresas e ações. Buscaram suas bases na centralização dos lucros não reinvestidos das empresas e das rendas não consumidas das famílias (especialmente os planos de previdência privada e a poupança salarial) formando um trampolim de uma acumulação financeira de grandes dimensões. Foi necessário que os Estados mais poderosos decidissem liberar o movimento dos capitais e desregulamentar e desbloquear seus sistemas financeiros a partir de 1979-81, dando início ao sistema de finança mundializada e interconectada internacionalmente. Os investidores institucionais foram os primeiros beneficiários da desregulamentação monetária e financeira e ao longo dos anos 80, eles tiram dos bancos o primeiro lugar como pólo da centralização financeira. O mercado de câmbio com taxas flexíveis e o colapso do sistema de Bretton Woods foi o primeiro a entrar na mundialização financeira, junto com a abertura externa e interna dos sistemas nacionais (o livre comércio internacional) antes fechados e compartimentados, conduziram à emergência de um espaço financeiro mundial.

 

As consequências mais dramáticas desta liberalização foi a crise da dívida externa do Terceiro Mundo. Estes países pegaram muito dinheiro emprestado a juros baixos nos anos 70 (Brasil pra financiar grandes projetos) e aí veio o golpe de 1979 quando as taxas explodiram, multiplicando por 3 e até por 4 os juros a serem pagos por estes países. A crise foi dramática e o FMI e Banco Mundial (por imposição americana) impôs ajustes estruturais (para garantir o pagamento da dívida) provocando crises econômicas e sociais, privatização de estatais, bancos e até de serviços públicos na AL (água, gás, telefone, eletricidade) e desindustrialização, aumentando a dominação da periferia pelo centro. O Brasil recorreu ao FMI e sua dívida cresceu como uma bola de neve, quanto mais pagava mais devia – houve queda do PIB e até quedas das taxas sociais de desenvolvimento (como aumento do índice de mortalidade infantil devido ao enxugamento de recursos pelo Estado para pagar os juros). A violência da crise financeira na América Latina ocorreu na proporção da desindustrialização, do desemprego e da pobreza provocada pela abertura ultraliberal. Mas em termos de valores absolutos de transferências financeiras, a dívida pública decisiva não foi a do Terceiro Mundo, mas a dos países mais avançados : EUA e Europa. Investidores financeiros estrangeiros financiaram déficits orçamentários dos grandes países industrializados pela aplicação de bônus do Tesouro e outros compromissos da dívida sobre o mercado financeiro.

 

Mas o mais importante da análise de François Chesnais é que ele aprofunda a análise sobre como o capital financeiro passa a dominar o sistema econômico como um todo e a partir daí o declínio econômico resultante desta supremacia financeira e as consequentes crises neoliberais, até hoje acontecendo. A partir dos anos 80 o capital financeiro transforma o sistema, inclusive juridicamente, despendendo energias consideráveis para subordinar os administradores industriais aos interesses do mercado bursátil, transformando seus agentes, interiorizando valores e códigos de conduta. O administrador financeiro passa a ser sujeito em vez de objeto em relação ao administrador industrial. As prioridades se invertem, juros dominam lucros e os grupos são dirigidos por pessoas para as quais a tendência da Bolsa passa a ser mais importante e os valores da finança triunfam. Os assalariados foram as principais vítimas da chegada dos proprietários acionistas. É contra eles que se exerce o novo poder administrativo. A flexibilização do emprego e o recurso sistemático ao trabalho barato e pouco protegido dominam o ambiente por meio da deslocalização e da subcontratação internacional. Ou seja os empregos se deslocam para o Terceiro Mundo onde o trabalho é precarizado e pouco protegido e os salários muito mais baixos, devido à ausência de regulamentação do trabalho. As filiais no exterior e as redes de subcontratação sustentam os lucros e os valores acionários. E criam nos países de origem dos grupos as condições de forte pressão para impor “reformas” que organizam o retrocesso social. A fuga de cérebros para os EUA também é resultado desse processo na área de P&D.

As promessas neoliberais em matéria de crescimento econômico, de emprego e de bem estar social resultaram em desastre completo, apesar do apoio da imprensa (quase totalidade da grande mídia reza na cartilha neoliberal) dizendo que a economia “está cada vez melhor”. Segundo o autor se se usa o indicador de taxa de crescimento per capita do PIB (indicador de produção e riqueza) constata-se que: a) uma taxa de 4% no período 1960/1973; b) 2,4% entre 1973/1980; e c) e uma queda para 1,2% entre 1980/1993, não aumentando depois disso. Já o PIB mundial não superou 2% ao longo da década de 1990, enquanto que foi de 7% no período keynesiano 1963/1973, caindo para 3% entre 1973/1990. Outro indicador importante é a taxa de crescimento do produto industrial: nos países da OCDE, ela passou de 6% no início dos anos 60 para 2% ao longo dos anos 90. O crescimento econômico cai devido à queda no nível dos investimentos e estes caem porque uma parte cada vez maior dos lucros está sendo direcionada ao capital financeiro e não sendo reinvestida na produção e também uma parte cada vez menor direcionada aos salários. Como resultado deste processo : a taxa de crescimento é lenta e o desemprego aumenta, junto com as desigualdades sociais.

 

Um relatório recente da OCDE (2014) — sugestivamente intitulado “Divididos estamos: porque aumenta a desigualdade”, indica que “a renda média de 10% das pessoas mais ricas representa nove vezes a renda dos 10% mais pobres” nos países (ricos, em sua maioria) que integram esta organização. A distância aumenta em dez para um na Grã-Bretanha, Itália e Coreia do Sul; chega a quatorze para um em Israel, Estados Unidos e Turquia, diz o informe. O Relatório reconhece que houve aumento da desigualdade entre seus membros - ”O número de famílias sem renda de trabalho dobrou em Grécia, Irlanda e Espanha; e subiu 20% ou mais em Estônia, Itália, Letônia, Portugal, Eslovênia, Estados Unidos, Inglaterra e País de Gales.”

Nos últimos 30 anos, mostra o estudo, as reformas tributárias em todas as nações da OCDE cortaram de forma substancial os impostos cobrado aos mais ricos. A média de taxação caiu de 66%, em 1981, para 43%, em 2013. E as taxas cobradas de dividendos sobre lucros recuaram de 75% para 42%. É o capital financeiro dominando ideologias e valores, formando o pensamento único (vide Consenso de Washington) e conquistando a superestrutura política , nos meios políticos dos EUA e Europa. O pensamento único decreta o fim da política e dos partidos, não existe mais “esquerda e direita”. Na verdade o pensamento único consegue transformar os partidos de esquerda em partidos neoliberais, não havendo muitas diferenciações hoje entre democratas e republicanos (nos EUA) e nos partidos de esquerda e de direita na Europa.

