Fri, 02 Aug 2013 01:21:30 +0000
1 de Agosto de 2013, 19:21 - sem comentários aindaA ferida narcísica: primeiro olhar
Posted: 28 Jul 2013 08:00 PM PDT
A lenda conta que Narciso tomou por outra pessoa seu reflexo em um lago e enamorou-se dessa imagem. Ao tentar beijar o objeto de seu amor, caiu na água e morreu afogado, o otário. Essa é a base mítica daquilo que é denominado “ferida narcisíca”, algo que interessa a todos nós.
Interessa sim, pois provavelmente você ainda não a sentiu o suficiente
Narciso, pintura atribuída ao pintor Caravaggio, pintado entre 1597 e 1599
Uma forma bem fácil de explicar a ferida narcísica é dizer que as três principais feridas da humanidade ocorreram nos últimos séculos: com Copérnico, descobrimos que não somos o centro do universo; com Darwin, descobrimos que somos apenas chipanzés superdesenvolvidos — com Freud, descobrimos que nossas atitudes nobres mal ocultam nossos instintos primitivos.
A cada descoberta, o Narciso-Humanidade mergulhou no lago e viu que aquela imagem projetada na superfície não passava de uma miragem. Apesar da decepção, a cada mergulho afogaram-se suas ilusões e o homem emergiu fortalecido.
(fortalecido sim, pois há uma grande potência em descobrir o quão pouco se pode)
Assim como a humanidade, cada ser humano, em sua vida íntima, depara-se com a ferida narcísica ao perceber que seus melhores sonhos, maiores vaidades e mais queridas expectativas não correspondem em absoluto à realidade. Na verdade, quase sempre que algo nos incomoda no cotidiano é porque, no fundo, levantaram a casquinha da ferida e cutucaram justo lá, onde a pele é bem vermelha e mais sensível.
Mas isso é bom.
É uma oportunidade e tanto de realmente evoluir. É essencial que Percival reconheça a ferida de Anfortas. Afinal, um homem comum que se julga gigante vê um objeto longínquo e supõe que basta esticar o braço para alcançá-lo. Esse gesto, contudo, será obviamente em vão. Porém, se tiver a sorte de decepcionar-se e descobrir que não passa de um homem com estatura normal, poderá ir até o objeto e efetivamente agarrá-lo, nem que para isso precise caminhar um bocado.
Caminhar um bocado sim, pois é a planta do pé firmada no chão batido que nos permite seguir com a cabeça erguida
Toda vez que alguém falece em nossa família, sofremos uma ferida narcísica, pois temos a consciência do quão pouco podemos diante de um destino que parece, sejamos sinceros, aleatório e inclemente. Nossa incapacidade de, às vezes, aliviar a dor de um ente querido revela o quão nossa própria condição humana é frágil.
Mas nem todo mundo nasceu para ver e — principalmente — entender Gritos e Sussurros. Desse modo, se quisermos, podemos ignorar a lição e narcotizar nossa consciência com alguma distração. Mas, agindo assim, continuaremos para sempre crianças perdidas.
Crianças perdidas sim, pois só um adulto sabe dar valor ao poder que emerge de cada derrota
“Eu não quero mais ser criança!”
Toda vez que algo ou alguém nos rejeita, seja em uma entrevista de emprego, em uma amizade proposta, em um flerte ensaiado, em uma prova de capacidade ou em um concurso público, mergulhamos novamente no lago.
É quando mais um pouco do Narciso morre e, se formos perspicazes, o que emergirá será alguém mais desperto.
Aprenderemos que o universo não é um espelho pronto para refletir nosso ego — esse pequeno ego que, nas palavras de Muriel, deveria apenas operacionalizar nossa relação com o mundo circundante, ao invés de agir como déspota de nossa psique, como reizinho mimado e arrogante.
Bom, nada melhor para destronar esse tirano do que um banho no lago onde está a verdade, pois a cada mergulho ele perde um pouco de seu mando.
Perde um pouco de seu mando sim, pois percebemos que a vida é muito maior que nossos desejos
Por isso (ah, e era aqui que eu queria chegar!), caso façamos o dever de casa direitinho, atingiremos certa idade na qual se desenvolver é um processo automático, exercendo uma força gravitacional sobre nossas escolhas.
