Segundo o Secretário Nacional de Drogas do Uruguai, Julio Heriberto Calzada, o número de mortes relacionadas ao tráfico e ao consumo de maconha no Uruguai foi reduzido a ZERO, depois de aprovada a legislação que regulamenta o consumo, a produção e a comercialização da erva naquele país.
Ainda é muito cedo para termos dados estatísticos que confirmem as teses dos contrários a regulamentação que afirmam ser a maconha uma porta de entrada para drogas mais pesadas e que devido a “liberação” da maconha no Uruguai, o país vizinho em breve trornar-se-á uma nação de drogaditos e nada mais.
Pelo menos, por enquanto, a regulamentação tem sido positiva. O número de crimes relacionados ao consumo e ao tráfico de drogas tem diminuído consideravelmente e a estrutura familiar tradicional daquele país ainda não entrou em colapso.
Neste primeiro momento, parece que alternativa da regulamentação e controle do estado a respeito do consumo e comércio de entorpecentes é muito mais benéfica para a sociedade em geral do que a simples repressão e criminalização que vinham sendo praticadas por lá.
Estimativas do Escritório das Nações Unidas sobre as Drogas e o Crime apontam que 500 pessoas morrem diariamente vítimas do consumo de drogas ilícitas, do tráfico, ou da guerra contra as drogas.
Este modelo de guerra contra as drogas que privilegia o combate aos entorpecentes ilícitos pela via criminal já está completamente esgotado. É uma guerra perdida e que deixa 185.500 vítimas por ano no mundo. Os gestores nas nações mundiais deveriam se sensibilizar com estes números e, pelo menos, buscar alternativas. Como fez nosso vizinho Uruguai.
Mas se o querido leitor, como eu, também gosta de dar um tapinha de vez em quando, não vê nenhum mal maior no consumo da maconha e está louquinho para que o Brasil adote uma lei nos moldes da uruguaia para a legalização da maconha, pode ir tirando seu cavalinho da chuva. Por aqui o buraco é bem mais em baixo.
As diferenças culturais, territoriais e populacionais entre o Brasil e o Uruguai são enormes, nossa realidade é completamente diferente e a abordagem para o problema das drogas também deve ser completamente diferente.
Para começar, estima-se que o comércio local de drogas ilícitas no Brasil gere lucros de R$ 1,4 Bilhão/ano (dados de 2009). Essa grana toda movimenta uma complexa rede de lavagem de dinheiro além também de ser o principal pilar de sustentação do crime organizado no país.
Não é preciso de muitas conjecturas para ligar o desconfiômetro e constatar que, por aqui, o crime organizado e os barões das drogas estão infiltrados nos Executivos, Legislativos e Judiciários espalhados pelo país, além também possuir tentáculos ativos nas polícias civil e militar dos estados, como também, na própria Polícia Federal.
O caso helicóptero do pó, foi muito revelador. Os dados vazados em doses homeopáticas da Operação Lava-Jato que revelam políticos e autoridades, das mais variadas correntes ideológicas, evolvidos e/ou beneficiados pela lavagem e remessa ilegal para o exterior de mais de R$ 10 Bilhões, também.
O Conservadorismo moral da sociedade brasileira, fortemente embasada em preceitos já ultrapassados do catolicismo medieval, impede que temas deste tipo sejam discutidos e analisados de maneira lúcida, coerente e factual. Para esta considerável parcela da sociedade brasileira as “drogas” ou até mesmo a inofensiva “maconha” são assuntos proibidos. Qualquer problema decorrente do uso destas substâncias só aflige as outras famílias menos estruturadas e se, por ventura vier atingir o próprio núcleo familiar do indivíduo o problema é convenientemente guardado em segredo, tratado como um assunto interno de família.
O neo-conservadorismo oportunista dos pastores, pastores-deputados e deputados das bancadas evangélicas espalhadas pelos legislativos. Estes neo-conservadores oportunistas, muito mais do que defender valores cristãos, da família tradicional ou até mesmo morais, estão interessados principalmente nas polêmicas criadas por suas declarações a respeito de qualquer assunto polêmico.