 

Os dados sobre os Estados Unidos mostram que “a renda por família, após o pagamento de impostos, mais do que dobrou entre 1979 e 2007, entre o 1% mais rico. Na fatia dos 20% mais pobres, caiu de 7% para 5% no mesmo período. Um quarto de todos os lares da Inglaterra e País de Gales, cerca de 20 milhões de pessoas, vivem em estado de pobreza atualmente, um sólido legado de sucessivos governos neoliberais, desde Thatcher, passando por Blair ... Pesquisas indicam que em pleno inverno, um número crescente de famílias inglesas vive o pior quadro de aperto financeiro desde a II Grande Guerra.

 

Robert Reich, ex-secretário do Trabalho do Governo Clinton, filmou um documentário mostrando o agravamento das desigualdades nos EUA, com o título Inequality for All (Desigualdade para Todos). Em 1978, o salário médio atingia US$ 48 mil, enquanto hoje despencou para US$ 34 mil com condições de poder aquisitivo equivalentes.....Já ao contrário, o rendimento médio para cada família que compõe o 1% da parcela mais rica da população norte-americana, de US$ 393 mil, em 1978, passou para US$ 1,1 milhão.

 

A ditadura dos “mercados financeiros” sobre todo o processo de acumulação de capital revela o caráter insaciável do apetite dos acionistas administradores e das sociedades especializadas da indústria financeira e que se encontra na base dos escândalos financeiros desde então : da Enron até o Lehmann Brothers na crise atual, a partir de 2008; tendo estas sociedades impelidas a assumir mais riscos e comportamentos de altos riscos.

 

Americanos de classe média foram ativamente incentivados a se endividar continuamente (devido à perda de poder aquisitivo nas últimas décadas), oferecendo suas casas em garantia, ou a canibalizar seus fundos de aposentadoria, confiando em que os preços dos imóveis e as bolsas de valores desafiariam permanentemente a lei gravidade - um grande número de famílias operárias, endividada e sem renda, entraram na fila dos despejos e amargaram a perda de suas residências.....As coisas pioraram com a recessão iniciada no final de 2007, que destruiu cerca de 9 milhões de empregos, degradou um pouco mais as condições de trabalho e rebaixou salários (menos de um décimo dos trabalhadores do setor privado americano pertence a um sindicato). A indústria agora representa somente 12% dos postos de trabalho nos EUA e boa parte dela se transfere para países do Terceiro Mundo.Os sindicatos perderam seu poder de barganha com a crise neoliberal, contribuindo para a depreciação dos salários.

 

Em 2007, a taxa de desemprego para a faixa etária de 20 a 29 anos foi de cerca de 6,5%. Hoje (2012), a taxa de desemprego para esse mesmo grupo de idade é de cerca de 13% (Michael, no The Economic Collapse). Desde o ano de 2000, os rendimentos dos lares americanos liderados por pessoas entre as idades de 25 e 34 anos caíram em cerca de 12% depois de descontada a inflação. A renda familiar média para as famílias com filhos caiu bastante, em cerca de US$ 6.300 entre 2001 e 2011. Mais de uma em cada cinco crianças nos Estados Unidos está atualmente vivendo na pobreza. Cerca de 48,7 milhões de norte-americanos vivem hoje na pobreza, constituindo-se na taxa mais elevada dos últimos 17 anos: 15,1%.. De acordo com o Departamento de Agricultura, em 2012, 46 milhões de pessoas usufruíram de algum tipo de subsídio alimentar mensal (os chamados foodstamps), crescimento espantoso se comparado aos 17 milhões contabilizados em 2001 e aos dois milhões em 1969.

 

As tent-city (cidade-acampamento) é o correspondente às favelas brasileiras, com os mesmos problemas, é resultado da precarização das condições de vida e trabalho nos Estados Unidos e seu surgimento se deu em várias partes do país, especialmente a partir de 2005. Existe cerca de 30 cidades deste tipo nos EUA. Detroit é uma delas – a cidade pediu falência em 18 de julho de 2013 (para se proteger contra credores). Detroit já foi a capital da indústria automobilística americana – sede das Big Three – as “Três Grandes” : General Motors, Ford e Chrysler ; foram atingidas pela crise atual. A crise diminuiu os consumidores de automóveis e transferiu as indústrias para outros países. O desemprego, a miséria e a fome é pior em Detroit que a média americana : 36% da população vivem abaixo da linha de pobreza. É uma cidade abandonada: possuia 2 milhões de habitantes nos anos 50, hoje possui 700 mil. A profunda e progressiva desindustrialização pela qual os Estados Unidos passou a partir dos anos 1980 e seu caráter crônico depois da crise financeira de 2007, atacou a cidade-automóvel em cheio. Virou uma cidade-fantasma:35% do território do município está desabitado: prédios, hotéis, delegacias de polícias, igrejas, bibliotecas e teatros completamente vazios e destruídos - cerca de 40% da iluminação pública não funciona, mais de metade dos parques da cidade fecharam e apenas um terço das ambulâncias estão operacionais.

 

O capital portador de juros, especulativo e predador, domina o mercado econômico mundial, gozando de toda liberdade que conseguiu a partir das desregulamentações dos sistemas financeiros nos anos 80 e é exatamente esse ambiente neoliberal que lhe deu as condições necessárias para adquirir sua hegemonia internacional – condições essas que propiciaram e detonaram as crises atuais, provocando as bolhas financeiras, os ganhos espetaculares de altos riscos e a supremacia sobre o capital produtivo. O caso de algumas estatais brasileiras que foram privatizadas são exemplos desses comportamentos – CEMIG, por exemplo, era uma estatal até início dos anos 2000. Depois que entrou o governo neoliberal em 2002, desde então está sendo privatizada. Hoje a maioria das ações da estatal, cerca de 70% pertencem a acionistas internacionais e as prioridades mudaram. A maior parte dos lucros são transformados em dividendos pra remunerar seus acionistas e os níveis de investimentos caíram. Pra pressionar o aumento dos lucros os acionistas pressionam a direção da empresa para reajustar os preços acima da inflação, transformando a energia desta empresa numa das mais caras do país. A prioridade deixa de ser o usuário e passa a ser o acionista.