Não há decepção que não seja, a par toda tristeza inerente, um degrau a mais em que nosso pequeno ego esmorece e é deixado para trás. E esse esmorecer é sempre uma espécie de vitória sobre si mesmo. A partir de então, sempre que somos feridos, algo em nós sorrirá gentilmente, por saber que se trata de uma oportunidade de ouro para fazer brotar uma consciência maior.
Eu ouso até dizer que há um momento de nossas vidas no qual passamos a procurar a desordem, o caos e o problemático, não por masoquismo, mas por termos aprendido que, a cada queda, o que morre era destinado a assim morrer, e o que se ergue é o que tinha de assim nascer.
Tinha de nascer sim. E a tudo que nos derruba devemos um “muito obrigado”
E àqueles que nos derrubaram ou ainda vão derrubar, devemos um dia dizer: “é uma pena que você jamais venha a dar-se conta do quão longe fui graças ao que ocorreu, pois há certas distâncias que seu olhar simplesmente não pode alcançar e, aqui do alto onde estou, tudo tem outra proporção”.
Fri, 02 Aug 2013 01:18:37 +0000
1 de Agosto de 2013, 19:18 - sem comentários ainda
Leandro Fortes: De volta à Idade Média |
Leandro Fortes no Facebook
Eu, simplesmente, não consigo ter esperança em um mundo ainda povoado por peregrinos.
Passei esses dias no Rio, caminhei na rua com eles, dividi um vagão de Metrô cheio de ataques e gritinhos de amor clerical, um tormento incessante do Centro a Copacabana.
Um bando de bobos tocados alegremente como gado, movidos por essa euforia histérica da fé sob medida para os telejornais, perdidos numa irracionalidade vendida como grandeza de espírito, compelidos à superficialidade das rezas, dos terços, das novenas – essas formas mais do que manjadas de se omitir achando que se está, de fato, contribuindo por um mundo melhor.
Depois, o papa no Fantástico, na TV Globo. O furo mundial mais previsível de todos os tempos: Francisco na emissora de televisão mais poderosa da América Latina, este continente contra qual a igreja católica novamente se volta, claro, em nome dos pobres, justamente para que os governantes escolhidos por eles não se intrometam na agenda dos ricos.
Pois minha única ambição nessa área, como jornalista, seria a de entrevistar o anticristo naquela lama que, ironia divina, convencionou-se chamar de Campo da Fé.
Fri, 02 Aug 2013 01:17:04 +0000
1 de Agosto de 2013, 19:17 - sem comentários ainda
“Se não viabilizarmos uma constituinte, entraremos numa crise política prolongada”by luizmullerpt |
Para João Pedro Stedile, a mobilização popular por reforma política e conquistas sociais deve continuar para arrancar uma constituinte exclusiva que faça as reformas necessárias
Pescado do Brasil de Fato
Em junho, no auge dos protestos que sacudiram o país, o Brasil de Fato publicou uma entrevista com João Pedro Stedile, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e membro das articulações dos movimentos sociais brasileiros por mudanças sociais, para fazer um balanço e entender o significado daquele momento.
Agora, passado um mês daquele momento histórico, e após a realização do dia nacional de paralisações, convocado pelas centrais sindicais e pelos movimentos sociais, publicamos nova entrevista com Stedile. O dirigente acredita que está definitivamente enterrada qualquer possibilidade de mudança política através do atual Congresso. E ele é taxativo: “Se não viabilizarmos uma assembleia constituinte, entraremos numa crise política prolongada, cujos desdobramentos ninguém sabe como acontecerão”.
Brasil de Fato – Passado o primeiro mês das grandes mobilizações e da paralisação de 11 de julho, que balanço você faz?
João Pedro Stedile – O resultado das grandes mobilizações ocorridas em junho é extremamente positivo. A juventude passou a limpo a política institucional e rompeu com a pasmaceira da política de conciliação de classes, em que se dizia que todos ganhavam. Depois, tivemos a paralisação nacional do dia 11 de julho – organizada pelas centrais sindicais e pelos setores organizados da classe trabalhadora – que apesar da manipulação da imprensa burguesa foi realmente um sucesso. A maior parte da classe trabalhadora nos grandes centros do país não foi trabalhar. E seguiu-se em muitas cidades mobilizações representativas ou massivas, por demandas locais, contra a prepotência da polícia, contra os governos locais, como o caso do Rio de Janeiro, Vitória, Porto Alegre, etc. Tudo isso recolocou as massas em movimento atuando na luta política concreta e usando as ruas como espaço de disputa.
