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Polaco Doido

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A Ameaça Comunista no Brasil

14 de Janeiro de 2014, 23:05 , por Desconhecido - 0sem comentários ainda | No one following this article yet.
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Relaxa e ouça aqui:

Não sei qual era a verdadeira intenção do estudante Fabrício Silva de 19 anos quando resolveu criar o evento, Golpe Comunista 2014 no Facebook. O fato é que a iniciativa foi um sucesso, quase 80 mil internautas confirmaram presença no evento, marcado para o primeiro dia de 2014 e as fortes reações dos contrários ao evento transformaram o mesmo na maior trollada que já tive o prazer de acompanhar pela rede.

É evidente que tudo não passou de uma grande piada com fins de provocar alienados e extremistas. Seria humanamente impossível aplicar um golpe de estado, uma mudança radical de regime, orquestrada por uma horda de ativistas de sofá, todos confortavelmente sentados em suas cadeiras sem um grande aporte financeiro e principalmente, sem uma substancial adesão por parte das forças de segurança. Ou será que algum dos “golpistas” imaginou enfrentar tropas de choque e fuzis com tuitadas e memes publicados nas redes digitais?

Sendo assim, o Brasil corre um risco muito maior de sofrer um golpe orquestrado pela direita tupiniquim, do que sofrer um golpe comunista nos mesmos moldes daqueles que ocorreram na Rússia em 1917 ou em Cuba em 1959.

Cuba em 1959? 

Não custa lembrar que a revolução cubana de Castro não foi um golpe comunista. Na ilha, logo depois de assumir o poder via golpe de estado, Fidel deu inicio a seu projeto de reforma agrária desapropriando terras e indenizando os proprietários pelo valor que estes tinham declarado ao fisco no ano anterior. Este valor das indenizações era muito inferior ao valor real das terras desapropriadas e provocou um grande descontentamento por parte dos mais ricos proprietários, principalmente norte americanos. Esse descontentamento levou o governo dos Estados Unidos a considerar Castro como um inimigo e, sem nenhuma alternativa, Castro se viu obrigado a aliar-se aos Russos (em plena guerra fria). O regime comunista de partido único em Cuba, só foi instalado de fato em 1961, dois anos após Castro ter assumido o poder na ilha.

Muito parecido com o que acontecia no Brasil às vésperas do golpe militar de 1964. Jango não era comunista, tão pouco, tinha uma grande adesão dos comunistas brasileiros no começo de seu governo. Porém, no inicio de 1963, quando assumiu de fato a presidência da república, tentou colocar a casa em ordem através de uma série de medidas que ficaram conhecidas como “Reformas de Base”. Entre estas reformas estava previsto um plano de Reforma Agrária no Brasil e isso, é claro, não agradou em nada as oligarquias centenárias e coronelistas brasileiras, este fato, aliado ao frisson que as reformas de base provocaram junto aos movimentos populares e de esquerda, fez com que as grandes oligarquias do país criassem um cenário fictício de que o Brasil estava na iminência de se tornar uma ditadura comunista.

Nossa nobre classe média, alienada e ignorante como é desde os tempos do império, caiu nesse conto da carochinha e com o apoio providencial da grande mídia na época (como hoje, ainda oligárquica), os donos do Brasil colocaram meio milhão de pessoas nas Marchas da Família com Deus pela Liberdade. Com este apoio “popular” mais as malas de dólares da CIA e do Tio Sam, ficou fácil comprar a adesão das forças armadas e, em 1º de abril de 1964, os militares aplicaram o golpe. Jango foi para o exílio, o congresso foi fechado, as reformas foram esquecidas e o Brasil mergulhou numa ditadura militar de 21 anos, cujos efeitos serão sentidos por algumas gerações ainda.

Apesar de os regimes comunistas terem entrado em declínio a partir 1989, com a queda do Mudo de Berlin e a guerra fria ter oficialmente acabado em 1991, o apelo à Ameaça Comunista ainda é uma falácia amplamente difundida pelas oligarquias sempre que se tentam quaisquer medidas de inclusão social que venham a cercear benesses ou diminuir os ganhos das classes detentoras do capital ou dos meios de produção.

Lembro de uma vez, numa reunião família às vésperas da eleição presidencial que elegeu Collor, uma tia muito querida surtando por causa das chances reais de Lula vencer aquelas eleições. Segundo ela, Lula usava barba para esconder a tatuagem de foice e martelo que tinha numa das bochechas.

Esta tia, de origem camponesa e continuamente explorada pelo estado e pelos donos dos meios de produção, teoricamente deveria estar na linha de frente nas lutas pela igualdade social e distribuição justa de renda, mas não, ela via em Lula uma ameaça, a ameaça comunista.