 

O jornalista James Shaft observou no NYT que, “ao que tudo indica, as empresas estão muito mais dispostas a acumularem papel-moeda ou utilizá-lo para compra de ações do que promoverem a criação de nova dinâmica produtiva”. Enquanto, na década de 1970, as improdutivas imobilizações de capital constituíam, em média, cerca de 5% do ativo das empresas norte-americanas, em 2010 este patamar passou a 60%. Apesar do fato de disporem de grandes volumes de liquidez em suas caixas, as grandes empresas não investem.Quando a fortuna dos mais ricos não é aumentada graças às atividades produtivas, mas apoderando-se de cada vez maior percentual do valor agregado, então o crescimento econômico desacelera.Existe, portanto, uma economia que recusa-se a recuperar-se, apesar de todos os generosos fluxos de papel-moeda. O problema é conhecidíssimo: trata-se da “armadilha de liquidez”, descrita por Keynes na década de 1930. Para ser enfrentada existe apenas uma única solução: recorrer ao uso da segunda ferramenta da política econômica, o gasto fiscal....

 

Daniel Miranda Soares é economista e EPPGG aposentado, Mestre pela UFV e ex-professor de Economia.



Desenvolvimentismo X Neoliberalismo - dois modelos em confronto

24 de Maio de 2014, 10:26, por Daniel Miranda Soares - 0sem comentários ainda

DESENVOLVIMENTISMO X NEOLIBERALISMO – dois modelos em confronto.

 

Enquanto o mundo desenvolvido neoliberal entra em crise a partir de 2008 e não consegue sair dela; na América Latina várias países conseguiram adotar um modelo alternativo que iniciou o desenvolvimento social e a melhoria do bem estar social de suas populações. O modelo neoliberal entrou em crise devido à excessiva liberdade oferecida ao mercado financeiro pelas autoridades monetárias, a partir dos anos 80 nos EUA, abusando assim da especulação e das maracutaias que enganavam os investidores. O modelo, enxugou a máquina estatal de gastos sociais, reduziu impostos dos ricos e diminuiu o poder de barganha dos sindicatos de trabalhadores para aumentar as margens de lucros dos oligopólios. Criaram também toda uma ideologia favorável à liberdade do capital, ao “Deus mercado”, às “maravilhas do neoliberalismo” absorvidas totalmente pela mídia, inclusive na América Latina, cuja elite conservadora é submissa à matriz.

O modelo desenvolvimentista, dos socialistas democráticos, foram reeleitos na Venezuela de Hugo Chávez, no Equador de Rafael Correa, na Argentina de Kirchner e Cristina, na Bolívia de Evo Morales e no Brasil de Lula e Dilma. Todos foram reeleitos contra a vontade de uma elite conservadora (apoiada pela mídia local e pela direita americana), que lutou ferozmente contra eles nas eleições, usando de artifícios desonestos, calúnias e difamações. Enquanto a Europa se afunda em políticas de austeridade, partidos governistas são substituídos por outros de qualquer orientação que aprovam mais cortes sociais, promovem mais privatizações e aumentam a desigualdade; na América Latina os governos resolutamente viraram as costas para esse modelo, reduziram a pobreza e a desigualdade, reergueram indústrias, proveram mais recursos de controle corporativo, expandiram maciçamente os serviços públicos e a participação democrática. O modelo desenvolvimentista desenvolvido pela esquerda latino-americana se baseia na melhoria dos indicadores sociais (redução da pobreza, elevação de renda dos mais pobres, redistribuição de renda, queda do desemprego, etc.) mas que resultaram também no incremento da atividade econômica (crescimento do PIB, da renda per capita, da produção econômica em geral). Como veremos em seguida. Todos estes governos vieram depois de fracassados governos neoliberais e de seus problemas tais como desemprego, juros, dívida, privatizações, fraco desempenho econômico, recessão, etc.....

 

BRASIL E MÉXICO (neoliberal). A mídia do pensamento único defende o modelo neoliberal, mesmo tendo que mentir e esconder dados, como no caso do México, considerado um “sucesso” do modelo liberal depois que se integrou ao bloco Nafta (EUA, Canadá e México). No entanto, basta comparar alguns dados econômicos-sociais para se perceber o fracasso deste modelo. No período 2003-2012, usando dados do Banco Mundial e do Ministério do Trabalho dos dois países vemos que o crescimento médio anual do PIB brasileiro foi de 4,21%; o do México de 2,92%. O crescimento total da economia brasileira foi de 42,17%; o do México de 29,29%. Por outro lado, a renda per capita brasileira cresceu a uma taxa anual de 2,84% e a do México, 1,42%. O crescimento total da renda no Brasil foi de 28,4%, e no México foi de 14,26%. E a participação dos salários na renda chegou a 45% no Brasil, contra 29% no México. Nesse mesmo período, o Brasil criou 16 milhões de novos empregos formais, e o México 3,5 milhões; e a pobreza absoluta foi reduzida a 15,9%, no Brasil, e aumentou para 51,3%, no México. Por fim, (pasmem-se), entre 2002 e 2012, o “investimento direto estrangeiro” cresceu, no Brasil, de US$ 16,59 bilhões, para US$ 76,11 bilhões de dólares. No México, caiu de US$ 23,932 bilhões, em 2002, para U$ 15,455 bilhões, em 2012! Só para encerrar a comparação, em 2013 a economia brasileira cresceu 2,3%, (uma das maiores taxas entre as grandes economias do mundo), enquanto a economia mexicana cresceu 1,1%. Como o México pode servir de exemplo para o Brasil ? Na cabeça dos neoliberais, o México é melhor que o Brasil porque as margens de lucro são maiores, paga-se menos impostos e os salários são mais baixos.

 

BRASIL. Pode-se comparar também os 8 anos de governo neoliberal de FHC (1995-2002) com os governos desenvolvimentistas de Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2014).: 1) Taxa de Desemprego (IBGE): FHC (Dezembro de 2003) – 12,6%; Dilma (Dezembro de 2013) – 4,3%; 2) Taxa Selic (Banco Central): FHC (Dezembro de 2002) - 25% a.a.; Dilma (Agosto de 2013) - 11% a.a.; 3) Salário Mínimo (IBGE): FHC (Dezembro de 2002) - R$ 200 (US$ 56); Dilma (Agosto de 2013) - R$ 724 (US$ 323); 4) Empregos Formais (Caged-Ministério do Trabalho): FHC (1995-2002) - 5 milhões; Lula-Dilma (2003-2013) - 20 milhões; 5) Escolas Técnicas Federais (MEC): FHC – 11; Lula – 214, Dilma – 208; 6) Universidades Federais (MEC): FHC – 1; Lula – 14; Dilma – 4; 7) Índice de Gini (FGV): FHC (2002) – 0,588; Dilma (2012) – 0,519. 8) PIB(Banco Central): FHC (2002) - US$ 459 bilhões (2o. da América Latina e 15o. do Mundo); Dilma (2013) - US$ 2,2 Trilhões (1o. da América Latina, 2o. das Américas e 6o. do Mundo); 9) Reservas Internacionais Líquidas (Banco Central): FHC (Dezembro de 2002) - US$ 16 bilhões; Dilma (Abril de 2014) - US$ 377,8 bilhões; 10) Dívida Pública Líquida (Banco Central): FHC (Dezembro de 2002) - 60,5% do PIB; Dilma (Fevereiro de 2014) - 33,8% do PIB.