E qual o significado disso do ponto de vista programático?
Do ponto de vista programático, estamos assistindo a uma conjugação de dois polos: de um lado a juventude contestando a forma de fazer política, a falta de representatividade do Congresso, do poder Judiciário e governos. Desnudando a gravidade da crise urbana, na situação dos transportes e a vida nas cidades. E fazendo a crítica à Rede Globo e apoiando a democratização dos meios de comunicação. E de outro lado, com a entrada em cena dos setores organizados da classe trabalhadora, foi posto na agenda as demandas por reformas estruturais, relacionadas com as necessidades socioeconômicas de todo o povo. Como é a garantia dos direitos sociais, contra a lei de terceirização e precarização das condições de trabalho, pela redução da jornada de trabalho e o fator previdenciário. Também a pauta da soberania nacional contra os leilões de petróleo e a pauta da política econômica, contra as altas taxas de juros, por uma reforma tributária, que revise inclusive a política de superávit primário que vem sendo aplicada desde o governo FHC.
Por que a proposta da presidenta Dilma de realizar uma constituinte e um plebiscito não prosperou?
A presidenta Dilma sentiu o barulho das ruas e num primeiro momento apresentou a proposta de realização de uma constituinte e a convocação de um plebiscito oficial para consultar o povo sobre essas mudanças. Foi uma boa iniciativa, apesar de que o plebiscito proposto estava relacionado a pequenas mudanças eleitorais, que não tinham uma relevância maior de reforma política. Mas, por incrível que pareça, ela foi boicotada e derrotada. Primeiro por sua base parlamentar, que na verdade não é base do governo, é base das empresas que financiaram suas campanhas. Segundo, foi boicotada pelo PMDB e por parte da própria bancada do PT. E assim está definitivamente enterrada qualquer possibilidade de mudança política através do atual Congresso. Ou seja, se comprovou, mais uma vez, que ninguém corta seus próprios privilégios. Pior. Em meio a toda essa mobilização, os principais representantes dos poderes constituídos se comportaram com escárnio frente às demandas das ruas, ao usar os jatinhos da FAB para ir a festas e jogo da seleção. E as maracutaias do presidente do STF com suas mordomias, sua promiscuidade com a Globo, empregando um filho, e a denúncia de que recebeu mais de 500 mil reais sem trabalhar da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Tudo isso deixou a presidenta derrotada politicamente. Acho que seu futuro depende agora de muita coragem. Primeiro deveria fazer uma reforma ministerial para trocar imediatamente vários ministros da área política, Casa Civil, da Justiça e da Comunicação que ainda não escutaram as ruas… E dar uma prova de que quer mudar. Se afastar o mais rápido possível do PMDB e seguir ouvindo as ruas!
Como você vê o comportamento e os objetivos da burguesia brasileira frente a essas mobilizações?
Os setores organizados da burguesia brasileira e que a representam nos mais diferentes espaços também ficaram atônitos diante das mobilizações, sem saber o que fazer e tateando suas táticas. Vejam a própria postura da Globo como foi se alternando ou as orientações que davam para suas polícias militares. Eles continuam divididos. Uma parte continua apoiando o governo Dilma, embora preferisse que o Lula voltasse para dar mais segurança ao pacto de classes que se estabeleceu em 2002. E outra parte da burguesia, mais ligada ao agronegócio e ao setor rentista do capital financeiro, se articula em torno de um único objetivo: desgastar ao máximo o governo Dilma para colher os frutos nas eleições de 2014. Porém, eles ainda não têm um candidato que consiga representar seus interesses e ao mesmo tempo capitalizar os desejos de mudança das ruas. Até porque eles não são a mudança, eles são o retrocesso, a volta aos programas neoliberais e a maior dependência do Brasil aos interesses estrangeiros. Eles vão continuar tentando motivar a juventude para que coloque temas reacionários ou utilizar o 7 de setembro para exaltação da pátria, como faziam no passado. Mas, para nossa sorte, acho que eles também estão mal na foto, como diz o ditado. E a juventude não entrou nessa. E com a entrada da classe trabalhadora em cena, se colocaram temas da luta de classe na rua.