Para eles, as reações e os holofotes colocam seus nomes muito mais em evidência. Graças a estas polêmicas artificiais eles conquistam os corações e mentes de brasileiros com Elevado Índice de Conservadorismo Moral Cristão e assim, mesmo sem projetos ou propostas relevantes durante seus mandatos eletivos, a cada nova eleição vêm seu número aumentar e cada vez ganham mais espaço e relevância no teatro político do país.
Mas não para por aí.
No Brasil o consumo da maconha e de outras drogas é tolerado pelas autoridades, porém o tráfico e o plantio, mesmo que doméstico para consumo próprio é penalizado de maneira exemplar e até desproporcional. Posso até estar redondamente enganado, mas esta atitude das autoridades não penaliza muito mais o usuário e o pequeno traficante e, em contra partida,protege os grandes barões do comércio de drogas ilícitas, numa espécie de segregação institucional do mercado ilegal de drogas?
Muito mais que uma droga recreativa ou até mesmo, uma porta de entrada para outras drogas “mais pesadas” a maconha serve também como terapia auxiliar para os mais variados tipos de enfermidades, desde ansiedade até AIDS e câncer.
Psiquiatras brasileiros fizeram uma experiência interessante. Incentivaram dependentes de crack a fumar maconha durante o processo de largar o vício. O resultado foi surpreendente com 68% de sucesso nos casos analisados. Porcentagem muito superior a todos os tratamentos tradicionais utilizados atualmente.
E daí?
E daí que 90% das entidades que se prestam ao atendimento gratuito de dependentes químicos, principalmente usuários de crack, são ligadas a alguma instituição religiosa. Além disso, muitas destas entidades gozam de um benefício público no mínimo intrigante. Elas recebem títulos de Entidade de Utilidade Pública dos governos Federal, Estaduais e Municipais e que, entre outros, garantem que estas instituições firmem convênios com os governos e até recebam verbas públicas.
Ora, o percentual de recuperação de viciados em crack com os tratamentos convencionais em entidades beneficentes é da ordem 3 ou 5%. A se continuar a atual epidemia do uso de crack e mantendo-se o atual esquema ineficaz de tratamento, estas as entidades serão cada vez mais de utilidade pública e cada vez mais vão precisar de mais convênios com o estado e mais verbas públicas para continuar recuperando quase ninguém. Uma bola de neve, um negócio da China, um esquema de pirâmide que lesa principalmente os cofres públicos e que muito pouca gente vê como nocivo para toda a sociedade.
Sendo que um tratamento alternativo e muito mais eficaz já foi testado e só não pode ser aplicado em grande escala porque no Brasil a maconha não pode ser utilizada nem como medicamento.
Para pensar na cama antes de dormir:
Será que este pessoal que condena intransigentemente a regulamentação da maconha no Brasil o faz para defender a família, a moral, os bons costumes e os valores cristãos. Ou será que fazem isso, mesmo que inconscientemente, apenas para defender interesses e garantia de mercado para uma dúzia de igrejas, pastores e políticos, policiais e barões do tráfico que lucram alto com a tragédia das drogas e da guerra contra as drogas no Brasil?
Não sei.
O que sei é que apesar dos tímidos avanços sociais dos últimos 12 anos no Brasil, o espírito conservador brasileiro ainda permanece o mesmo dos últimos 500 anos desde a colonização européia.
A saga da descriminalização e regulamentação da maconha bem como outros temas polêmicos por aqui, vai seguir o mesmo rumo da saga pela abolição da escravidão que só terminou oficialmente em 1888 e decretou oficialmente o fim da monarquia no Brasil.
Apesar de muitos debates, muitas discussões acaloradas, inevitavelmente seremos o último país americano com uma regulamentação para o uso e o cultivo da maconha. E é bem provável que esta regulamentação nos custe até a democracia.
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