Um ano sem Maria e Zé Claudio: “por baixo do desmatamento, há muita gente sendo morta”
Por Maíra Kubik Mano, no Território de Maíra
Maria eu não conheci. Nem Zé Claudio. Não deu tempo. José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo foram cruelmente assassinados há exato um ano, em 24 de maio de 2011.
O crime ocorreu no assentamento extrativista Praia Alta Piranheira, em Nova Ipixuna (PA), onde eles viviam e lutavam para deixar a floresta em pé. Denunciavam sem pestanejar a extração ilegal de madeira dos lotes vizinhos e a derrubada de castanheiras, que Zé Claudio tanto amava – árvore protegida por lei, mas vulnerável pela economia da destruição.
Os tiros foram dados à queima-roupa, em uma emboscada. A sangue frio, com certeza, porque ninguém com sangue quente, correndo nas veias, seria capaz de tamanha crueldade.
Tudo no mesmo dia em que a Câmara dos Deputados votava e aprovava o novo Código Florestal.
Laisa sim, esta eu vi e ouvi de perto. Laisa é irmã de Maria, cunhada de Zé Claudio. Mais uma brasileira que acredita na preservação do meio ambiente. Mais alguém que se indigna diante das mortes de pessoas da sua família e de toda a estrutura que está por trás delas.
Laisa ousou questionar, levantar sua voz, e, assim como Zé Claudio e Maria, hoje está ameaçada de morte. “Vivo um dia de cada vez”, diz a professora, que mora no mesmo assentamento do casal morto e, com frequência, é obrigada a passar pelo local do crime, uma estradinha deserta e esburacada.
Ela relata alguns casos de intimidação: “Um menino estranho perguntou para o meu filho se a porteira da nossa casa ficava aberta ou fechada à noite. Outro dia, antes de ir para Nova York, uma criança de uns 14 anos entrou na escola, parou e ficou me olhando em pé, na porta, perto do quadro. Quando eu disse ‘oi’ para ele, ele saiu correndo e subiu numa moto onde estava um senhor”.
Às vésperas de mais um embate sobre o Código Florestal – o veto ou a sanção da presidenta Dilma Rousseff – Laisa vive, como disse Zé Claudio certa vez, “com a bala na cabeça”. Bastam dois neurônios para fazer a ligação desta triste ironia: enquanto os defensores da floresta morrem, o Brasil se prepara para matá-la.
“Amazônia é manchada de sangue”, disse Laisa na Organização das Nações Unidas (ONU), ao receber o prêmio “Heróis da floresta”. “E essa mancha continua se espalhando. Mas nossa situação torna-se cada vez mais grave porque o Novo Código Florestal Brasileiro votado pela Câmara dos Deputados, não favorece o povo que vive e defende a floresta. Essa mesma Câmara que vaiou no momento em que foi anunciado o assassinato de Maria e José Cláudio A presidenta Dilma não deve aprovar essa lei. Por baixo do desmatamento há muita gente sendo morta.”
Oxalá que ela não esteja entre essa gente. Mas ela já não está?
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