O que deve acontecer nas ruas daqui para frente?
É muito difícil prever o desdobramento. É certo que as mobilizações vão continuar. Tanto de maneira pontual contra questões locais, como o caso do governador do Rio de Janeiro, os pedágios de Vitória, a luta pela tarifa zero, que só está começando… E os setores organizados da classe trabalhadora já se programaram para diversas mobilizações durante todo o mês de agosto. Dia 6 de agosto teremos manifestações dos setores sindicais, na frente de todas as sedes patronais, contra o projeto de terceirização e pela redução da jornada de trabalho. Na semana de 12 de agosto, teremos uma grande mobilização dos jovens estudantes, por temas relacionados com a educação. Dia 30 de agosto está marcada nova paralisação nacional com a mesma pauta política e econômica da mobilização do dia 11 de julho. Tenho certeza que essa paralisação será ainda mais significativa. E na semana de 7 de setembro teremos mobilizações contra os leilões do petróleo, da energia elétrica, as mobilizações do grito dos excluídos que envolvem as pastorais das igrejas etc. Assim, teremos um agosto muito ativo. Mas o principal é que consideramos que está se abrindo um novo período histórico de mobilizações de massa, que será prolongado, até que se altere a correlação de forças políticas na institucionalidade.
E qual é a proposta dos movimentos sociais frente a essa situação?
Frente a essa conjuntura, temos discutido nos movimentos sociais e realizado inúmeras plenárias locais, estaduais e nacionais dos mais diferentes espaços para ir acertando os passos unitários. Achamos que devemos estimular todo tipo de mobilização de massa nas ruas, como já descrevi sobre o mês de agosto. E por outro lado, a única saída política a curto prazo é lutarmos pela convocação de uma constituinte exclusiva para promover as reformas políticas que abrirão espaço para as necessárias reformas estruturais. Como o Congresso não quer constituinte e derrotou o próprio governo, cabe às forças populares se mobilizarem e convocarem por conta própria um plebiscito popular que pergunte ao povo uma única questão: você acha necessário uma assembleia constituinte exclusiva para realizar as reformas? E com esse plebiscito popular, organizado por nós mesmos, colher milhões de votos, por exemplo, entre setembro e novembro, e aí fazer uma grande marcha a Brasília e entregar ao parlamento a proposta, para que eles convoquem a eleição dos constituintes junto com a eleição de 2014. E aí teríamos o Congresso temporário, funcionando, e outra assembleia constituinte que teria, por exemplo, seis meses (durante o primeiro semestre de 2015) para promover as reformas que as ruas estão exigindo. No próximo dia 5 de agosto, realizaremos uma plenária nacional de todos os movimentos sociais brasileiros, para debater essa e outras propostas e aí darmos os encaminhamentos necessários. Espero que os dirigentes que por ventura lerem essa entrevista se motivem a participar dessa importante plenária que será realizada em São Paulo.
Mas você acha que essa proposta tem viabilidade política?
Nesse momento estamos fazendo muitas consultas entre os movimentos sociais, correntes partidárias, forças populares e a aceitação é muito grande. Se conseguirmos organizar um plebiscito popular e ele recolher milhões de votos, isso será a pressão para encontrar uma saída política. Se não viabilizarmos uma assembleia constituinte, entraremos numa crise política prolongada cujos desdobramentos ninguém sabe como acontecerão. Até porque as eleições de 2014 não vão resolver os impasses colocados nas ruas.
Fri, 02 Aug 2013 01:11:53 +0000
1 de Agosto de 2013, 19:11 - sem comentários ainda
De rabo preso com a corrupção: Berzoini critica blindagem da Folha a Alckmin |
Deputado federal Ricardo Berzoini (PT/SP) questiona publicação de reportagem sobre propinoduto no Metrô paulista na editoria Cotidiano da Folha de S.Paulo na segunda-feira, dia 29, e observa que o texto “não cita o nome de ninguém do governo tucano”. Em suas últimas duas edições, a revista IstoÉ deixou clara a participação dos governos Geraldo Alckmin, José Serra e Mário Covas no esquema de superfaturamento de obras e propina: “Nunca vi nada igual! Rabo preso com o PSDB?”, questiona o parlamentar.
