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Cut 30 anos: do mimeógrafo e carro de som às redes digitais

18 de Agosto de 2013, 9:21 , por Bertoni - 0sem comentários ainda | No one following this article yet.
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Por Sérgio Luís Bertoni (*)

Parece que foi ontem que debatíamos acoloradamente a criação das Comissões de Fábricas de Trabalhadores, a Organização no Local de Trabalho, a Democratização dos Sindicatos, a Horizontalização do Movimento Sindical e a necessária criação da Central Única dos Trabalhadores.

Sabíamos que para criar uma Central Sindical, precisávamos organizar e comunicar. Debater ideias, princípios e objetivos. Dialogar, conversar e convencer.

Trinta anos atrás tínhamos, além da vontade política, alguns mimeógrafos e carros de som que nos ajudavam na comunicação com os Trabalhadores nas bases.

Os mimeógrafos caíram em desuso, os carros de som se transformaram em caminhões de som potentíssimos e tudo está tão moderno, digital, tudo num clique.

É muito comum, nos dias de hoje, chamar as redes de comunicação digital de “Redes Sociais”. Muitas vezes acaba-se por esquecer que as verdadeiras Redes Sociais existem desde que a Humanidade passou a se organizar em Sociedade, muito, mas muito tempo antes da digitalização da comunicação e da conectividade digital.

Antes do sugirmento de determinadas redes digitais privadas (ver Quem manda no shopping center é o dono) muito difundidas nos velhos meios de comunicação (Não acreditem em mim: The Terrible truth about facebook), já existiam Redes Sociais reais, humanas, presenciais, analógicas.

A Central Única do Trabalhadores foi possível porque, entre outras iniciativas de sucesso, no início dos anos 1980 as pessoas começaram a se organizar em Redes de Trabalhadores, verdadeiras Redes Sociais voltadas inicialmente para troca de experiências e informações e, logo depois, para organizar-se sindicalmente no âmbito internacional.

A CUT com a ajuda de TIE - Transnationals Information Exchange - criou várias Redes Sociais que facilitavam a comunicação e articulação dos Trabalhadores em empresas multinacionais em vários países.

Enquanto operário metalúrgico e cutista, nos anos 1980, tive a oportunidade de fazer parte de uma destas redes, a Rede dos Trabalhadores na Ford, e ajudei a articular outra, a Interfábricas Autolatina, reunindo os Trabalhadores na Ford e Volkswagen logo após a fusão destas em 1987. Nos anos 2000 tive a oportunidade de ajudar a reativar a Rede dos Trabalhadores na Ford que, graças ao esforço dos companheiros de São Bernardo, Taubaté e Camaçari, se transformaria em Comitê Internacional dos Trabalhadores na Ford, institucionalizado internacionalmente junto a empresa. O gigante UAW (Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Automobilística dos EUA) não se furta a reconhecer o fundamental empenho, liderança e dedicação dos companheiros brasileiros neste processo.

Confesso que não era fácil, lá nos anos 1980, conseguir rapidamente informações confiáveis sobre o que acontecia nas fábricas em outros países. Hoje, sem dúvida nenhuma, é muito mais fácil e rápido conseguir informações.

Porém, não basta ter informação! É preciso saber o que fazer com ela e quais meios usar para compartilhá-la de forma eficiente possibilitando aos trabalhadores e trabalhadoras acesso à informação.

Podemos achar que basta criar uma conta em uma determinada rede digital e lá postar a informação que se deseja compartilhar. Mas há milhares delas na internet, qual escolher?

Além disso, muitos trabalhadores e jovens trabalhadores de diversas categorias profissionais estão nas mais distintas redes. Outros tantos nem acesso ao computador tem!

Algumas destas redes vendem a ilusão de democracia e liberdade, mas de fato forçam os usuários a ficar dependentes delas, evitando que as informações sejam compartilhadas em outras redes, fora delas! Estas são redes digitais conectadas em si e burlam o grande diferencial da internet que é a interconectividade digital.

As denúncias recentes do ex-agente da CIA, Edward Snowden, mostram o quão perigoso é usar determinadas redes digitais conectadas, centralistas e centralizadoras, usadas como poderosos máquinas de espionagem e bisbilhotagem. Também por isso, não podemos cair no populismo digital e achar que nossos problemas de comunicação estarão resolvidos se usarmos apenas as redes “mais acessadas” ou se jogarmos nossa companheirada no colo de uma só rede.