 

 

EQUADOR. Correa foi originalmente eleito na esteira de um colapso econômico tão devastador que um em cada dez equatorianos deixaram o país. Desde então, a sua "revolução cidadã" cortou a pobreza em quase um terço e a extrema pobreza em 45%. O desemprego foi reduzido, enquanto a segurança social, a saúde e a educação gratuitas foram rapidamente expandidas - incluindo o ensino superior gratuito. (Seumas Milne do The Guardian, escreveu “A América Latina é a alternativa”). Em 2013, Correa foi reeleito para o seu terceiro mandato. Rafael Correa terá mais quatro anos no poder. Não é difícil entender os motivos. O desemprego caiu para 4,1% no final do ano passado – a menor taxa nos últimos vinte e cinco anos. A pobreza diminuiu 27% desde 2006. Os gastos em educação mais que dobraram em termos reais.

Um maior investimento em saúde ampliou o acesso da população aos cuidados médicos. Outras despesas sociais também se ampliaram substancialmente, incluído o subsídio do governo à aquisição da casa própria.

 

Isso pode parecer insustentável, mas não é. O pagamento dos juros da dívida externa do Equador é menos de 1% do PIB, o que é muito pouco; e a dívida pública do país é 25% do PIB, o que também é bem pouco.

 

O governo também reformou e regulou o sistema financeiro. E aqui nós chegamos ao que é, provavelmente, a mais competente reforma financeira de qualquer país no século XXI. O governo tomou o controle do banco central e o forçou a trazer de volta cerca de dois bilhões de reservas que estavam no exterior. O dinheiro foi usado pelos bancos públicos para fazer empréstimos que beneficiaram a infraestrutura, o setor de construção e a agricultura. O dinheiro que estava deixando o país foi taxado e os bancos foram obrigados a manter 60% do seu patrimônio líquido no país. Isso levou as taxas de juros para baixo. O objetivo de todas as alteração foi dar ao sistema financeiro um caráter de interesse público, ao contrário do que acontece em países como os Estados Unidos. Para que isso acontecesse, o governo também separou o setor financeiro da mídia – os bancos eram proprietários da maior parte das empresas jornalísticas antes da eleição de Correa – e criou leis contra monopólios. O Equador também deixou de pagar um terço de sua dívida externa depois que uma comissão internacional concluiu que aquela porção tinha origem ilegal. Mas Correa, um economista com Ph.D., soube escolher o momento certo para ignorar a maior parte de seus colegas.

Correa sofre críticas da mídia por ir contra a sabedoria convencional e – provavelmente o maior pecado aos olhos da imprensa da negócios – ter sucesso. A maior agressão da mídia veio quando o Equador ofereceu asilo ao jornalista Julian Assange, do Wikileaks.

Mas aqui, como na política econômica e na reforma financeira, Correa estava certo. (Guardian traduzido para o Diário do Centro do Mundo : “Por que o Equador ama Rafael Correa”).

 

 

A VENEZUELA de Hugo Chávez, sem dúvida é o modelo socialista (anti-neoliberal, bolivariano e/ou anti-imperialista, como dizia Chávez) que mais avançou na América Latina e talvez por isso o mais perseguido pelos EUA (que inclusive apoiou um golpe de Estado contra Chávez em 2002) e em consequência pela direita latino-americana, que repete os mantras da direita americana. Chávez ganhou eleições livres de 1999 até 2012 (15 das 16 eleições) durante os 14 anos no poder e, mesmo assim a mídia conservadora o chama de “ditador”, porque a mídia americana assim o classifica. A União Européia, a OEA, a UNASUR e até o Centro Carter (do ex-presidente americano Jimmy Carter) reconheceram a transparência das eleições venezuelanas.

Alguns resultados do seu modelo: 1) Em 2005, a Unesco declara a Venezuela livre do analfabetismo, graças ao programa de alfabetização denominado Missão Robinson I.; 2) O número de crianças na escola passou de 6 milhões em 1998 para 13 milhões em 2011, e a taxa de escolarização agora é de 93,2%.; 3) A Missão Robinson II foi lançada para levar a população a alcançar o nível secundário. Assim, a taxa de escolarização no ensino secundário passou de 53,6% em 2000 para 73,3% em 2011.; 4) As Missões Ribas e Sucre permitiram que dezenas de milhares de jovens adultos chegassem ao Ensino Superior. Assim, o número de estudantes passou de 895.000 em 2000 para 2,3 milhões em 2011, com a criação de novas universidades.;

5) Em relação à saúde, foi criado o Sistema Nacional Público para garantir o acesso gratuito à atenção médica para todos os venezuelanos. Entre 2005 e 2012, foram criados 7.873 centros médicos na Venezuela. O número de médicos passou de 20 por 100 mil habitantes, em 1999, para 80 em 2010, ou seja, um aumento de 400%. Cerca de 17 milhões de pessoas puderam ser atendidas, enquanto que, em 1998, menos de 3 milhões de pessoas tinham acesso regular à saúde. Foram salvas 1,7 milhão de vidas entre 2003 e 2011. ; 6) A taxa de mortalidade infantil passou de 19,1 a cada mil, em 1999, para 10 a cada mil em 2012, ou seja, uma redução de 49%.; 7) De 1999 a 2011, a taxa de pobreza passou de 42,8% para 26,5%, e a taxa de extrema pobreza passou de 16,6% em 1999 para 7% em 2011.; 8) IDH: a Venezuela passou do posto 83 no ano 2000 (0,656) ao 73° lugar em 2011 (0,735).; 9) O coeficiente Gini, que permite calcular a desigualdade em um país, passou de 0,46 em 1999 para 0,39 em 2011. ; 10) Segundo o PNUD, a Venezuela ostenta o coeficiente Gini mais baixo da América Latina, e é o país da região onde há menos desigualdade.; 11) Durante a presidência de Chávez, os gastos sociais aumentaram 60,6%. Antes de 1999, apenas 387 mil idosos recebiam aposentadoria. Agora são 2,1 milhões.; 12) Cinco milhões de crianças agora recebem alimentação gratuita por meio do Programa de Alimentação Escolar. Em 1999, eram 250 mil.; 13) A taxa de desemprego passou de 15,2% em 1998 para 6,4% em 2012, com a criação de mais de 4 milhões de postos de trabalho.; 14) A dívida pública passou de 45% do PIB em 1998 a 20% em 2011. A Venezuela se retirou do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, pagando antecipadamente todas as suas dívidas.; 15) A Venezuela oferece um apoio direto ao continente americano mais alto que os Estados Unidos. Em 2007, Chávez ofereceu mais de 8,8 bilhões de dólares em doações, financiamentos e ajuda energética, contra apenas 3 bilhões da administração Bush. (“50 verdades sobre Hugo Chávez” - Opera Mundi). Ver também o documentário “Ao Sul da Fronteira” de Oliver Stone.