Via Brasil 247 e lido no CNN
“A Folha de S.Paulo, primeira a noticiar o esquema de superfaturamento e propina em obras do Metrô paulista, a partir do caso Siemens, voltou ao assunto na segunda-feira, dia 29. Mas como bem observou o deputado federal Ricardo Berzoini (PT/SP), o jornal publicou sua reportagem sobre o caso na editoria Cotidiano, em vez de “Poder”, e sem citar qualquer participação dos governos tucanos do Estado de São Paulo.
“Folha noticia caso do superfaturamento do Metrô de São Paulo na editoria de Cotidiano! E não cita o nome de ninguém do governo tucano”, escreveu o parlamentar em sua conta no Twitter na manhã de segunda-feira, dia 29. “Nunca vi nada igual! Rabo preso com o PSDB?”, questionou ainda Berzoini. Como noticiou o 247 no último sábado, dia 27, a Folha que, curiosamente, iniciou a divulgação do caso, havia tirado seu time de campo, sem mais voltar ao tema.
Na reportagem de hoje, o jornal da família Frias noticia que a Siemens, empresa que delatou um esquema de cartel da qual fazia parte, irá devolver aos cofres públicos o dinheiro das licitações pelas quais foi beneficiada. A multinacional alemã admitiu devolver parte do valor que teria sido superfaturado no fornecimento de equipamentos em São Paulo. Na segunda matéria sobre o caso, assinada pela jornalista Cátia Seabra, o veículo também não cita o nome do governador Geraldo Alckmin (PSDB).
Conforme mostraram as duas últimas reportagens de capa da revista IstoÉ, o esquema de superfaturamento e propina nas obras do metrô e dos trens metropolitanos, segundo o depoimento de um ex-funcionário da Siemens, tinha a participação de autoridades dos governos estaduais, que também eram beneficiados. Segundo a IstoÉ, foram desviados R$50 milhões nos governos de Alckmin, mas também de José Serra e Mario Covas. O atual governador será até alvo de uma ação de improbidade.
Na segunda reportagem sobre o caso, a revista informa, com base em documentos aos quais teve acesso, que houve superfaturamento de no mínimo R$425 milhões no metrô paulista durante os sucessivos governos do PSDB nos últimos 20 anos, esquema que contou com a participação de autoridades e servidores públicos. Voltando às questões feitas pelo 247 no sábado, dia 27, por que então a Folha sequer citou o nome de um dos três governadores? E por que Geraldo Alckmin está sendo blindado pela grande imprensa?
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Fri, 02 Aug 2013 01:10:27 +0000
1 de Agosto de 2013, 19:10 - sem comentários ainda
O romance-manifestação: “Manual da Destruição”, de Alexandre Dal Farraby alfredomonte |
“… seria melhor o grito. seria melhor não haver as palavras, só o grito, o grito desarticulado, sem lembranças, sem marcas. todas as palavras são marcas que carregam diversas outras coisas além do que elas descrevem agora. as palavras vêm sempre maculadas do que elas já disseram antes, são palavras velhas de merda e se conectam todas com as fotos tiradas posteriormente pelo cérebro. palavras filhas da puta, marcadas pelo passado escroto!seria preciso ficar só no grito, só o grito, o grito, o grito, eu sinto a gosma que reviveu dentro de mim e quer se tornar grito sem palavras…”
(uma versão da resenha abaixo foi publicada em A TRIBUNA de Santos, em 30 de julho de 2013)
A ficção brasileira atravessa um momento de efervescência qualitativa. As ruas do nosso país também viveram recentemente um estimulante sopro de insurreição. Talvez o romance com maior vocação de ficar como o registro arquetípico desse período turbulento e prenhe de possibilidades seja Manual da Destruição[1].