A Comunicação Sindical na era digital deve ser inovadora e horizontal, deve aproximar as pessoas e organizá-las, como sempre foram as iniciativas cutistas de sucesso.

A maior central sindical do país pode transformar a organização dos trabalhadores e a comunicação no país se apostar na inovação e na horizontalidade que a comunicação digital oferece: a interconectividade.

A interconectividade digital é garantida pela diversidade das redes que compõe a Internet e, claro, pela capacidade que elas possuem de comunicar-se entre si, formando uma Federação de Redes ou as Redes Sociais Federadas.

Um dos principais debates no mundo das redes digitais gira em torno dos conceitos:

a) rede centralizadora e centralizada; e

b) redes sociais federadas.

Rede Centralizadora e Centralizada é aquela onde todos devem estar dentro da mesma rede para poder compartilhar a informação.

É o conceito que rege o facebook e outras redes digitais privadas e proprietárias.

Redes Sociais Federadas, ou as redes de redes, são aquelas que permitem aos usuários de diferentes redes digitais se conectar, trocar informações entre si, criar novas formas de interação através da Web sem necessariamente serem usuários de uma mesma rede digital centralizada e centralizadora.

Este é o conceito que inspira e rege as redes digitais livres, soberanas e anti-hegemônicas.

Com as Redes Sociais Federadas é possível que duas ou mais pessoas, usuários de redes digitais distintas, se relacionem e compartilhem informações e conhecimentos independentemente de quais redes participem.

É o usuário que decide livremente onde estar, onde divulgar suas informações, com quem quer se comunicar. Algo semelhante ao que ocorre com os serviços de e-mails atualmente, porém online ou de forma imediata.

Do ponto de vista de uma Rede Centralizadora e Centralizada, como facebook, se você não estiver cadastrado na rede e não mantiver lá um perfil, você não existe. A única maneira dos seus amigos que estão em determinada rede interagirem com você é convidando-o a participar da mesma. E você necessariamente precisará se cadastrar lá para interagir com estes amigos.

Apesar de existir centenas de redes digitais na internet, quase todas funcionam como se não houvesse nenhuma outra rede digital na Web e cada uma busca ser a “rede social” hegemônica, a mais poderosa e a mais popular de todas.

As Redes Sociais Federadas, ou as redes de redes digitais, significam uma mudança de paradigma, ou seja, a existência real de uma gigantesca rede digital global, descentralizada e livre, gerida por pessoas e entidades diferentes e autônomas que interagem através da interconectividade das redes.

Mas as Redes Sociais Federadas de pouco servem se não facilitarem a interação entre distintos indivíduos, movimentos sociais, políticos, culturais, tecnológicos, etc, se não promoverem a inclusão de novos atores e sujeitos nas dinâmicas de organização e compartilhamento de conhecimento e informações. Portanto, para funcionar elas precisam, além de protocolos abertos e livres, da livre interação entre os distintos indivíduos, movimentos e redes, numa grande articulação global baseada em conceitos como o pluralismo, a autonomia, a horizontalidade e a unidade na diversidade, onde ninguém é mais que ninguém e todos juntos somos fortes.

Investir em Redes Sociais Federadas, efetivamente interconectadas, é um passo fundamental para democratizar a comunicação digital e alcançar um número cada vez maior de cidadãos, Trabalhadores, sindicalizados ou não.

É reafirmar princípios históricos da Central Única dos Trabalhadores ao mesmo tempo que os adapta à modernidade e às demandas atuais. É possibilitar que um número cada vez maior de pessoas se tornem sujeitos do processo de comunicação e organização, fortalecendo cada vez mais o movimento dos Trabalhadores e sua Central Sindical, além de democratizar a produção e o acesso à informação e ao conhecimento.

É inovar mais uma vez, como sempre a CUT fez!

(*) Sérgio Luís Bertoni, Metalúrgico, Blogueiro, Mestre em Filosofia pela Universidade Estatal de Moscou M.V. Lomonossov, trabalhou na Ford Ipiranga, foi Secretário Geral da Comissão de Fábrica dos Trabalhadores na Ford Ipiranga, atualmente coordena TIE-Brasil e preside Fundação Blogoosfero.


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