 

ARGENTINA. Os governos Cristina Fernández Kirchner foram marcados pela redução da pobreza, pela criação de 3,5 milhões de postos de trabalho, pela aprovação do matrimônio igualitário e pelo crescimento do PIB. Puniu-se militares que atuaram durante a Ditadura Militar Argentina, empresas foram nacionalizadas e seguiu-se uma política externa independente. No final de 2013, a dívida externa caiu para mínimo histórico de 17,9% do PIB. Entre 2003 e 2010, o CONICET (órgão de pesquisas incorporado ao Ministério da Ciência e Tecnologia) contratou mais de 8 mil pessoas, aumentando em 93,2% seu pessoal. A quantidade de investigações em 2003 era de 3804, número que subiu para 6350 em 2010.

O Crescimento econômico da Argentina sob o governo de Néstor e Cristina Kirchner foi um dos mais expressivos e acelerados da região. A média de crescimento econômica da Argentina durante o governo de Cristina Fernández foi de 7,9% anuais. Em 2011, o crescimento econômico argentino foi o segundo maior da América Latina, perdendo apenas para o Equador. Desde 2003, o país apresenta crescimento econômico com taxas que oscilaram em torno dos 9%. O PIB per capita de 2011, medido em paridade de poder aquisitivo do dólar americano, é o mais alto da América Latina. Segundo dados do FMI para 2011, a Argentina é a terceira maior economia da América Latina, superada pelo Brasil e pelo México. Segundo um informe de 2010 da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe, a pobreza se encontrava em 11,3%, o que significou uma redução de 34,1 pontos percentuais. A taxa de pobreza da Argentina se tornou a segunda mais baixa da América Latina, atrás somente do Uruguai (10,7%). De acordo com relatórios do Banco Mundial, entre 2003 e 2009 Argentina dobrou sua classe média passando de 9,3 milhões - 18,6 milhões de pessoas, quase metade da população. O governo Cristina Fernández criou 3,5 milhões de postos de trabalho com carteira assinada. Entre 2003 e 2011, houve uma acentuada queda da taxa de desemprego. Em 2011, a taxa caiu para 7,4%. Foi o quarto trimestre de 2012 a taxa de desemprego diminuiu para 6,9%. Em agosto de 2013 anunciou um aumento de 25% no salário mínimo tornou-se o maior da América Latina em termos de compra, chegando a 3.600 pesos, também eliminou impostos sobre os salários. Em 2009 foi implantado O programa AUH (com base no Programa Bolsa Família brasileiro) de transferência direta de renda com condicionalidades, que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza. Em dois anos, o AUH reduziu a pobreza em 13%. Após o plano quinquenal do governo Perón entre 1947 e 1951, o período de 2003 a 2010 foi o de maior construção de escolas na história da Argentina. Entre 1969 e 2003, os diferentes governos nacionais financiaram a construção de um total de 427 escolas, enquanto que entre 2003 e 2010 se construíram mais 1100 escolas que beneficiaram a meio milhão de alunos, segundo dados oficiais. Foram criadas mais de dez novas universidades....a redução da mortalidade infantil entre 2003 e 2012 foi de 33%. ...Em novembro de 2009, foi aprovada a Lei de Proteção da Liberdade de Expressão e a descriminalização da calúnia e difamação. As leis foram apoiados pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas, observando que: "É um passo importante para o avanço da liberdade de expressão na Argentina e na América Latina." Hoje a Argentina tem uma das melhores “ley de medios” do mundo, acabando com o monopólio no setor e democratizando os meios de comunicação – um exemplo para os outros países da região.

 

A vitória da democracia argentina, com a aprovação da Ley dos Medios pela suprema corte, se reflete em todo o continente, onde grupos privados de mídia, fortalecidos à sombra de ditaduras e com apoio do imperialismo, tornaram-se a principal força política de oposição aos governos progressistas da região.

 

“Quando a democracia renasce na América Latina, eles são os únicos sobreviventes num ambiente devastado. Esses gigantes poderosos, ainda apoiados por agências norte-americanas, abusaram de sua força para influenciar o processo de redemocratização, impondo leis e elegendo seus candidatos. Assim que a década negra do neoliberalismo, quando a pobreza e a desigualdade de renda atingem seus pontos culminantes, foram também a década de ouro da grande mídia sul-americana, alinhada ao rentismo bilionário que sugava o sangue dos trabalhadores do continente. Quando o jogo se inverte, e os povos aprendem a usar o voto para derrubar governantes que não exerciam políticas em seu benefício, esses grupos aderem à oposição. Entretanto, repito, o problema não é seu oposicionismo, e sim o ambiente de monopólio, sem leis, em que esses gigantes operam. Uma passagem, citando o direito internacional sobre o tema, atrapalhará a tentativa do Clarín (grupo que detinha o monopólio da mídia na Argentina) de levar a decisão aos tribunais internacionais. Diz o trecho, citando a Declaração sobre Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos: “os meios de comunicação têm um poder inegável na formação cultural, política, religiosa, de todos os habitantes. Se estes meios são controlados por um reduzido número de indivíduos, ou por um só, cria-se uma sociedade onde um reduzido número de pessoas exercem o controle sobre a informação e, direta ou indiretamente, a opinião que recebe o resto da população. Esta carência de pluralidade na informação é um sério obstáculo ao fundamento da democracia”. (Miguel do Rosário – O CAFEZINHO).

 

Crescimento econômico e programas sociais asseguraram a reeleição da presidente argentina Cristina Fernández de Kirchner no domingo (23 de outubro de 2011), com 54% dos votos contra 17% do segundo colocado, o socialista Hermes Binner. Foi o resultado mais expressivo nas urnas desde a redemocratização do país em 1983, quando Raúl Alfonsin foi eleito com 51% dos votos. Cristina também se tornou a primeira mulher reeleita na história da Argentina.