Ainda hoje, 23 anos depois do fim da guerra fria, a falácia da ameaça comunista ainda é utilizada como se fosse algo minimamente palpável. Olavo de Carvalho, em seu “exílio forjado” nas terras do irmão do norte, dia sim no outro também, inventa uma nova teoria mirabolante a respeito da ameaça comunista, das hordas petistas no comando do executivo federal e do Foro de São Paulo cujo objetivo principal seria transformar o Brasil e a América Latina toda em uma comunidade de estados socialistas stalinistas, onde não existirão mais as propriedades privadas e as liberdades individuais serão tolhidas em benefício de um estado autoritário. Lógico que os asseclas do Upa-guru replicam estas asneiras como se fossem factuais, grandes veículos de comunicação e seus articulistas dão uma cara mais requintada ou absorvível destas informações e o público as absorve como se verdades fossem.

Ora, mas será que não falta um pouco de senso crítico por parte dos consumidores deste tipo de informação?

O PT já está no comando do Executivo federal desde janeiro de 2003, 11 anos e ainda não pôs em prática a ditadura comunista em terras brasileiras?

Seria por incompetência ou porque isso não faz parte dos planos?

Lógico que se trata da segunda opção.

Os mentores do modo petista de governar sabem que qualquer choque no satus quo, qualquer proposta de Reformas de Base, fatalmente levaria o país a mais um longo período de ditadura, seja por um pouco provável novo golpe militar, seja por um golpe branco vindo do poder judiciário. Assim, o governo petista se limita aos projetos de inclusão social de pouco impacto, como a inexpressiva redistribuição de renda do programa Bolsa Família ou o sistema de cotas no ensino superior. Programas interessantes e bem vindos, mas sem nenhuma dúvida, muito aquém das reais necessidades para diminuir as desigualdades sociais e regionais no Brasil. Fica muito claro que o projeto do PT, muito mais que um projeto de desenvolvimento do estado, é um projeto de poder, duas décadas de poder, no mínimo.

São estes projetos de inclusão social de pouco impacto e as medidas econômicas acertadas que garantiram e garantem a permanência do Partido dos Trabalhadores à frente do Executivo Federal durante todos estes anos. De um lado, os menos favorecidos com sua subsistência garantida pelos programas de distribuição de renda. No meio, o grosso da população, a classe trabalhadora assalariada gozando do pleno emprego e do aumento real na renda e do poder de compra. Na outra ponta, os donos do capital e dos meios de produção com seus ânimos acalmados pelo protecionismo às necessidades e desejos dos grandes conglomerados, os financiamentos, taxas de juros estratosféricas e, claro, seus lucros pela exploração do trabalho e do capital garantidos e estimulados pelo estado. Se este modelo adotado trará resultados positivos num médio ou longo prazo, só o tempo poderá dizer. Eu aqui tenho meus receios.

Nesse furdunço sociológico de beneficiados pelo projeto petista de poder, sobram como descontentes os representantes daquilo que no milênio passado era considerado como classe média. Não a classe média moderna definida por uma simples faixa de renda delimitadora que os coloca degraus acima dos pobres e miseráveis e degraus abaixo dos muito ricos. Estes são operários ou assalariados por definição e que, nos últimos, tiveram aumentos reais e substâncias nos seus rendimentos. Me refiro à Classe Média Clássica, aqueles profissionais liberais que se acreditam bem sucedidos ou funcionários públicos de alto escalão que não se identificam com as classes operárias ou assalariadas e que nutrem o desejo de ascender de classe social, tornarem-se  muito ricos, fazer parte dos círculos da alta sociedade. Esta classe média, pequeno-burguesa, alienada por sua própria natureza, não consegue perceber o óbvio. Seus anseios de ascensão social só seria possível caso viessem a dominar o capital e/ou os meios de produção. Como o capital e os meios de produção permanecem restritos pelo próprio sistema a um número muito reduzido de indivíduos, a classe média pequeno-burguesa tem seus sonhos de ascensão social, frustrados e sem conseguir entender os reais motivos desta frustração.

Se o leitor ainda estiver lendo este texto, peço que se prepare psicologicamente para um pequeno exercício lúdico.

Imagine-se, por um breve momento, como uma famosa atriz brasileira que além de seus rendimentos como atriz de muito sucesso, também optou por continuar solteira para não perder a pensão de R$ 13.000,00/mês deixada por seu pai, um ex-funcionário público de alto escalão.

É difícil?

Então, imagine-se como proprietário de um pequeno comércio de bairro, com seu faturamento bruto beirando 70 ou 100 mil Reais/mês e seus sete ou dez funcionários assalariados e com carteira assinada.