Testemunhei a reação de certos leitores à estreia do ator e dramaturgo paulista Alexandre Dal Farra no gênero[2]: um horror ao uso contínuo, quase que frase a frase, do “palavrão” (exemplo: “as pessoas abrem as bocas e soltam as palavras pelo ar, não ficam quietas, bando de gente filha da puta e barulhenta do caralho! todas as pessoas são filhas da puta. ao lado das fileiras de cadeiras há as lixeiras com as tampas metálicas. o menino atirou os restos do sorvete dentro da lixeira. moleque de merda. a tampa balança como um pêndulo e some com os restos do moleque imbecil. e o menino filho da puta continua caminhando como se não tivesse acontecido merda nenhuma! os restos foram engolidos e sumiram debaixo da tampa automaticamente, e o menino não entrou em contato com o lixo escroto que ele produziu… ele não entrou em contato com o lixo que o seu corpo criou, que é a única merda que ele deixa para o mundo…”). Considero descabida tal rejeição (um pouco como a dos que vinculam manifestações de rua com baderna e vandalismo), agarrando-se a hierarquias de uma linguagem mais ou menos “nobre” e desconsiderando que existe não só uma verbalização maciça (e muito presente em nossas vidas) nesse sentido, uma espécie de mantra, de linguagem que beira o interjeitivo e fornece válvula de escape ao tropel emocional inarticulado, como também um fluxo de consciência das pessoas estruturado dessa forma, pois esse recurso ao dito “palavrão” (escroto, filho da puta, caralho, merda, porra, puta que o pariu, e por aí vai) é uma forma de reação instintiva ao contato nu e cru com o mundo, e não tem nada a ver com escolaridade ou educação.
Nesse sentido Manual da Destruição pode ser tomado como uma realização notável e exemplar, pois praticamente enciclopediza essa feição psicolingüística (perdoem-me o pedantismo) ao fazer dela a instância verbal predominante, radicalmente utilizada, de atrito entre seu narrador e a realidade à sua volta[3].
O livro é dividido em duas partes: na primeira, o protagonista regressa de uma viagem e narra sua reacomodação ao cotidiano, mantendo-nos no campo de visão de cada instante de uma forma opressiva, minando o sentido de tudo (há passagens que beiram o alucinatório, bem na tradição de um Graciliano Ramos, em Angústia, e de um Rosário Fusco, em O Agressor, duas apreensões extremas —e raras na nossa ficção— do mal estar de viver numa sociedade injusta e discriminatória, e ao mesmo tempo de não encontrarmos em nós estofo muito diferente das outras pessoas que sustentam tal status quo). Pois que ser razoável poderia achar que viver é isto: “eram dezenas de coreanos imitando coreanos, ouvindo músicas e vendo filmes, comendo e vendendo coisas fake ao longo do dia naquele buraco de fórmica… e me dirigi à lan house de merda. entrei na lan house empurrando a porta de plástico transparente que disparou um alarmezinho irritante para avisar que alguém tinha entrado…”?
Na segunda parte, ele está no aeroporto, com viagem marcada para Belém do Pará e além do que vê ao seu redor (com cenas geniais, como aquela em que é interpelado por uma indignada cidadã, ao jogar papel no chão ou aquela em que defronte ao espelho ele ataca violentamente a si mesmo), é acossado por memórias não-desejadas, contudo coercitivas (“as lembranças do passado de merda ficam nas nossas cabeças e não servem para porra nenhuma. eu fico lembrando das coisas, e acho isso uma merda, principalmente se as coisas que eu lembro têm a ver com a porra da rachadura na parede da casa da minha avó…”; a certa altura lemos: “tenho raiva desse mecanismo do meu cérebro,e tenho raiva particularmente da maneira como ele liga as memórias entre si, criando tramas infinitas em que eu me enredo e fico fora do lugar onde estou!(…) estou sentado na frente do meu portão de embarque onde há os animais escrotos esperando para ir viajar, e decidi lembrar de alguma merda, não importa o quê. estou me esforçando para lembrar de algo que não venha da minha relação orgânica com a vida, que não emerja da merda da situação de agora que me remete às outras merdas…”).