 

BOLÍVIA

Nas eleições presidenciais de Dezembro de 2005, Evo Morales conseguiu sair como vencedor ao obter 53,74% dos votos, frente a 28,59% de seu principal opositor, Jorge Quiroga. Pela primeira vez na Bolívia um indígena sobe ao poder mediante o voto popular por uma margem considerável sobre o segundo postulante. Assumiu o poder em 22 de janeiro de 2006 como o primeiro mandatário boliviano a ser eleito Presidente da República em primeiro turno em mais de trinta anos, e sendo reeleito em 6 de dezembro de 2009. Em 1° de maio de 2006, Evo Morales declara a nacionalização dos hidrocarbonetos e das refinarias, postos e distribuidores de petróleo, gás e derivados, além de tornar o governo boliviano sócio majoritário dessas indústrias, detendo 50% mais 1 das ações. A economia boliviana crescia à uma média de 3% nos governos anteriores. Nos três anos do governo Morales, a taxa de crescimento do PIB subiu de 4.8% (2006), 4,6% (2007) para 6,1% em 2008, com destaque para o setor de mineração (crescimento de mais de 50%) depois da estatização do setor. O PIB per capita cresceu consideravelmente, passando de uma média de 7,700 pesos em 2000, para 10.800 pesos em 2006 para 12.700 pesos em 2008. Também houve incremento de bolsas tipo Bolsa Família, atingindo 20% da população, melhorando consideravelmente a renda das famílias mais pobres. Nos governos anteriores (2000 a 2005) havia déficit fiscal, no governo Morales (2006-2008) a situação se inverte para superavit fiscal. Depois da nacionalização, o governo passa a ter muito mais recursos próprios aumentando o nível de investimentos produtivos (70% estatal) na economia, mas aumentando também o volume dos investimentos estrangeiros de 270 para 512 milhões de dólares no período. As reservas internacionais também dobraram no período, passando de 3,2 para 7,7 bilhões de pesos bolivianos. O valor da Dívida Pública Externa caiu pela metade nestes três anos. A arrecadação de impostos dobrou.

Alfabetização: A Bolívia tinha 823.000 analfabetos, alfabetizou 820.000 atingindo 97% da população, livrando-a portanto do analfabetismo e passando a ser o terceiro país da América Latina livre do analfabetismo (depois de Venezuela e Cuba). Número de escolas construídas : 187 (203-2005) aumentou para 426 (2006-2008). O número de atendimentos de pessoas no setor de Saúde passou de 1,3 milhões (2005) para 17 milhões em 2008. Número de ambulâncias : 4 (2005), aumentando para 334 em 2008. Quase 7 milhões de pessoas foram beneficiadas com o programa Renda Digna.

Evo Morales já não é “a mudança” como em 2005, nem o “enterrador da oligarquia” de 2009. Sua meta agora é convencer os eleitores dos benefícios da “estabilidade” – como se percebe no aumento do consumo e em um longo período de crescimento. Se conseguir, terá o recorde de ser o presidente boliviano que durou mais tempo no poder, por cima de Andrés de Santa Cruz, o fundador da pátria. Uma pesquisa publicada recentemente deu a Evo Morales mais de 45% das intenções de voto e 32 pontos de diferença com seu concorrente mais próximo para as eleições do final deste ano (2014). Pode ser reeleito pela terceira vez.

 

Os governos socialistas democráticos da América Latina atacaram a desigualdade social e racial, desafiaram a dominação dos EUA e começaram a criar uma verdadeira integração regional independente pela primeira vez em 500 anos. E, dado que a maioria foi reeleita, não é surpreendente que continuem recebendo votos para continuarem no poder. Os meios de comunicação ocidentais retratam os governos do Equador e da Venezuela como ditatoriais. Na realidade, a ameaça antidemocrática real vem de aliados do próprio EUA, que lançaram golpes abortados contra Chávez e Correa e golpes bem-sucedidos em Honduras em 2009 e no Paraguai em 2012.

 

O documentárioSouth of the Border (Ao Sul da Fronteira) é um filme estadunidense de 2009, do gênero documentário político, dirigido, escrito e produzido por Oliver Stone. Para realizar o filme, Stone e sua equipe viajaram do Caribe até o sul da Cordilheira dos Andes numa tentativa de explicar o fenômeno que é o presidente venezuelano Hugo Chávez na região e fazer um relato da recente guinada à esquerda na América Latina. Também tentam compreender a chamada Revolução Bolivariana de Chávez e o desenvolvimento social da região no século XXI. Stone procurou evidenciar o trabalho de vários outros líderes latino-americanos de esquerda cujas políticas geralmente recebem atenção limitada da mídia estadunidense e europeia. São eles: Evo Morales da Bolívia, Fernando Lugo do Paraguai, Luiz Inácio Lula da Silva do Brasil, Néstor e Cristina Kirchner da Argentina, Rafael Correa do Equador e Raúl Castro de Cuba. Os personagens são conhecidos da opinião pública, mas poucas vezes tiveram chance de falar na mídia, especialmente na norte-americana, com suas próprias vozes. O roteirista, o historiador britânico de origem paquistanesa Tariq Ali definiu o projeto como "um road movie político".

 

Entrevista de Stone ao UOL cinema: “.....No Brasil, na Venezuela, na Argentina. Grandes cadeias, grandes famílias, eles são como os oligarcas. Eles são donos dos meios de comunicação, das emissoras de televisão. E eles os usam para interesse próprio. E eles mentem. E o Departamento de Estado americano concorda com eles porque querem controlar a região e o fazem. Eles fazem isso há 150 anos. O Departamento de Estado fornece o material e os meios de comunicação americanos, as emissoras e as agências publicam as histórias sobre todas essas pessoas. Até mesmo Lula, que era [visto como] a "boa esquerda" sul-americana, agora é visto como a "má esquerda" por causa de sua posição a respeito do Irã, o que mostra quão louca é essa situação.....Não acredito mais nos meios de comunicação americanos. Tive minhas próprias experiências com eles. E acho que eles foram tão negativos em relação a Chávez que nem mencionaram os outros países. ...” …....”O filme é destinado aos 80% de pessoas que não são representados nesse tipo de filme, os 80% que foram beneficiados pelas políticas desses novos líderes.”......... "Ao Sul da Fronteira" é uma história imensa, que os americanos não conhecem. Eles não sabem nada sobre isso. Eles ouvem uma versão completamente falsa sobre [o presidente venezuelano Hugo] Chávez nos meios de comunicação americanos. Eles não sabem nada sobre a Argentina, não sabem sobre a disputa de Nestor Kirchner contra o FMI na América do Sul - [os argentinos] promoveram grandes mudanças no modo como fazem negócios. Não sabem que a Bolívia quer seus próprios recursos, sobre o Equador. Não sabem nada a respeito disso.”

 

Oliver Stone tem razão quando diz que os americanos não sabem nada sobre a América Latina e acrescentamos que nós também não sabemos nada sobre nossos irmãos latino-americanos e nem mesmo sobre nós mesmos, porque a mídia esconde dados sobre nossa realidade, omite informações sobre o que estes governos realizam. Se dependermos da MÍDIA fazendo a nossa cabeça, sempre acharemos que estes governos são perversos, corruptos e mau intencionados. Ela criminaliza os governos de esquerda porque estão a serviço dos interesses das grandes corporações multinacionais. Ainda bem que temos a internet com muito mais opções de informações. Alguém já disse que “o Brasil é o único país do mundo em que o governo federal é censurado pela imprensa.” Acrescentamos: o Brasil e outros países latino-americanos cujos governos são perseguidos pela imprensa neoliberal.