Até o inicio deste milênio, lá pelo ano 2002, sua situação financeira não era muito diferente da atual. Contas para pagar, impostos, muito trabalho, mas uma situação financeira confortável. Dava para trocar de carro periodicamente, reformar a casa de vez em quando, viajar de férias para o exterior todo ano, matricular os filhos numa escola ou universidade particular. Nada muito diferente da situação nos dias atuais.

Porém, até o inicio do milênio, sua situação social era muito clara. Você não era muito rico, nem fazia parte da alta sociedade, mas em contra partida, havia uma clara definição social entre você e seus subalternos, entre você e aquelas pessoas das classes sociais inferiores a sua.

Hoje, seus subalternos com algum esforço, também podem ter um carro e até trocá-lo por um modelo mais novo periodicamente, têm condições de comprar uma casa, fazer reformas, viajar para o exterior de vez em quando e até, de colocar seus filhos numa universidade. Quem sabe, na mesma universidade ou curso que seu filho estuda.

A divisão de classes antes bastante rígida e clara se tornou muito tênue e você, que nutria aquele desejo de fazer parte da alta sociedade, agora se vê muito mais parecido socialmente com seus subalternos, com o proletariado, com o porteiro, com a tia do cafezinho.

Você se sente traído pelo sistema, pelo governo que propiciou a ascensão da renda daqueles inferiores a você e manteve você no mesmo patamar social de antes, do final do milênio passado.

Assim, aqueles seus anseios de subir de classe social, de fazer parte da alta sociedade, tornam-se cada vez menos palpáveis. Transformam-se num sentimento velado de ódio as classes favorecidas pelo sistema e num ódio mortal, ao governo que o esqueceu e o traiu.

Alguns representantes da classe média pequeno-burguesa, graças a alienação que lhes é natural, não conseguem entender que não houve um amplo programa nacional de ascensão social do qual eles foram deixados de fora. Não mesmo, as classes sociais continuam as mesmas de antes só que, aqueles mais miseráveis hoje são assistidos pelos programas sociais de distribuição de renda e os trabalhadores assalariados finalmente receberam aumentos reais de renda.

Com isso, aquela rígida e clara divisão de classes de antes, se transformou numa divisão de classes muito mais complexa e que não se define apenas pela saúde da conta bancária ou pela faixa salarial.

Nosso pequeno-burguês da classe média, além de traído, se sente sem chão, sem norte, sem uma definição clara de sua posição social. Isso, aliado ao ódio velado às classes mais baixas e ao ódio patológico ao governo federal é o caldeirão perfeito para cozinhar os planos da oposição para sua volta triunfal ao executivo federal. Uma oposição que sem projetos, sem planos e sem propostas coerentes, vê no denuncismo vazio e insípido sua única forma de fazer oposição e vê, no pequeno-burguês da classe média, a caixa de ressonância propagadora de todo esse denuncismo vazio e insípido.

A classe média pequeno-burguesa é sim, alienada por sua própria natureza, porém, é muito barulhenta e seu choramingar ecoa por quase todos os lugares e contamina até aqueles sem nenhuma identificação com a dita classe social.

Assim, somos todos incansavelmente bombardeados por informações que não fazem o menor sentido e, as vezes, até acabamos acreditando em factóides do tipo: “O bolsa família é eleitoreiro e só serve para sustentar vagabundo”; “O mensalão foi o maior escândalo de corrupção e desvio de dinheiro público do Brasil”; “O Auxílio Reclusão é uma bolsa-crime. Que vergonha de morar num país onde o criminoso é mais valorizado que o trabalhador”; “Copa do Mundo e Olimpíada no Brasil só trarão prejuízos e servirão para enriquecer os políticos do PT”; “Bandido bom é bandido morto” e por aí vai, até chegar ao ápice verborrágico, a ferramenta principal de convencimento desde o inicio da Guerra Fria em 1945: “As esquerdas, o Foro de São Paulo e o PT pretendem transformar o Brasil e toda a América Latina numa ditadura comunista stalinista, nos mesmo moldes daquela  que ocorreu na ex-União Soviética durante grande parte do século passado.

Depois de tudo que foi exposto, fica claro que somente um alucinado sem a mínima capacidade para analisar a atual conjuntura política, social e econômica poderia considerar a possibilidade de uma ameaça comunista no brasil.

Infelizmente, indivíduos alienados são a regra e não exceção e teremos que agüentar a ameaça de um golpe comunista no Brasil, pelo menos enquanto existir um partido ou um militante de esquerda atuando por aqui.

Polaco Doido


Fonte: http://www.skora.com.br/?p=5466

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