Portanto, temos um mesmo sentimento de revolta e insatisfação, de sensação de panela de pressão ou granada prestes a explodir, que deram azo às manifestações de junho, vazados numa linguagem poderosa e sem concessões, onde as relações “humanas”, as trocas e contatos diários em meio à falida infraestrutura urbana[4], são esquadrinhadas, maceradas e reduzidas a um diagnóstico não muito distante do “Eclesiastes”, mas sem nenhuma possibilidade de transcendência: “todos os seres humanos são filhos da puta, mesmo que eles não sejam”.
Pena que, se é agudíssimo e acurado em sua ferocidade na maior parte do seu texto, Dal Farra cometa o erro de terminar tanto ambas as partes com situações melodramáticas (um acidente de trânsito e um espancamento)[5], totalmente desnecessárias e fora do espírito da sua narrativa. Mesmo com essas soluções infelizes e discutíveis, Manual da Destruição já é um dos livros da década.
TRECHO SELECIONADO
“estou sozinho dentro do banheiro do aeroporto de merda. caminho até encostar a cintura na pia e vejo a minha cara estúpida no espelho, e ela não tem nada a ver com nenhuma das lembranças de merda nem com nada do que existe dentro da minha cabeça. é só uma cara idiota, igual ao que ela já era antes. vejo no espelho como o meu rosto é o mesmo, o mesmo rosto que eu já vi outras vezes nos espelhos de merda. sempre a mesma imagem refletida. mas o meu rosto não é sempre o mesmo. percebo isso por dentro. o rosto filha da puta finge que é o mesmo por fora, quando está na frente do espelho de merda, mas de dentro eu sei que ele não é o mesmo. sinto as mudanças na carne, pelo lado de dentro, retiro os meus óculos e olho para a minha cara monótona no espelho. ligo a torneira de merda e enfio as mãos embaixo da água (…) gostaria que a água passasse da pele e entrasse por dentro da minha cara. gostaria de jogar água por dentro, diretamente no meu cérebro. gostaria de poder resfriar os órgãos todos por dentro. enfio os dedos molhados dentro dos olhos e procuro enfiar água em todos os buracos do rosto (…) vejo pelo reflexo o velho. o velho entrou no banheiro de pulôver marrom. ele procurou não olhar muito para mim pelo espelho (…) eu estava olhando para mim mesmo com ódio. o velho viu isso. disfarcei e apertei ainda mais os dentes, e dou um jeito de me machucar um pouco enquanto o velho está dentro do compartimento de fórmica. enfio dois socos no meu próprio estômago, e torço para o velho ser surdo. ele se enfiou em um compartimento de merda e eu aproveito para socar meu próprio estômago. sinto a minha mão fechada socar a minha barriga, sinto a dor e dou mais [no livro impresso está “mas”] sete socos no um estômago com toda a força possível, apesar da posição, até que o meu braço fica um pouco cansado. enfio ainda mais três socos com toda a força possível no mesmo ponto que já estava doendo. sinto o estômago quase rasgar com os socos que eu enfiei em mim com toda força e sem nenhum prazer. enfio os meus óculos de volta na cara…”
[1] Dou-me conta de que a afirmação no texto acima pode dar a indicação equivocada de que o livro se destinaria a ficar “datado”. Embora seja o livro adequado, perfeito e obrigatório para este nosso Zeitgeist em polvorosa, é evidente que o livro possui as qualidades suficientes para sobreviver a ele.
[2] Não é ocioso lembrar que na Grã-Bretanha dos anos 1950 apareceram os “angry young men”: oriundos especialmente dos meios cênicos. Dal Farra, que está com 31 anos, nessa linha de pensamento pode ser considerado um “angry young man”, inclusive por seus objetivos estéticos. Acho que os “angry young men” estavam fazendo falta num panorama literário dominado por jogos metalinguísticos e uma sensação de anomia irritantes. Ainda bem que na edição da GRANTA dos jovens escritores brasileiros, tivemos alguns exemplos nessa linha mais “angry”, como Vinicius Jatobá, Christiano Aguiar e Javier Arancibia Contreras (pelo menos, na amostra ali publicada), ainda bem que temos um Diego Moraes, um Roberto Menezes e, em certos aspectos da sua obra, Ricardo Lísias (mesmo na sua recente “autoficção”).