 

Daniel Miranda Soares é economista e mestre pela UFV, aposentado em administração pública.



Dois modelos: o Neoliberal (México) e o "Intervencionista" (Brasil). Qual foi melhor ?

8 de Maio de 2014, 8:34, por Daniel Miranda Soares - 0sem comentários ainda

A miragem mexicana

Elogio a modelo liberal mexicano é ideológico e cego. Resultados sociais e econômicos são muito piores que no Brasil “intervencionista” 
 
por José Luís Fiori — publicado 03/05/2014 15:09, última modificação 04/05/2014 11:36 
 
Poucas pessoas inteligentes – fora da Inglaterra – ainda prestam atenção nas notícias da monarquia inglesa e da sua família real, em pleno século XXI. Mas o mesmo não se pode dizer da City, centro financeiro de Londres, e dos seus dois principais órgãos de imprensa e divulgação – o Financial Times, e o The Economist – que seguem tendo importância decisiva na formação das opiniões e dos consensos ideológicos entre as elites liberais e conservadoras do mundo. A escolha dos seus temas e o uso de sua linguagem nunca é casual. Como no caso recente do seu entusiasmo pelo México e seu modelo de desenvolvimento liberal – e seu ataque, cada vez mais estridente, ao “intervencionismo” da economia brasileira. Uma tomada de posição compreensível do ponto de vista ideológico, mas que não vem sendo confirmada pelos fatos.
Em 1994, o México assinou o Tratado de Livre Comercio da América do Norte (Nafta), junto com os EUA e Canadá. Nos últimos 20 anos, tem sido absolutamente fiel ao livre-cambismo, incluindo sua adesão a Aliança do Pacífico, e à inciativa norte-americana da Parceria Trans-Pacífica – TPP. Por outro lado, nesse mesmo período, o México praticou uma política macroeconômica e financeira rigorosamente ortodoxa – em particular na última década – mantendo inflação baixa, cambio flexível, taxas de juros moderadas e amplo acesso ao crédito. Mesmo assim, depois de duas décadas, o balanço dessa experiência ultraliberal deixa muito a desejar1.
Como era de prever o comercio exterior do país cresceu significativamente no período e passou – em termos absolutos – de 60 bilhões de dólares, em 1994, para US$ 400 bi, em 2013. Mas nesse mesmo período, a economia mexicana teve um crescimento médio anual pífio, de 2,6%, sendo o crescimento per capita de apenas 1,2%. O emprego industrial cresceu de forma setorial e vegetativa, e mesmo nas “maquiladoras”, foi de apenas 20% – algo em torno de 700 mil novos postos de trabalho. A participação dos salários permaneceu em trono de 29% da renda nacional, e a pobreza absoluta da população mexicana aumentou significativamente. Por fim, ao contrário do que havia sido previsto, a economia mexicana não se integrou nas “cadeias globais de produção”. A produtividade média da economia praticamente só cresceu de forma segmentada e vegetativa, e o “investimento direto estrangeiro” (o principal “prêmio” anunciado em troca da abertura da economia) não teve nenhuma alteração significativa.
Esse balanço fica ainda mais decepcionante quando se compara o desempenho do “modelo mexicano”, com o “modelo intervencionista” da economia brasileira, no período entre 2003 e 2012. Segundo dados publicados pelo Banco Mundial2, e pelos Ministérios do Trabalho dos dois países, os números e as diferenças são realmente chocantes. 
Nesse período, a crescimento médio anual do PIB brasileiro, foi de 4,21%; o do México, de 2,92%. O crescimento total a economia brasileira foi de 42,17%; o do México, de 29,29%. As exportações brasileiras cresceram a uma taxa anual de 6,59%; as do México, a uma taxa de 5,35%. O crescimento total das exportações brasileiras foi de 65,95%; o do México, de 53,35%. As importações brasileiras cresceram a uma taxa média anual de 17,33%; as do México, a 6,75%. O crescimento total das importações no Brasil foi de 173,32%; no México, de apenas 67,54%.
Por outro lado, a renda per capita brasileira cresceu a uma taxa anual de 2,84% e a do México, 1,42%. O crescimento total da renda no Brasil foi de 28,4%, e no México foi de 14,26%. E a participação dos salários na renda chegou a 45% , no Brasil, contra 29% no México. Nesse mesmo período, o Brasil criou 16 milhões de novos empregos formais, e o México 3,5 milhões; e a pobreza absoluta foi reduzida a 15,9%, no Brasil, e aumentou para 51,3%, no México. Por fim, (pasme-se), entre 2002 e 2012, o “investimento direto estrangeiro” cresceu, no Brasil, de US$ 16,59 bilhões, para US$ 76,11 bilhões de dólares. No México, caiu de US$ 23,932 bilhões, em 2002, para U$ 15,455 bilhões, em 2012! Só para encerrar a comparação, em 2103 a economia brasileira cresceu 2,3%, (uma das maiores taxas entre as grandes economias do mundo), enquanto a economia mexicana cresceu 1,1%.
Fluxos de Investimento Direto Externo (em dólares)
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Clique para ver maior. Fonte: International Monetary Fund. Disponível em: http://data.worldbank.org/indicator/BX.KLT.DINV.CD.WD/countries/BR-MX?display=graph em 27/04/2014
Isto posto, o elogio do México deve ser considerado um caso de má fé, fundamentalismo ideológico, ou estratégia internacional? As três coisas ao mesmo tempo. Mas o que importa é o que dizem os números, e a conclusão é uma só: na última década, o “modelo mexicano” de abertura liberal, integração com os EUA, e livre comércio teve um desempenho extraordinariamente pior do que o “modelo intervencionista”, “heterodoxo” e “fechado” (segundo Financial Times e The Economist) da economia brasileira, junto com seu projeto de integração do Mercosul.


José Luís Fiori é professor titular de Economia Política Internacional da UFRJ, é Coordenador do Grupo de Pesquisa do CNPQ/UFRJ, “O poder Global e a Geopolítica do Capitalismo”,www.poderglobal.net. O último livro publicado pelo autor, O Poder Global, editora Boitempo, pode ser encontrado em nossa loja virtual. O acervo de seus textos publicados no Outras Palavras, podem ser lidos aqui. 1Vide artigo do ex-ministro de relações exteriores do México, Jorge Castañeda: “NAFTA´s mixed record”, publicado no numero da Revista Foreign Affairs,. de janeiro/fevereiro de 2014.



A diferença entre dois modelos : o Neoliberal (Europa) e o Intervencionista da América Latina

5 de Maio de 2014, 8:41, por Daniel Miranda Soares - 0sem comentários ainda

Neste artigo do The Guardian, o autor analisa as enormes diferenças existentes entre dois modelos econômicos : o Neoliberal (EUA e Europa) e o "Intervencionista" dos governos de esquerda da América Latina.
Do The Guardian   
Seumas Milne
A América Latina é a alternativa 
Não surpreende que os governantes da América Latina continuem sendo reeleitos.
Os governos do continente sul-americano atacaram a desigualdade social e racial, desafiaram a dominação dos EUA e começaram a criar uma verdadeira integração regional independente pela primeira vez em 500 anos.
Os líderes do Equador e da Venezuela entregaram enormes ganhos sociais e vão continuar vencendo eleições.
Desde a crise econômica de 2008, que expôs o núcleo podre de um modelo econômico falido, nos foi dito que não havia alternativas viáveis. Enquanto a Europa se afunda em políticas de austeridade, partidos governistas de qualquer orientação são rotineiramente rejeitados pelos eleitores desiludidos, apenas para serem substituídos por outros que aprovam mais cortes sociais, promovem mais privatizações e aumentam a desigualdade.
Então como devemos analisar uma parte do mundo onde os governos resolutamente viraram as costas para esse modelo, reduziram a pobreza e a desigualdade, reergueram indústrias, proveram mais recursos de controle corporativo, expandiram maciçamente os serviços públicos e a participação democrática, continuam recebendo apoio e são reeleitos em  eleições ferozmente contestadas?
Isso é o que vem acontecendo na América Latina há uma década. Um líder político, para sublinhar a tendência, é o economista radical Rafael Correa, reeleito como presidente do Equador, enquanto o seu partido ganhou uma maioria absoluta no parlamento. O Equador agora faz parte de um padrão bem estabelecido. 
Em outubro passado, o tão vilipendiado mas imensamente popular Hugo Chávez, que retornou para casa na segunda-feira após dois meses de tratamento contra o câncer em Cuba, foi eleito presidente da Venezuela, com 55% dos votos, e reeleito após 14 anos no poder em uma eleição apontada como fraude pela Grã-Bretanha e os EUA. À recondução de Chaves se seguiram a reeleição, na Bolívia, de Evo Morales, o primeiro presidente indígena da América Latina, em 2009; a eleição da sucessora de Lula, Dilma Rousseff no Brasil em 2010; e de Cristina Kirchner, na Argentina, em 2011 .
Apesar das diferenças, não é difícil perceber porquê a América Latina foi a primeira a experimentar o impacto desastroso do dogma neoliberal e a primeira a revoltar-se contra ele. Correa foi originalmente eleito na esteira de um colapso econômico tão devastador que um em cada  dez equatorianos deixaram o país. Desde então, a sua "revolução cidadã" cortou a pobreza em quase um terço e a extrema pobreza em 45%. O desemprego foi reduzido, enquanto a segurança social, a saúde e a educação gratuitas foram rapidamente expandidas - incluindo o ensino superior gratuito, agora um direito constitucional -, enquanto a terceirização de serviços foi banida.
E isso foi conseguido não só por usar a limitada riqueza do petróleo para beneficiar a maioria, mas fazendo as corporações e os ricos pagarem os seus impostos (as receitas quase triplicaram em seis anos), aumentando o investimento público para 15% da renda nacional, estendendo a propriedade pública, a renegociação de contratos de petróleo lesivos aos interesses do país e revisando a regulação do sistema bancário para apoiar o desenvolvimento.
São muitas das coisas que, de fato, de acordo com a ortodoxia convencional de "livre mercado", que insiste em levar à ruína, mas, pelo contrário, entregaram um rápido crescimento e o progresso social. O governo de Correa também fechou a base militar dos EUA em Manta (ele afirmou que reconsideraria a sua decisão se for permitido ao Equador  "colocar uma base militar em Miami"), expandiu os direitos humanos e especialmente dos povos indígenas e adotou uma das mais radicais políticas de meio ambiente do mundo. Foi aprovada a iniciativa Yasuni, ao abrigo do qual o Equador renuncia ao seu direito de explorar petróleo em uma parte exclusiva de biodiversidade da Amazônia em troca de contribuições internacionais para projetos de energia renovável.
Mas o que está acontecendo no Equador é apenas parte de uma onda progressiva que varreu a América Latina, já que os governos socialistas democráticos atacaram a desigualdade social e racial, desafiaram a dominação dos EUA e começaram a criar uma verdadeira integração regional independente pela primeira vez em 500 anos. E, dado que a maioria foi reeleita, não é surpreendente que continuem recebendo votos para continuarem no poder.
A aprovação nas urnas diz mais sobre os meios de comunicação ocidentais (e os seus homólogos latino-americanos da elite) que retratam os governos do Equador e da Venezuela como ditatoriais. A hostilidade dos EUA é parte desse embuste da mídia que, no caso do Equador, também tem sido alimentada pela fúria com a decisão de Correa conceder asilo ao fundador do WikiLeaks, Julian Assange, que enfrenta acusações de agressão sexual na Suécia, com a ameaça concreta de extradição para ser processado nos EUA. Na realidade, a ameaça antidemocrática real vem de aliados do próprio EUA, que lançaram golpes abortados contra Chávez e Correa e golpes bem-sucedidos em Honduras em 2009 e no Paraguai no ano passado.
Claro, os governos de esquerda da América Latina conservam falhas que vão desde a elevada corrupção e criminalidade. No Equador e em outros lugares, as tensões entre as exigências desenvolvimentistas, o meio ambiente e os direitos indígenas aguçaram  e nenhuma dessas experiências ainda oferecem qualquer tipo definitivo de alternativa social ou econômica a outros modelos.
Há também uma questão para ser determinada que reside em saber se a dinâmica de mudança continental pode ser mantida, agora que Chávez, que a liderou, deverá dar posse ao seu sucessor, o ex-sindicalista Nicolás Maduro , e se este está em uma posição forte para ganhar novas eleições. Mas, provavelmente, nem ele e nem o carismático Correa  serão capazes de igualar o papel regional catalítico de Chávez.
Enquanto enfrenta um certo descrédito de outras nações que têm pouco a oferecer, a transformação da América Latina é, no entanto, profundamente enraizada e popular. Para o resto do mundo é um absurdo imaginar que, cinco anos depois da crise, nada pode ser feito, além do mais do mesmo. Na verdade, estas são as economias e sociedades em um estágio de desenvolvimento muito diferente e as suas experiências não podem simplesmente ser replicadas em outros lugares. Mas os países latino-americanos certamente estão mostrando que  existem várias alternativas ao masoquismo neoliberal que também ganham eleições.