É bom que ainda se escreva raivosamente trechos como aquele em que o narrador está ouvindo o primo, que o levou até a fábrica de tubos onde trabalhara: “…ele fingia que se portava como um trabalhador orgulhoso da sua produção, mas era só um fodido estropiado do caralho, que só se deu mal na vida e cuja energia toda tinha sido arrancada em função dos canos e principalmente da riqueza que os canos geravam, e isso era terrível demais para o meu primo perceber. as palavras que saíam da boca escrota do meu primo, do meio dos seus dentes meio podres (…) todas as merdas que ele expleia com o seu bafo podre não tinham significado nenhum e eram tristemente inócuas e nulas frente ao tamanho do cano, ao seu movimento lento e contínuo, e ao leve calor que ele exalava. senti o cheiro de borracha queimada e vi a fumaça que o cano expelia quando saía de dentro da máquina. as palavras mortas da boca podre do meu primo de segundo grau estavam maculadas pelo bafo da inutilidade do seu ser, e da sua pequenez frente ao cano. as palavras do filho da puta não significavam absolutamente nada porque ele não conseguia encarar o seu não pertencimento à bosta toda e não era capaz de sentir o ódio e o desespero que lhe seriam adequados. o seu corpo não suportava…”
[3] Quando uso o termo “enciclopediza”, é porque tenho uma visão do romance como forma enciclopédica da realidade humana: sua vocação mais autêntica é mapear e absorver,mesmo na sua condição “pós-moderna”, mais fragmentária e avessa à totalidade.
[4] “… o garçom ficava feliz de ser simpático com as pessoas que tinham cartões de crédito. supostamente todos os filhos da puta sentados no bar de merdas tinham cartão de crédito, ele se aproximava das pessoas e ficava orgulhoso de lidar com os cartões delas, ele lidava de maneira eficiente com os cartões de crédito e por isso se orgulhava de ser um garçom de merda, o filho da puta!(…) me levantei da frente da mesa de madeira e recebi o cartão das mãos do garçom filho da puta e simpático, ele entregou a merda do cartão para mim o mais rápido possível e não fez nenhum comentário estúpido, o garçom eficiente e simpático percebeu que só lhe restava me dar logo a merda do cartão e se resignar a ter sido só um bosta de um garçom mesmo, que cobrou a porra da minha conta, ele não foi nada mais do que o garçom da merda do bar e eu fui a porra de um cliente, que merda! nós finalizamos a nossa relação como uma relação de troca, e nada mais. não se estabeleceu nenhum vínculo de merda entre dois seres humanos, nenhum vínculo de bosta entre seres humanos. não, o que houve entre mim e o garçom foi só o dinheiro que eu paguei pelo naco de carne, por meio do cartão de crédito. fiquei satisfeito por não ter estabelecido nenhum vínculo com o filho da puta do garçom, e por ter entregado a merda do meu cartão e feito ele tirar o dinheiro do meu crédito, e cobrar o que eu devia pelo pedaço de carne, sem que por isso se estabelecesse qualquer cumplicidade do caralho entre mim e ele…”
[5] Eu também não estou convencido de que todo o teor do material das lembranças e/ou onírico (há passagens em que as reminiscência confluem com imagens oníricas, como aquela evocação de dezessete cavalos espalhados mortos pelo chão num cenário interiorano) seja satisfatoriamente trabalhado. Além disso, tem a abolição completamente desnecessária da maiúscula, que não redunda em nenhum efeito particularmente novo, e fica parecendo apenas modismo (se era para radicalizar, que fossem abolidos os marcadores convencionais do discurso). E a revisão por parte da editora Hedra (diga-se de passagem, a capa escolhida para Manual da Destruição é de lascar!, completamente infeliz) deixou a desejar em alguns trechos (e o leitor percebe que se trata de uma questão de revisão, já que Alexandre Dal Farra demonstra à farta que escreve muito bem), por exemplo:
–na página 97: “a minha cintura está há [sic] menos de um metro do filho da puta”; na verdade, “a minha cintura está a menos de um metro do filho da puta”
- na página 177, o mesmo erro de colocação: “eu, há [sic] trinta metros das duzentas pessoas…”; na verdade, “eu, a trinta metros das duzentas pessoas…”